Fabio Porchat está sozinho no palco, com diversos olhos apontados em sua direção, atentos ao que ele diz. Mas essa não é mais uma de suas apresentações de stand up. Às terças-feiras pela manhã o ator encara outro papel - o de professor de "comédia em pé" na CAL (Casa das Artes de Laranjeiras), na zona sul do Rio.
O gênero, sucesso há décadas nos Estados Unidos, se espalhou nos últimos anos pelo Brasil, principalmente com a popularização de sites como o YouTube, que exibe vídeos de humoristas conhecidos, ou não, do grande público. Para oxigenar sua linha de humorísticos, a televisão assimilou estes talentos. CQC, Comédia MTV, 15 minutos, entre outros programas, têm entre seus integrantes humoristas de stand up.
Porchat, que foi por quatro anos do Zorra Total, atualmente é roteirista do "Esquenta", programa de auditório da Regina Casé, e do "Junto e Misturado", ambos da TV Globo. Formado na própria CAL e com um curso não concluído de Artes Cênicas na UNI-Rio, aos 27 anos, Porchat está em sua oitava turma de formação de jovens talentos para stand up.
Com duração de 24 horas divididas em oito terças-feiras (portanto três horas de aula por semana), Porchat fala sobre as diferenças de stand up para esquetes de imitadores, apresentando DVDs de apresentações diversas. A inscrição custa R$ 85, além de duas parcelas de R$365. Na turma de 20 alunos das mais diferentes ocupações (e desocupações, inclusive) - tem uma dona-de-casa que não se acha engraçada, mas seus amigos sim; um estudante que não sabe que faculdade pretende fazer; um advogado que diz "adorar um palco"; além de outros profissionais liberais.
Dono da piada
De bermuda, camiseta e chinelos, Porchat explica que nunca usa tênis. "Incomoda, dá trabalho essa coisa de amarrar e desamarrar o tempo todo". A plateia, ou melhor, os alunos acham graça. Eles também riem quando o ator-professor diz frases como "o problema não é a primeira vez que você não dá a segunda. Mas a segunda vez que você não dá a primeira". Porchat ressalta por mais de 30 minutos que o que diferencia o stand up para os demais tipos de humor é que neste o ator faz seu próprio texto. "É bom falar isso logo no começo, porque muita gente acha que pode copiar texto dos outros, que é tudo improviso. E não é", diz.
Ele próprio já foi acusado por Rafinha Bastos de ter copiado uma piada sua para seu espetáculo. Porchat é quem traz o assunto à tona. "Naquela ocasião, ele nem quis falar comigo. Foi uma coincidência de piadas parecidas. Depois a gente se entendeu numa boa", diz.
Entre as lições que ele dá aos novatos, o que lista como "regras básicas", estão: stand up não tem cenário, não é monólogo mas um papo com a plateia, é 1% improviso... Alguns anotam, outros apenas observam atentos.
A polêmica surge quando Porchat diz que "humor é falar mal de qualquer coisa". Uma aluna se inquieta: "De tudo mesmo?". "Sim, de tudo. Até de genocídio. Eu posso fazer uma piada ótima sobre genocídio. Mas preciso saber para quem estou fazendo a piada. O povo de São Paulo, por exemplo, não gosta de piadas sobre acidente da TAM", diz ele. Os pupilos riem convulsivamente.
Canalizando o humor
Para Eloy Nunes, ator formado, o curso lhe serve como exercício de comédia. "Quero ser engraçado automaticamente, quero ter humor sem precisar fazer esforço", diz. Já a dona-de-casa Liliana Cupolillo diz que só se inscreveu porque os amigos a acham divertida. "Eu nem me acho tão engraçada, tenho vergonha de me expor. Mas vai que eu dou para isso", afirma, ainda sem a autoconfiança necessária aos palcos.
Porchat diz não ter "piada pronta" para quem não tenha o timing da comédia. "O que faço aqui é canalizar a vertente do humor na pessoa. Tem gente, por exemplo, que é muito engraçada sendo mal-humorada", ensina. Não é o caso do advogado Claudio José Silva, que vai à aula de calça, camisa e sapatos sociais. "Saio daqui e vou para o trabalho. Na verdade, na minha profissão também preciso ser um pouco ator. O que eu quero é levar mais humor para o outro lado", diz, rindo de si mesmo.
O sucesso das aulas se traduz na grande procura pelo curso. No próximo mês a CAL vai abrir mais uma turma, dessa vez aos sábados, para os que não arrumam tempo durante a semana para se dedicar à comédia "despretensiosa" que muitas vezes surge nas mesas de bar. Se depender de Porchat e seu didático empenho em formar humoristas, logo haverá no mercado uma leva de advogados, dentistas, bancários e engenheiros fazendo piada com qualquer coisa. E em qualquer lugar.
Dicas para quem quer fazer stand up, segundo Fabio Porchat:
1. Stand up não pode ter personagem, cenário ou trilha sonora
2. O comediante tem que escrever o próprio texto
3. Stand up não é monólogo, mas um diálogo com a plateia
4. Não pode haver piadas conhecidas
5. Stand up é 1% improviso. Muita gente não sabe, mas isso aqui é texto decorado
6. Humor é falar mal de alguém ou de alguma situação. E vale qualquer coisa. Não pode ter censura
7. Se a plateia não rir de você nos dez primeiros segundos, você vai passar dez minutos tentando convencê-la de que você é engraçado
8. Todo mundo pode fazer stand up. Até o mal-humorado tem seu lado engraçado. Só tem que saber canalizar o humor.
Por: Valmir Moratelli
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