Daniel Ramos

Daniel Ramos

Daniel Ramos é professor de teologia deste 2013 pela EBPS (Assembleia de Deus em Belo Horizonte). Graduado em Teologia pela PUC Minas (2013), pós-graduação em Gestão de Pessoas pela PUC Minas (2015), especialista em Docência em Letras e

Descanso na sombra do bom pastor: Uma exegese do aclamado Salmo 23

Nenhum outro texto da Escritura é tão conhecido quanto o Salmo 23.

Fonte: Guiame, Daniel RamosAtualizado: quinta-feira, 7 de agosto de 2025 às 17:17
(Imagem ilustrativa gerada por IA)
(Imagem ilustrativa gerada por IA)

O Salmo 23, um dos mais amados e recitados textos bíblicos, transcende sua beleza poética para oferecer uma profunda reflexão sobre a provisão, proteção e, notadamente, o descanso que o Senhor, como Bom Pastor, concede à vida de Seus servos. Neste salmo, o salmista Davi, com a sensibilidade de quem conhece a vida pastoril, pinta um quadro vívido da relação entre ovelha e pastor, usando-se como a ovelha e Deus como o Pastor, ressaltando a tranquilidade e a segurança que advém dessa dependência.

O Pastor que Conduz ao Descanso (v. 1-3a)

O salmo inicia com a declaração fundamental: "O Senhor é o meu pastor; nada me faltará." Essa afirmação estabelece o tom de total confiança e suficiência. A ausência de carência é uma consequência direta da presença e ação do Pastor. Em seguida, Davi descreve as ações do Pastor que conduzem ao descanso: "Deitar-me faz em verdes pastos, guia-me mansamente a águas tranquilas."

A imagem dos "verdes pastos" evoca um lugar de abundância e nutrição. Para uma ovelha, deitar-se em pastos verdes não é apenas uma questão de alimentação, mas de contentamento e segurança. Ovelhas só se deitam para descansar quando se sentem completamente seguras, alimentadas e livres de ameaças. O Pastor garante essas condições ideais. Da mesma forma, as "águas tranquilas" representam refrigério e paz. Ovelhas são avessas a águas agitadas; elas precisam de um lugar sereno para beber sem medo. Essa metáfora ilustra a capacidade do Senhor de nos conduzir a um estado de paz interior, onde as ansiedades e as turbulências da vida são acalmadas.

O "restaura a minha alma" (v. 3a) é o ápice desse processo de condução ao descanso. A alma, no contexto hebraico, representa o ser integral – mente, emoções, vontade. A restauração implica revitalização, renovação de forças e cura interior. É o efeito transformador da presença do Pastor que tira o Servo de Deus do esgotamento e o leva a um estado de plenitude e vigor, permitindo um descanso profundo e verdadeiro.

O Descanso em Meio à Adversidade (v. 3b-4)

O salmo prossegue com uma aparente transição, mas que na verdade aprofunda a compreensão do descanso do Servo de Deus: "Guia-me pelas veredas da justiça por amor do seu nome. Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal nenhum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam." Aqui, o descanso não é retratado como a ausência de desafios, mas como a capacidade de permanecer em paz apesar deles.

As "veredas da justiça" indicam um caminho de retidão e obediência, que nem sempre é fácil. No entanto, o Pastor continua a guiar. E mesmo no "vale da sombra da morte", um lugar de perigo extremo e angústia profunda, o descanso do Servo de Deus não é abalado. A presença do Pastor ("porque tu estás comigo") é a garantia dessa paz inabalável. A vara e o cajado, instrumentos de disciplina e proteção, servem como fonte de consolo. Em outras palavras, mesmo quando a vida exige coragem e enfrentamento, o Servo de Deus descansa na certeza da presença protetora e orientadora do seu Pastor. Não é um descanso de fuga, mas um descanso de confiança inabalável.

O Descanso na Presença do Inimigo (v. 5-6)

Finalmente, o salmo culmina com uma imagem poderosa de banquete e habitação que reitera a profundidade do descanso: "Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos; unges a minha cabeça com óleo; o meu cálice transborda. Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida; e habitarei na Casa do Senhor por longos dias."

A "mesa preparada na presença dos meus inimigos" é uma imagem de vitória e provisão abundante em meio à hostilidade. Enquanto os inimigos observam, o Servo de Deus desfruta de um banquete preparado pelo Pastor. Isso demonstra um nível de segurança e despreocupação que só pode vir de um descanso profundo na soberania e no poder de Deus. A unção com óleo, um sinal de honra e alegria, e o cálice que transborda, indicando bênção superabundante, são manifestações do cuidado meticuloso do Pastor.

O "descansar" aqui se manifesta na confiança na bondade e misericórdia que perseguirão o Servo de Deus por toda a vida. Não é um evento isolado, mas uma condição contínua. E a promessa de "habitar na Casa do Senhor por longos dias" – ou seja, por toda a eternidade – é o descanso último e definitivo, a garantia de uma comunhão ininterrupta com o Pastor.

Em síntese, o Salmo 23 não apresenta o descanso como uma mera ausência de atividades, mas como um estado de serenidade profunda e confiança inabalável que permeia todas as esferas da vida do Servo de Deus. É o descanso que vem da submissão à liderança do Bom Pastor, dá certeza de Sua provisão em tempos de fartura, de Sua proteção em tempos de perigo e de Sua soberania em meio aos desafios. Para o Servo de Deus, o verdadeiro descanso não está em escapar das lutas, mas em encontrar paz e segurança na presença constante do Senhor, que, como um Pastor amoroso, cuida de cada uma de Suas ovelhas, levando-as a pastos verdejantes e águas tranquilas, e guiando-as em seus caminhos, até o descanso eterno em Sua Casa.

 

Daniel Santos Ramos (@profdanielramos) é professor, possui Licenciatura em Letras Português-Inglês (UNICV, 2024) e bacharelado em Teologia (PUC MINAS, 2013). Pós-graduado em Docência em Letras e Práticas Pedagógicas (FACULESTE, 2023). Mestre em Teologia (FAJE, 2015). Atualmente é colunista do Portal Guia-me, professor de Língua Portuguesa no Ensino de Jovens e Adultos (EJA) e Ensino Médio e de Língua Inglesa no Ensino Fundamental (ll) da SEE-MG, professor de Teologia no IETEB e professor de Português Instrumental do IE São Camilo. Escreveu dois livros, "Curso de Teologia: Vida com Propósito" (AMOB, 2023) e "Novo Curso de Teologia: Vida com Propósito (IETEB, 2025). Além de possuir mais de 20 anos de experiência na ministração da Palavra. É membro da Assembleia de Deus em Belo Horizonte (desde sempre), congrega no Templo Central.

* O conteúdo do texto acima é uma colaboração voluntária, de total responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal Guiame.

Leia o artigo anterior: Não existe teologia fora do cristianismo. Uma dissertação crítica

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