Andar em Berlim é como caminhar pela história. Mesmo 20 anos após a queda do muro, símbolo extremo da Guerra Fria, a cidade guarda intactos pedaços desse passado em diversos memoriais. As barreiras físicas não estão mais lá, foram quase que totalmente demolidas, mas algumas viraram monumentos - para mostrar que durante os 28 anos em que o muro esteve de pé, vidas foram destruídas, histórias modificadas e sonhos enterrados.
Os dilemas trazidos pela convivência (dividida pelo muro) de dois sistemas opostos - do lado ocidental, o capitalismo e, do oriental, o socialismo - deixou marcas físicas e sociais profundas que definiram o rumo do país e da história mundial. Eu me lembro de, em 1989, com apenas 9 anos de idade, assistir às cenas da queda do muro sem muito entender. Eram imagens de um povo feliz, que comemorava o fim de uma era de sofrimento. Mas que, como eu disse, deixou sequelas perceptíveis ainda hoje quando andamos pelas ruas de Berlim.
Antes de chegar ao país marcado pela intolerância, a imagem que eu tinha da capital alemã era a de uma cidade cinza, habitada por um povo fechado; resquícios das guerras e do terror do nazismo. Mas não. Berlim esbanja vida, seja no centro econômico, seja no lado alternativo, no Leste e no Oeste. Em bairros como Kreuzberg, por exemplo, após a divisão, artistas, punks, ativistas e estudantes fizeram surgir uma nova cidade, unificada e que aceita a diversidade. Pelas mãos de jovens da geração pós-queda, onde antes havia segregação, nasceram teatros, centros de produção cultural e galerias. Prédios que experimentam e ousam, criam e fazem acontecer. Por onde passava o muro, existe arte.
Kita Schoroeter, 29, e Simon Siewert, 31, são dois dos diversos estudantes que escolheram a ex-região oriental para morar. Quando o muro caiu, ela, assim como eu, tinha apenas nove anos. Mas ao contrário do que foi para mim, para ela a queda teve importância ainda maior. "Morava a 20 metros da fronteira e nunca tive vontade de saber o que existia do outro lado porque minha família toda estava na parte oriental. Me lembro que, naquela época, jurávamos a bandeira, falávamos sobre socialismo e sonhávamos com um Kinder (chocolate) no Natal", conta a jovem.
Para quem não tinha contato com o mundo exterior, era uma vida muito boa, o sistema funcionava e nada faltava", completa. Depois da queda, em 1989, o pai de Kita perdeu o emprego e rendeu-se à bebida. Situação que Simon compreende, apesar de ter uma outra visão sobre o comunismo. "Minha avó morava no subúrbio de Berlim Oriental. Para mim, lá sempre foi cinza, e o ocidente, cheio de cores", compara.
Sem esquecer da história, reerguem monumentos destruídos, levantam outros pela paz e, assim, renovam sua força, esperando que para as novas gerações as coisas sejam diferentes. E começam a ser. Berlim é uma metrópole moderna que impressiona pela arquitetura, pela tecnologia, pela infraestrutura e pelos amplos espaços tomados por gente, muita gente.
Pessoas que vão e vêm, entram e saem, a pé ou de bicicletas (são muitas), e consomem história e cultura. Por isso parece ser tão importante preservar pedaços do que foi a fronteira do terror. Uma forma de não enterrar a história vivida pelo país. Os fatos & ONDE IR
Centro de Documentação do Muro. O espaço é um memorial que guarda documentos relativos à construção do muro e às pessoas mortas durante os anos em que ele esteve em pé. Fica na Bernauerstrasse, rua marcada por conflitos e cenas históricas. Lá é possível ver uma área preservada que mostra como era a fronteira naquela época.
Stralauer Allee
A rua à beira do Rio Spree preserva uma boa parte do muro, hoje colorido por artistas. A areia, que antes era usada para vigilância (através das pegadas que eram deixadas por quem tentasse atravessar), virou uma espécie de praia.
Checkpoint Charlie
O posto militar que controlava a entrada e saída de estrangeiros e membros das Forças Aliadas da Alemanha Ocidental para a Alemanha Oriental hoje virou museu e ponto turístico. Fica na rua Kochstrasse.
Potsdammer Platz
O que antes era terra de ninguém, espaço vago entre as duas Alemanhas, agora é uma das áreas mais modernas da cidade. Trechos do muro foram mantidos e pedras no chão traçam a linha por
onde a divisão passava. Aliás, isso é possível se ver em diversas regiões da Berlim unificada. Vale a pena andar olhando para o chão.
Portão de Brandenburgo
O monumento que foi um dos símbolos da divisão, hoje representa a unificação. Antes palco para demonstrações de poder de ambos os lados, o portão agora é espaço para manifestações políticas e civis.
Por: Tatiana Wuo
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