Para especialistas, falta de estrutura para grandes obras prejudica cidades

Para especialistas, falta de estrutura para grandes obras prejudica cidades

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 09:47

Obras de grande porte, como usinas hidrelétricas, provocam impactos sociais e econômicos nem sempre positivos nas cidades em que são construídas. Apesar das expectativas do poder público, especialistas ouvidos pelo G1 afirmam que falta estrutura suficiente para receber os trabalhadores migrantes. Os serviços oferecidos à população local ficam saturados com o aumento da demanda.       Para o professor de história da Universidade Federal de Rondônia (UNIR), Alexandre Pacheco, a construção das usinas de Jirau e Santo Antônio causou problemas a Porto Velho, que já tinha uma estrutura deficiente para atender os moradores mesmo antes das obras. “Com as obras, os desequilíbrios aumentaram, embora o poder público apontasse as usinas como as soluções para os problemas de Porto Velho e Rondônia. Foi prometido implantar mais rede de esgoto e unidades de Saúde, que é um dos setores que está mais prejudicado. Isso não foi feito”, diz.

Apesar do acordo em que os consórcios responsáveis por Jirau e Santo Antônio se comprometem a investir em Porto Velho, segundo o prefeito Roberto Sobrinho, isso não ocorreu na proporção combinada. Conforme dados da prefeitura, ficaram estabelecidos para Porto Velho R$ 69 milhões da Usina de Santo Antônio e R$ 90 milhões da Usina de Jirau. “Até o momento, a usina de Santo Antônio já repassou 85% do valor estabelecido e a usina de Jirau, apenas 18% do acordado”, afirma o prefeito.

Segundo Pacheco, o modelo de implantação das usinas é “predatório” e “catastrófico”. “Ocorre o deslocamento de trabalhadores e a criação de toda uma infraestrutura que não existia e, em poucos meses, deve passar a ter. Em termos de Meio Ambiente, ocorre outra catástrofe. O poder público promete construir uma estrutura, mas não dá conta”, afirma.

Expectativa alcançada

Com a construção das usinas de Jirau e Santo Antonio, a expectativa inicial da prefeitura de Porto Velho era a geração de empregos e o aquecimento da economia local. De acordo com o prefeito Roberto Sobrinho, esses benefícios foram alcançados.     “Vivemos um momento de pleno emprego, comprovado pelo Ministério do Trabalho que divulgou no mês passado os dados municipais de criação de empregos formais coletados no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Porto Velho é uma das dez cidades que mais criou postos de trabalho com carteira assinada”, afirma. “O comércio vive esse bom momento e a população está tendo muitas oportunidades.”

De acordo com Sobrinho, a previsão era de que 50 mil trabalhadores chegassem à cidade no pico da obra, mas já ultrapassa 100 mil o número de operários que foram à região para trabalhar nas duas usinas. A chegada de tantas pessoas em um curto período causou problemas já previstos na Saúde e na infraestrutura da cidade, mas eles teriam sido minimizados, segundo Sobrinho, por recursos disponibilizados através do PAC.

“Outro ponto é o trânsito. Em Porto Velho, o aumento da frota é de 15% ao mês, isso provoca dificuldades que nós estamos procurando sanar com várias medidas, como conclusão da obra de três viadutos que darão maior mobilidade ao tráfego. Também foram feitos investimentos na melhoria da sinalização, com a instalação de novos semáforos, placas e faixas. A prefeitura também está montando uma central de operação para o monitoramento online do trânsito.”

Belo Monte

A usina de Belo Monte ainda nem começou a ser construída, mas a preparação dos terrenos para o início da construção dos alojamentos já agita Altamira (PA), segundo a prefeita Odileida Sampaio. Ela apóia a obra, pois acredita que a construção evitará um apagão no país, e garante que a construção vai levar desenvolvimento para a região.

“Vamos ter a construção de casas para famílias atingidas que vão ter de se mudar e investimento na infraestrutura, por exemplo, com a pavimentação de ruas, investimentos em saneamento básico, a construção de escolas, de um hospital e de um aterro sanitário”, diz.

A prefeita ainda espera conseguir a implantação de uma faculdade na região. A estimativa é que cerca de 10 mil pessoas se mudem para a cidade com o início das obras.

“Quero uma faculdade, com cursos de medicina, direito e engenharia civil, que é justamente para formar pessoas e mantê-las aqui depois do término do empreendimento, quando a tendência é que todas as pessoas comecem a ir embora”, afirma.

Por enquanto, a questão da segurança é a que mais preocupa a prefeita, já que a cidade recebeu muita gente de uma só vez. Porém, segundo ela, ainda não houve aumento na criminalidade.

“Agora, o que mais nos atrapalha é o trânsito. Estamos sofrendo com congestionamentos e tivemos um aumento na quantidade de acidente, precisamos organizar nosso trânsito urgentemente”, afirma a prefeita. “O preço do aluguel também subiu bastante. É quase impossível encontrar uma casa no centro. As pessoas que estão chegando à cidade em busca de emprego têm que ir para lugares mais afastados pagando caro.”     Impacto social

O antropólogo Parry Scott, professor do Departamento de Museologia e Antropologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), explicou  que o impacto pode ser reduzido com os investimentos para atenuar os problemas. Porém, nem sempre essas obras são priorizadas.

“As empresas são obrigadas a fazer o que chamamos de medidas mitigadoras, que de alguma forma diminuem o impacto, só que elas ficam sempre em segundo plano na hora da execução”, afirma.

De acordo com o antropólogo, apesar de sentir o impacto, moradores de zonas urbanas conseguem se articular um pouco com a chegada de migrantes que querem aproveitar as oportunidades de trabalho, o que promove a criação de uma série de serviços. Porém, tudo tende a desaparecer depois.

“A chegada do pessoal causa uma grande convulsão na cidade, que fica totalmente modificada com o influxo do triplo da população local. É um período de grande expectativa, mas de curta duração. Isso cria demandas imediatas que, depois, são deixadas de lado com o término da obra. Quando todos vão embora, sobram incertezas sobre o que fazer com tudo que foi construído para que não seja abandonado”, afirma Scott.     O professor explica que no campo o impacto é pior. As pessoas precisam do terreno para trabalhar e muitas vezes são retiradas das casas que serão inundadas.

“O governo tem que ter programas complexos da retomada do trabalho na área rural. Se há uma área com agricultura exuberante que acaba inundada, essa população passa a viver dos serviços associados à nova usina. Porém, o comércio vai ficar mais fraco durante um tempo, pois os comerciantes vão depender de gerar novas estruturas de produção agrícola”, afirmou Scott.      

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