Getúlio Cidade é escritor, tradutor e hebraísta, autor do livro A Oliveira Natural: As Raízes Judaicas do Cristianismo e do blog de mesmo nome onde publica estudos bíblicos com ênfase na história, língua e cultura judaicas relacionadas ao cristianismo.
No pôr do sol de 22 de setembro, inicia-se o novo ano judaico e com ele a Festa das Trombetas, também conhecida por Rosh HaShana. O mandamento específico para esta Festa do Senhor é o toque do shofar que, na antiguidade, servia de convocação e ajuntamento para todo o povo. O shofar ainda é tocado hoje, durante a Festa, seja em Israel ou nas comunidades judaicas da diáspora, e possui forte significado profético.
A Torá ordena a Festa das Trombetas e atribui papel relevante ao toque do shofar em sua observação. “O Senhor disse a Moisés: ‘Dê as seguintes instruções ao povo de Israel. No primeiro dia do sétimo mês, tenham um dia de descanso absoluto. Será uma reunião sagrada, uma celebração memorial comemorada com toques de trombeta (shofar). Não façam nenhum trabalho habitual nesse dia, mas apresentem ofertas especiais para o Senhor’” (Levítico 23:23-25).
Teruah e Teshuvah
A tradução de Yom Teruah por Festa das Trombetas não traduz a exatidão de seu significado original. A palavra teruah equivale a uma explosão, um forte barulho ou um sonido de alarme alto, normalmente ligado ao sentimento de euforia e regozijo. Em outras passagens, sua tradução se aproxima mais de seu sentido original, como em Josué 6:20, quando o povo, ao ouvir o som dos shofarot, “gritou com grande brado” e o muro de Jericó caiu.
O shofar tem papel fundamental no mês que antecede Rosh HaShana, conforme destaquei no último artigo desta coluna. A cada manhã, bem cedo, ouve-se seu toque como um chamado a Teshuvá (arrependimento). É um mês de introspecção cujo propósito é conduzir a uma autoanálise de ações, palavras e pensamentos diante de Deus e dos homens, de modo a produzir arrependimento do mal cometido e correção de vereda. A mensagem é: arrependa-se antes que chegue Rosh HaShana, o dia do juízo.
O juízo iminente
As Festas do Outono se iniciam em Rosh HaShana e apontam para a chegada do Messias, quando virá para julgar toda a Terra. Esse é um dos motivos que, dentre vários nomes, Rosh HaShana é conhecido como Dia do Juízo. Esse também é um tema abundante em todas as Escrituras, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento. As visões ortodoxa, tradicional e messiânica (ramo do judaísmo que crê em Yeshua) concorrem nesse ponto. Portanto, ouvir o chamado do shofar, a cada manhã, é um preparativo para a chegada do Messias, bem como para o juízo dela resultante.
Outro significado relevante na tradição rabínica para Rosh HaShanah é nos lembrar do alerta dos profetas que é comparado ao shofar, conforme Ezequiel 33:4-5. Aquele que ouve seu toque e atenta, salvará sua vida. Aquele que o ouve e o ignora, seu sangue recairá sobre si. Esse mesmo toque do shofar inspira uma sensação de tremor e temor, o que nos leva a buscar uma maior proximidade de Deus com humilhação e confissão.
Assim declara o profeta: “Será ouvido o som do shofar na cidade sem que o povo estremeça?” (Amós 3:6). É um alerta para o juízo iminente de Deus que será executado em Rosh HaShanah, quando toda a humanidade será julgada, conforme declara o versículo: “O grande dia do Senhor está perto [...] dia do soar do shofar e de alarido (teruah)” (Sofonias 1:14-16).
Anúncio da era messiânica
As Escrituras em hebraico distinguem entre o shofar (chifre de carneiro) e a trombeta de prata (chatzotzerah). Contudo, ambos eram usados para propósitos similares, a saber: convocar Israel para orar e adorar (como em Rosh HaShanah); chamado à guerra; entronização de reis; e anúncio do ano do Jubileu. Essa herança moldou o emprego do shofar no Novo Testamento. De modo curioso, cada uso do shofar, no Antigo Testamento, se encaixa perfeitamente na segunda vinda do Messias.
Esses eventos são proféticos e se cumprirão em breve, quando o Filho do Homem se manifestar para inaugurar a era messiânica. Eles estão diretamente ligados ao toque do shofar. Isso é bem ilustrado no livro de Apocalipse que menciona o shofar diversas vezes como sinal de juízo (sete trombetas), durante o Dia do Senhor.
O shofar anuncia a chegada de um rei, como no salmo 98:6, e o próprio Jesus afirmou que surgirá no céu com um forte toque de shofar (Mt. 24:30-31). O shofar também anunciava a chegada do noivo para tomar a noiva em casamento. Também é um lembrete da ressurreição dos mortos, conforme a interpretação judaica de Isaías 18:3, em que todos os moradores da Terra ouvirão seu som. O apóstolo Paulo confirmou isso, em 1Coríntios 15:52, quando o shofar soará e os mortos ressuscitarão incorruptíveis; e 1Tessalonicenses 4:16, em que o Senhor, tocado o shofar, descerá dos céus e os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro.
Um estudo sobre o shofar demonstra que seu som não é meramente cerimonialístico, mas profético. Representa a voz de autoridade de Deus de forma audível. Sim, Deus está falando com o mundo hoje, mas somente os filhos reconhecem sua voz. A Festa das Trombetas foi o dia escolhido por Ele para se ouvir o toque do shofar o dia inteiro. É o tempo de afinarmos nossos ouvidos com o tom de sua voz a fim de nos levar à obediência para seguir suas veredas sem nos desviarmos, rumo ao alvo que é Yeshua HaMashiach, pois o Rei está às portas. Essa é a essência de Rosh HaShanah.
Para saber mais, acesse https://www.aoliveiranatural.com.br/2023/09/12/rosh-hashanah-e-o-toque-do-shofar/
Getúlio Cidade é escritor, tradutor e hebraísta, autor de A Oliveira Natural: As Raízes Judaicas do Cristianismo e do blog www.aoliveiranatural.com.br.
* O conteúdo do texto acima é uma colaboração voluntária, de total responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal Guiame.
Leia o artigo anterior: Teshuvá — um chamado ao arrependimento
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