Moradores contam como driblam o frio na região mais gelada de SP

Moradores contam como driblam o frio na região mais gelada de SP

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 09:35

Moradores da região de Parelhereiros, no extremo sul da capital paulista, considerada a mais fria de São Paulo pelo Centro de Gerenciamento de Emergência (CGE), adotam várias técnicas para driblar as baixas temperaturas neste início de inverno. Eles relatam ao G1 que carregam e usam várias blusas, impedem que crianças brinquem nas ruas e até mesmo programam viagens durante o inverno. Na madrugada deste sábado (9), a temperatura mínima registrada pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) foi de 8,5ºC na capital paulista, não confirmando a expectativa do próprio instituto de um novo recorde de frio. A menor temperatura de 2011 foi no dia 28 de junho, de 6,1ºC.

A Zona Sul de São Paulo costuma ser mais fria que a Norte, onde fica a estação do Mirante de Santana, usada pelo Inmet como parâmetro oficial. No dia 28 de junho, quando em Santana foi registrada a mínima de 6,1ºC, a temperatura em Parelheiros ficou em 2,3ºC, segundo dados do CGE. “A região é muito fria porque está muito próxima da Serra do Mar, da Mata Atlântica e recebe muita influência dos ventos que sopram do oceano”, explica Adilson Nazário, técnico em meteorologia do CGE. O auxiliar administrativo Leandro Reis, de 20 anos, afirma que o frio da madrugada constuma ser muito intenso. “O frio na madrugada é insuportável. Às 7h, quando venho trabalhar, ainda está muito frio. Por volta das 11h, começa a esquentar. Tem que levar o guarda-roupa para o trabalho e durante o dia ir tirando as blusas”, conta. Segundo ele, o difícil é lembrar de carregar as blusas ao longo do dia. “A gente sempre perde, porque traz muita blusa. Lá no meu trabalho tem várias que eu esqueci de levar para casa.” O morador faz referência a uma outra característica do clima da região: a grande amplitude térmica, que é a diferença entre as temperaturas máxima e mínima. No dia 28 de junho, por exemplo, os termômetros chegaram a apontar 17,1ºC na estação de medição do CGE de Parelheiros. A região de Parelheiros no outono e inverno também enfrenta constantemente névoas durante o período da manhã. “Tem uma névoa que é tão densa que dá a impressão de que dá para tocar”, relata Leandro Reis. De acordo com o técnico em meteorologia do CGE, a umidade, o céu sem nuvens e a falta de ventos contribuem para a formação dos nevoeiros frequentes nessa região. Umidade e falta de ventos contribuem para a formação dos nevoeiros frequentes nessa região (Foto: Letícia Macedo/ G1)

Em dias com ventania, a ajudante geral Maria Lucia dos Santos, de 43 anos, que trabalha à noite em São Bernardo do Campo, no ABC, utiliza as mãos para impedir que a friagem não entre dentro do capuz e atinja os ouvidos. “Estou de capuz, mas ainda estou tremendo. Hoje eu não coloquei uma segunda calça. Quanto mais a gente encolhe, mais frio sente. Essa região é muito gelada”, diz, enquanto caminha apressadamente no centro comercial.

Café para esquentar

A empresária Cláudia Santos, de 31 anos, que mora em Interlagos e costuma levar seu gato a um veterinário em Parelheiros, conhece há muitos anos a região e, em dias de frio, sai bem agasalhada. “É o efeito cebola que os meteorologistas dizem. Quando voltamos para Interlagos vamos tirando as blusas. Hoje eu estou com uma gola alta, uma segunda pele e uma legging para reforçar”, diz, tomando um café bem quente. “O café ajuda a despistar o frio e o sono.”

A técnica em enfermagem Andréia Barbosa, de 29 anos, moradora da Pedreira, na Zona Sul, foi a primeira vez para o extremo sul de São Paulo nesta semana. Com apenas uma blusa de moletom, ela reconhece que não estava suficientemente agasalhada. O seu cachorro Bob tremia em seu colo na fila para ser atendido no veterinário. “Eu não vim preparada para o frio que faz aqui. Ele está tremendo desde que saiu de casa."

Férias durante o inverno

Para Leandro Reis, que sempre morou em Parelheiros, quem sai de outras regiões tem mais dificuldade para enfrentar as baixas temperaturas. “Quem vem de fora é quem mais sofre”, conta. A vendedora pernambucana Lucicleide Maria de Sousa, de 30 anos, mora há seis anos em São Paulo, quatro deles em Parelheiros, mas ainda não se acostumou com o frio. Por causa das baixas temperaturas, a circulação nas extremidades do corpo chega a ficar comprometida. “Quando esfria mesmo, eu visto duas calças, três blusas, coloco luva, mas ainda fico com frio. Minhas mãos e meus pés costumam ficar muito gelados. Os dedos chegam a inchar e eu não consigo nem fechar a mão”, diz.  Para escapar das baixas temperaturas, ela planeja em breve viajar de férias para o Nordeste. “Eu estou contando os dias para ir passar férias em Pernambuco."

Panos nas frestas

Quando fecha as janelas e portas na tentativa de manter a temperatura mais agradável dentro de sua residência, a dona de casa Érica Paula Soares, de 30 anos, que tem quatro filhos, coloca até tecidos nas frestas para evitar as correntes de ar. “Coloco panos nas portas, nas janelas. Mesmo com o vidro, a gente sente muito frio." Neste ano, a família teve que comprar mais cobertores. “Eu também ganhei alguns lá na igreja. O pessoal vê a gente com criança pequena e sabe que a gente precisa”, diz. Depois dos afazeres domésticos, a dona de casa costuma colocar uma luva na tentativa de esquentar as mãos. “Depois de lavar roupa eu coloco uma luva e passo o resto do dia com ela. A água é tão fria que parece ter saído da geladeira.” Além de reforçar a alimentação dos filhos, a dona de casa também impede as crianças de brincar fora de casa. ”Quem sofre mais são os pequenos. Agora nas férias eu não deixo as crianças brincarem na rua. Elas ficam resfriadas."

Fogo

Perto da estação de medição do CGE mora uma tribo guarani. Alguns índios chegam a recorrer ao fogo para se manter aquecidos. Na quinta-feira (7), quando a reportagem do G1 esteve na aldeia, fazia 10,5ºC e a garoa fina não parou até pelos menos por volta das 9h30.

Com poucos agasalhos, o fogo que serve também para cozinhar ajuda a manter aquecida a família de Telvina da Silva, de 57 anos. Viúva, ela vive em uma casa feita de tijolos com uma filha e pelo menos cinco netos pequenos. “Está muito frio. Não tem muito cobertor. Para comprar mais eu faço balaio, colar”, conta. Ela diz que leva seus trabalhos manuais para serem vendidos na região de Santo Amaro. “Nesta blusa eu paguei R$ 20”, conta, ao preparar o café da manhã. Índia que mora no extremo sul de São Paulo se aquece com os netos junto ao fogo (Foto: Letícia Macedo/ G1)

  De acordo com a Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social da Prefeitura de São Paulo, a administração municipal mantém o programa de atenção urbana. Agentes saem durante a noite na tentativa de convencer moradores de rua a ir a um albergue. Com as quedas de temperatura, as equipes utilizam uma perua e intensificam as abordagens.

Estações meteorológicas

O CGE e o Inmet explicam que, do ponto de vista climatológico, uma estação deve ter uma série de dados de pelo menos 30 anos para ser considerada oficial. A estação do CGE em Parelheiros, por exemplo, funciona desde 2004. A estação do Inmet em Santana possui medições sem interrupções desde 1961. Apesar disso, índicios apontam que a região é, de fato, mais gelada.

“A cidade não é homogênea e tem vários microclimas. A temperatura na Zona Sul costuma ser mais baixa quando os ventos sopram do sul. A altitude da região é menor, o ar frio costuma se confinar nesses pontos”, afirma a meteorologista Helena Turon Balbino, do Inmet. Segundo Helena, em contraposição, a região de Cachoeirinha tende a registrar temperaturas mais altas. “Quando os ventos sopram do interior do país eles chegam à cidade pela região norte”, diz.  

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