Ida de Dilma à China busca reduzir desequilíbrio na relação comercial

Ida de Dilma à China busca reduzir desequilíbrio na relação comercial

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 09:48

A China é o maior parceiro comercial do Brasil e o principal destino das exportações brasileiras. Mas, atualmente, mais de 80% das vendas externas são de produtos básicos cotados internacionalmente (commodities). Em contrapartida, mais de 90% dos produtos que vêm da China são bens industrializados, que incorporam mais valor e geram mais empregos.

Com a balança pendendo a favor dos chineses, o governo brasileiro quer diminuir o desequilíbrio do comércio bilateral entre os dois países e diversificar a pauta de exportações para o país asiático. No final da noite deste domingo (10), a presidente desembarcou na China em uma viagem que traçará o rumo da relação do Brasil com o país asiático nos próximos anos.

Essa assimetria no comércio bilateral será um dos principais temas da pauta da viagem da presidente Dilma Rousseff. Esta é a primeira viagem internacional de Dilma a negócios, e o governo já anunciou que a presidente irá pedir “reciprocidade” no acesso de produtos e empresas brasileiras ao mercado do país asiático. O país também quer aumentar os investimentos da China no Brasil, sobretudo na área de infraestrutura.

Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), o comércio Brasil-China movimentou US$ 56,3 bilhões em 2010, um crescimento de 52,4% em relação a 2009, quando o valor foi US$ 36,9 bilhões. Todavia, a participação de produtos básicos na pauta de exportações brasileiras saltou de 77% para 83%. Em 2000, a participação era de 68%.

Em 2010, o saldo da balança comercial do Brasil com a China teve superávit de US$ 5,19 bilhões. As exportações brasileiras somaram US$ 30,7 bilhões, uma alta de 46% em relação ao ano anterior. Desse total, porém, mais de 70% foram matérias-primas: os embarques de minério de ferro representaram 43,3% do total de vendas, remessas de soja triturada, 23,2%, e as vendas de óleo bruto de petróleo, 13,2%.

Já as importações somaram US$ 25,5 bilhões no ano passado, uma alta de 60% frente à 2009.

Partes de aparelhos transmissores ou receptores lideraram as compras internas, somando US$ 1,4 bilhões, o que representa 5,6% do total comprado da China. Muito mais diversificada que a pauta de exportações brasileiras, o topo da lista de itens chineses vendidos para o país inclui acessórios de máquinas automáticas para processamento de dados, circuitos eletrônicos, telefones, motores, ar-condicionado, tecidos e brinquedos.

Pelos cálculos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), o Brasil registrou em 2010 um déficit de US$ 24 bilhões de produtos manufaturados no intercâmbio comercial com a China. “Em 2011 esse déficit pode chegar a US$ 40 bilhões”, afirma Paulo Skaf, presidente da entidade.

A indústria brasileira diz sofrer cada vez mais prejuízos com a concorrência dos produtos manufaturados chineses que, além de contar com incentivos do governo, são beneficiados pela moeda chinesa desvalorizada e pelo baixo preço da mão de obra. Os empresários acusam ainda a China de práticas ilegais de comércio, com venda de produtos falsificados e abaixo do preço de mercado. Por isso, eles defendem que o Brasil não reconheça o país como economia de mercado.

A falta de isonomia na competição tem provocado um processo de desindustrialização e até mesmo de transferência de operações para a China. De acordo com o estudo da Fiesp, o pico da participação da indústria de transformação no PIB brasileiro foi em 1986, com 27,2%. Em 2010, o percentual caiu para 15,9%.

“A China tem um projeto estratégico de país e vêem rigorosamente o interesse deles, e só. E o que eles querem é comprar matérias-primas, investir em áreas estratégicas e vender manufaturados. O Brasil é que precisa passar a defender seus interesses e dizer se quer deixar com os chineses a agregação de valor e a geração de empregos”, opina.

A professora de Relações Internacionais da ESPM, Denilde Oliveira Holzhacker, avalia que a China tem encontrado um ambiente muito mais favorável do que o Brasil na relação bilateral. “Há uma desigualdade em termos de negócios e o maior desafio é equilibrar essa relação”, diz.

Para a analista, o governo Dilma tem dado sinais de que será “mais firme” em relação à concorrência chinesa e a presença de empresas chinesas no país, o que poderá ajudar nas negociações por maior acesso ao mercado chinês. “Já existe uma posição um pouco mais incisiva do governo, o que dará ao Brasil uma capacidade maior de barganha”, diz Denilde, citando as tarifas antidumping contra determinados produtos chineses e a legislação para a compra de terras por estrangeiros, que desde o ano passado ficou mais rígida e limitada.

Crescimento das importações vindas da China

No final da década de 1990, a China respondia por apenas 1,7% das importações brasileiras e 1,4% das exportações. A partir de 2000, a participação do país passou a crescer no ritmo do crescimento da economia chinesa. Em 2005, já era a origem de 7,2% das importações do Brasil e o destino de 5,7% das exportações.

Nos anos 2007 e 2008, o volume importado da China superou o das exportações para o país. Em 2009, com a crise internacional, o total de importações recuou e voltou a ficar abaixo do volume exportado, situação que se manteve em 2010 (Veja gráfico acima).

Hoje, o país asiático responde por 15,2% das vendas do Brasil para o exterior e por 14% das importações brasileiras. E a China caminha para conquistar também o posto de principal fonte das importações brasileiras, posto que hoje pertence aos Estados Unidos. No primeiro bimestre de 2011, os produtos chineses superaram o volume de produtos norte-americanos que entraram no país. O Brasil, por sua vez, ocupa o 8º lugar na lista dos principais países de origem das importações da China.

“O Brasil é ainda muito pequeno no universo que a China importa, por isso é importante a construção de parcerias e uma maior aproximação dos governos para ampliar o acesso de produtos brasileiros a esse mercado”, afirma Alessandro Teixeira, secretário-executivo do MDIC, que coordena a missão empresarial brasileira.

Investimentos chineses no Brasil

Segundo o secretário, Brasil e a China podem ampliar as parcerias comerciais em setores como ciência e tecnologia, energia, petróleo e recursos hídricos. “Queremos estabelecer um diálogo para atrair tanto investimentos em infra-estrutura como para bens de consumo”, diz.

Em 2010, a China liderou os investimentos diretos feitos no Brasil, com negócios que somaram cerca de US$ 17 bilhões, de acordo com estimativa da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet). Os investimentos se concentraram, sobretudo, em atividades de exploração de recursos naturais e matérias-primas, como mineração, exploração de petróleo, agricultura, energia e siderurgia.

“A última década foi marcada pela explosão do comércio chinês, acredito que essa será a dos investimentos no exterior”, afirma Kevin Tang, diretor da Câmara de Comércio Brasil e China (CCIBC). Ele destaca que os avanços da China no exterior visam assegurar recursos naturais e estratégicos para abastecer o crescente mercado chinês.

“O Brasil é hoje o oxigênio da China, que não têm água, terra, alimentos e minério de ferro suficientes para garantir seu crescimento. Por outro lado, vender commodities para a China é ainda uma questão de sobrevivência para se ter saldo positivo na balança comercial”, afirma Mario Antonio Marconini, presidente do conselho de relações internacionais da Fecomercio-SP.

Para Tang, é injusto atribuir só à China a perda de competitividade dos brasileiros. Ele atribui os problemas enfrentados pela indústria do país à carga tributária elevada, aos custos trabalhistas e aos gargalos de infraestrutura que, junto com a valorização do real, encarecem os produtos brasileiros. "Se o Brasil não investir mais em pesquisa e tecnologia e se tornar mais competitivo, vai continuar perdendo mercado", diz.

"O problema da China na verdade é muito nosso. Se o Brasil tivesse feito o dever se casa, com mais investimentos em educação e infraestrutura, talvez não dependesse tanto hoje do superávit em commodities”, completa Marconini.

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