'Penso no meu filho todos os dias', diz pai de jovem morto por onça

'Penso no meu filho todos os dias', diz pai de jovem morto por onça

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 09:21

Alonso demorou um ano para superar a perda do 

filho atacado pela onça. (Foto: Reprodução/TVCA) “Penso no meu filho todos os dias”. A frase é do pescador Alonso Silva Lara, 49 anos, que viu o filho Luiz Alex Silva Lara, 22 anos, ser arrastado e morto por uma onça-pintada no Pantanal Mato-grossense. O ataque do maior predador brasileiro aconteceu no dia 24 de junho de 2008 quando o jovem estava em uma barraca na localidade do Pacu Gordo, às margens do Rio Paraguai, em Cáceres, a 200 km de Cuiabá.

O pescador nunca mais esqueceu aquela noite. “Era um dia santo. Dia de São João. A gente não tinha costume de trabalhar neste dia e meu filho não estava com vontade de trabalhar. Não sei se ele estava adivinhando alguma coisa. Mas eu teimei e saí da barraca. Ele ficou descansando na barraca. Essa saída foi o problema”.

Quando voltou ao acampamento, cerca de 30 minutos depois, Alonso Lara viu que a barraca do acampamento estava rasgada e com manchas de sangue. Em seguida ele avistou o corpo do filho sendo arrastado pela cabeça para o interior da mata. Desesperado, o pescador começou a gritar e a bater com um facão em um tambor que é usado para guardar as iscas. O corpo só foi abandonado pela onça aproximadamente 100 metros à frente e resgatado com a ajuda de outros pescadores. “Ficou tipo uma gravação. Toda noite quando vou deitar na minha cama eu me lembro daquele dia”.

Superação

Laudo apontou ferimentos causados pela onça em

pescador. (Foto: Arquivo TVCA) Alonso Lara confessou que demorou quase um ano para conseguir superar a tragédia familiar e voltar a trabalhar como pescador. “Eu fiquei aborrecido. Não tinha mais vontade de trabalhar. Minha vontade era largar tudo. Mas a vida continua”, comentou. Ele disse que conseguiu se reerguer com o apoio da mulher e do casal de filhos.

Atualmente, Alonso Lara continua trabalhando como pescador de iscas na mesma região do Rio Paraguai onde o filho foi morto. Além disso, ele conta que pelo fato de Cáceres ser uma região com forte apelo turístico, com frequência ele consegue ver onças-pintadas andando nas margens do rio.

“A gente vê duas ou três por dia. Não é fácil. Três anos depois e até hoje vem a lembrança dele. Na hora que eu coloco a cabeça no travesseiro é que é duro”, comentou, emocionado.

Caso mais grave

O ataque de uma onça ao pescador Luiz Alex foi o mais grave já registrado na cidade pantaneira de Cáceres. No entanto, nos últimos três anos, aconteceram outros dois ataques, que, por sorte, não terminaram em morte.

Uma das vítimas, um adolescente de 16 anos, ficou ferido após ser atacado por uma onça enquanto pescava com o pai no Rio Paraguai, em julho de 2010. Os dois estavam próximos ao barranco quando a onça pulou no barco para atacar o jovem. Mas o piloteiro do barco teria dado algumas pauladas na onça, salvando o garoto. Segundos os especialistas, os turistas não mantiveram uma distância de segurança em relação ao animal.

Outra pessoa atacada em março do ano passado foi um técnico do Instituto Chico Mendes, que trabalha em uma reserva ecológica em Cáceres, foi surpreendido por uma onça quando estava ligando uma casa de máquinas. Ele ficou ferido, mas sem gravidade.

Luiz Alex estava em um acampamento com o pai

quando foi atacado. (Foto: Reprodução/TVCA) Morte confirmada

O laudo da necropsia feita no corpo do pescador Luiz Alex comprovou que ele foi realmente morto após ser atacado por um animal predador de grande porte, da espécie onça-pintada. O laudo, que tem 113 páginas, cita com riqueza de detalhes as lesões causadas pelo animal na vítima.

O médico legista Manoel de Campos Neto disse que a maior dificuldade foi identificar as lesões, pois em uma pequena superfície foi empregada, pela onça, muita energia. Em uma das coxas da vítima, por exemplo, o legista identificou aproximadamente 45 lesões. Nesse local a onça teria usado uma das garras para imobilizar o pescador.

A onça teria atacado o pescador da mesma forma que abate suas presas, mordendo a nuca e a base do crânio, promovendo fratura-luxação da coluna cervical, conforme apontou um relatório elaborado pelo biólogo Rogério Cunha de Paula, analista ambiental do Centro Nacional de Pesquisas para a Conservação de Predadores Naturais (Cenap), de Atibaia (SP).

Onças e os seres humanos

As onças-pintadas do Pantanal Mato-grossense estão cada vez mais sendo avistadas pelos turistas e moradores de Cáceres. Esta aproximação com o ser humano tem deixado as autoridades em alerta e a Marinha do Brasil tem orientado os condutores de embarcações que navegam pelo Rio Paraguai, em Cáceres, a não ficar perto das margens nas regiões de mata fechada. O objetivo da ação é evitar possíveis ataques de onças-pintadas.

O capitão-tenente responsável pela Agência Fluvial do município, Pedro Garcia de Carvalho, disse que a Marinha tem recebido muitas informações de onças andando muito próximas aos rios e, diante disso, as equipes estão parando as embarcações por meio de inspeções para fazer este alerta.

Pegadas de onça foram encontradas no local do

ataque ao pescador. (Foto: Arquivo TVCA) Cuidado, turista

Neste ano foi aprovada uma resolução pelo Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema) para tornar mais rígido o turismo de observação de onças em Mato Grosso. É que agora os observadores devem se atentar para uma série de recomendações na hora de observar o animal. A medida foi criada para garantir a segurança, já que muitos turistas costumam se arriscar na hora de fotografar o mamífero.

Pelas normas aprovadas, durante a observação só poderão ser usados binóculos, máquinas fotográficas, filmadoras e luneta. Está proibido o uso de qualquer objeto ou instrumento sonoro, visual ou que exale cheiro para não alterar o comportamento do animal. As embarcações deverão manter uma distância segura e no máximo 20 minutos de permanência no local.

Distância respeitosa

A conscientização dos seres humanos para se manter uma distância respeitosa em relação às onças é para evitar possíveis ataques que, apesar de raros, podem ocorrer. A observação é do analista ambiental do Centro Nacional de Pesquisas para Conservação de Predadores Naturais (Cenap), Paulo Roberto Amaral.

O analista ambiental comentou que é preciso evitar que as onças se acostumem com o contato com as pessoas. “O ideal é evitar a habituação do animal. É melhor que a onça-pintada mantenha o hábito de se manter distante das pessoas. Quando passa a ocorrer essa habituação de proximidade, nesse momento pode haver o risco de acontecer um ataque”, explicou.

Roberto Amaral destacou que as onças-pintadas do Pantanal não têm como hábito atacar o homem. “É muito raro um ataque de onça-pintada, porém é preciso mantê-la em áreas florestais. Isso porque a onça é um caçador oportunista”. Ele lembrou que em geral a onça é um indivíduo solitário, que tem por hábito se alimentar de animais como jacarés, queixadas (porcos-do-mato) e capivaras, fazendo um controle da população destas espécies. Em geral, elas não atacam os animais mais fortes, mas sim os mais vulneráveis.            

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