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Saúde

Polêmica marca projeto de Serra que "privatiza" atendimentos na saúde

Polêmica marca projeto de Serra que "privatiza" atendimentos na saúde

Fonte: Atualizado: sábado, 29 de março de 2014 às 03:29

O governo de São Paulo pretende destinar até 25% do atendimento nas unidades públicas de saúde do estado a pacientes com planos de saúde particulares. Para isso, enviou no final de 2008 à Assembléia Legislativa projeto de lei complementar (PCL-62/2008), por meio da deputada Maria Lucia Amary (PSDB). Aprovado em plenário, o projeto, que promove alterações na Lei Complementar nº 846, de 1998, aguarda agora a sanção do governador José Serra.

A intenção do governo estadual é permitir que os hospitais estaduais gerenciados por Organizações Sociais de Saúde (OSS) possam ser reembolsados por atendimentos prestados a pacientes que tenham planos de saúde.

Segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde, entre 20% e 30% das pessoas atendidas nesses hospitais atualmente possuem convênios privados, mas a conta pelo atendimento destes pacientes vai para o SUS (Sistema Único de Saúde). Com a mudança, os hospitais poderão cobrar dos planos pelo atendimento prestado a seus clientes, até o limite de 25% do total de atendimentos.

"Atualmente, parte da população procura as unidades de referência do estado, mesmo possuindo um plano de saúde que possibilita o atendimento nos hospitais particulares. A população paga a conta duas vezes. Através dos impostos e da mensalidade do plano", explicou a deputada Maria Lúcia.

A deputada negou também que o sistema de saúde público esteja sendo privatizado com as mudanças propostas. "A nossa proposta é a de apenas corrigir uma injustiça paga com o dinheiro público. E o atendimento continuará da mesma forma. O usuário do SUS não será prejudicado em absolutamente nada", garantiu.

A Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge), que representa as empresas que gerenciam os planos de saúde, informou ao G1, por meio de sua assessoria de imprensa, que só irá se manifestar por ocasião da sanção do governador José Serra ao projeto complementar de lei.

A Promotoria de Direitos Humanos (área de saúde pública) do Ministério Público de São Paulo, por sua vez, vai questionar a constitucionalidade da lei, de acordo com o promotor Arthur Pinto Filho. Segundo ele, a mudança vai resultar em prejuízo para os usuários do SUS.

"Pela lei, as OSSs vão atender 75% dos usuários do SUS e 25% de clientes com planos de saúde, em vez de atenderem os 100% do SUS como funciona atualmente. Conversando recentemente com uma senhora, ela me disse que teve de esperar seis meses por uma consulta com um ginecologista. Com a mudança, ela terá de esperar os seis meses mais um acréscimo de 25% neste tempo. Ou seja, sete meses e meio de espera", argumentou Filho.

Demanda regional

Pelo modelo de Organizações Sociais de Saúde, que existe há 11 anos no estado, alguns hospitais estaduais de referência são gerenciados por entidades do terceiro setor, sem fins lucrativos. A Casa de Saúde Santa Marcelina, a Associação Congregação de Santa Catarina e Cruzada Bandeirante São Camilo, entre outras, são alguns dos exemplos administrados por este sistema.

Pelo projeto, entraria neste sistema a unidade hospitalar que for detentora de mais de 50% da oferta de serviços da região de inserção. "Isso significa que a unidade acaba por atender uma demanda não somente de sua cidade bem como de toda uma região. Esta, por sua vez, absorve também muitos pacientes que possuem plano de saúde. Os recursos provenientes dos planos de saúde ajudarão a manter estes hospitais que atualmente estão sobrecarregados", explicou a deputada.

De acordo com a secretaria de saúde, os recursos oriundos do reembolso feito por planos de saúde serão revertidos em benefício do próprio hospital e dos pacientes do Sistema Único de Saúde, como já acontece no Instituto do Coração de São Paulo (Incor-SP).

Conforme a secretaria, as instituições são qualificadas por critérios técnicos, como experiência mínima de cinco anos na prestação de serviços de saúde, e escolhidas para administrar hospitais mediante convocação pública, quando são analisados os projetos apresentados por cada entidade.

Além disso, são estabelecidos metas de produção (consultas, exames, cirurgias, internações, partos) e de qualidade, como, por exemplo, controle da infecção hospitalar e redução das taxas de cesárea. Um levantamento da secretaria de saúde aponta que os hospitais gerenciados por OSS atendem 25% mais pacientes e gastam 10% a menos, proporcionalmente, na comparação com as unidades de administração direta. Do orçamento de cada OSS, 10% ficam condicionados ao cumprimento das metas de qualidade, segundo a secretaria estadual de saúde.

Prestação de contas

O sistema de OSS, no entanto, vem sendo questionado judicialmente desde a sua criação, segundo o promotor Arthur Pinto. "É um modelo experimental, que está sendo analisado ainda. E o que temos observado é que não há uma fiscalização da prestação de serviços e nem da prestação de contas. Esta prestação de contas é feita de forma ineficiente. Este é o segundo ponto que questionamos neste sistema", afirmou.

Atualmente, há 25 hospitais estaduais sob contrato de gestão com Organizações Sociais de Saúde, que atendem usuários por intermédio do SUS, apesar destes possuírem plano de saúde. Segundo a secretaria, foram comparados 13 hospitais sob o novo modelo e outros 13 de gestão tradicional, com orçamentos, plantas e número de leitos similares.

Além disso, a emenda pretende incluir na Lei nº 846/98 a possibilidade de qualificação das fundações de apoio aos hospitais de ensino como Organização Social de Saúde, desde que tenham existência de pelo menos 10 anos ou mais.

Este é mais um ponto que está sendo questionado pela Promotoria. "Esses equipamentos [unidades hospitalares] são entregues sem licitação. Não há qualquer critério objetivo", afirmou Arthur Pinto.

Devido a isso, assim que a lei for sancionada por Serra, o Ministério Público paulista acionará o procurador geral da República para entrar com uma ação direta de controle de constitucionalidade das leis no Supremo Tribunal Federal (STF), segundo o promotor. "E sempre que houver um novo contrato deste tipo este será questionado na Justiça caso a caso", finalizou Arthur Pinto.

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