"... quando eu era criança era muito gorda, nariguda, feia... Menina não tem que ser feia tem que ser sempre bonita, perfumada, vistosa ... eu acho isso, e todo mundo acha, a sociedade cobra isso o tempo todo." (Relato de uma paciente com bulimia nervosa durante uma sessão de psicoterapia)
"Relatos como este são comuns quando se trabalha com bulimia e anorexia nervosa", diz a professora e psicóloga Maria Cristina Dotto, do Instituto de Neurociência e Comportamento de São Paulo.
De acordo com ela, uma busca insaciável pela suposta beleza e perfeição está presente constantemente nas adolescentes. Explorar esta área é adentrar em tantas diferentes leituras e mesmo assim, nenhuma conclusiva. Seu levantamento com pacientes que sofrem destes distúrbios apontam que aproximadamente 90% são mulheres.
Uma das hipóteses sobre os fatores responsáveis pelo aumento da incidência de transtornos alimentares é influência cultural sobre imagem corporal. Percebe-se que o crescente valor dado à aparência física, submetida aos atuais padrões de beleza voltados ao ser magro, tem ocasionado um crescente aumento nas dietas alimentares, hoje, em condições epidêmicas, sendo raro encontrar uma mulher de dezoito anos que nunca tenha se submetido a uma delas. Baseada em teóricos sobre o assunto, a professora diz que a valorização da beleza corporal feminina tem se desenvolvido através da história em que "a mulher magra passa a ser vista como mais harmoniosa e sensualmente mais atrativa, representando ideal de saúde, de rendimento e de êxito".
Apesar desta inicial análise, que pode ser atraente para uma visão centrada na determinação ambiental do comportamento, outras possibilidades são exploradas no estudo da etiologia destes problemas comportamentais.
Descrição:
A professora define os transtornos alimentares como distúrbios comportamentais caracterizados por uma grave perturbação no comportamento alimentar, levando o indivíduo a apresentar comportamentos bizarros no ato de se alimentar, estando entre eles à anorexia e a bulimia nervosa.
Atualmente mais conhecida pela medicina e psicologia, a existência desses transtornos não é herança da pós-modernidade, como se pode inicialmente pensar. Pode-se considerar anorexia, bulimia e obesidade transtornos da alimentação relatados desde a civilização romana, em que casos descritos de orgias alimentares, jejum e comportamentos purgativos já demonstravam a existência de comportamentos alimentares mal adaptados. Os possíveis fatores responsáveis comuns, desde a antiguidade que podem ser a causa de uma desordem alimentar são divididos em: individuais, familiares e culturais.
Os fatores individuais mais comuns são: a preocupação com a autonomia, identidade e separação; distúrbios perceptuais, como da imagem corporal, encontrados, tanto na anorexia nervosa quanto na bulimia nervosa; preocupação com o peso (fator determinante destes transtornos alimentares); distúrbios cognitivos (crenças disfuncionais); acentuada autocrítica; perfeccionismo; sensibilidade às críticas; baixa auto-estima e uma ansiedade interpessoal aumentada.
Na área da influência familiar, é descrita a predisposição biológica hereditária, como no caso das mudanças hormonais da puberdade e como fatores agravantes, como o efeito da desnutrição no estado mental dos pacientes. Além disso, as taxas de desordens alimentares entre parentes de primeiro grau são seis a dez vezes maiores do que em relação à população em geral. Este alto índice de incidência intrafamiliar também pode ser compreendido, não apenas como um fator hereditário, mas através de aprendizagem comportamental entre estes parentes.
A história de alcoolismo, de distúrbios afetivos, de obesidade, interações pais-criança que levem aos problemas relacionados à autonomia e à separação, são também áreas das relações familiares envolvidas no desenvolvimento dos distúrbios alimentares. Na esfera familiar aponta-se também a rigidez familiar e a grande importância dada às aparências, tanto na questão física (ser magro, bem vestido), quanto no desempenho de diversos setores da vida.
Ainda, dentre os fatores envolvidos nas causas dos distúrbios alimentares, estão os culturais. A pressão pela forma esbelta é um deles, podendo ser entendida dentro do contexto cultural atual, onde padrões de beleza e saúde são vinculados à forma estética, e esta, por sua vez, à magreza. Na verdade, ser magro acaba por significar ser feliz, bem sucedido, aceito, respeitado e saudável.
A Bulimia e a Anorexia não podem ser tratadas sem a visão de uma dimensão social, psicológica e individual. Elas são cada vez mais dominantes e divergem de acordo com a história de cada um.
Postado por: Claudia Moraes
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