Nigeriano ouve a voz de Deus em ataque do Boko Haram: “Ele me livrou das balas”

Em entrevista ao Guiame, Ibrahim contou como sobreviveu a um ataque do Boko Haram na Nigéria em 2014.

Fonte: Guiame, Luana NovaesAtualizado: sexta-feira, 18 de outubro de 2019 às 16:13
Ibrahim sobreviveu a um ataque do grupo terrorista Boko Haram na Nigéria em 2014. (Foto: Portas Abertas)
Ibrahim sobreviveu a um ataque do grupo terrorista Boko Haram na Nigéria em 2014. (Foto: Portas Abertas)

Enquanto escutava tiros e gritos provocados por um ataque terrorista do Boko Haram, Ibrahim ouviu um som que se sobressaiu — era a voz de Deus, dizendo: “Nada vai acontecer a você”.

Em junho de 2014, por volta das 4h30 da manhã, Ibrahim (nome fictício por razões de segurança) tinha acabado de terminar seu devocional e estava pronto para trabalhar como agricultor em sua propriedade, no norte da Nigéria. 

Até que os terroristas do Boko Haram invadiram a comunidade com carros e tanques fortemente armados, gritando ‘allahu akbar’ (que significa ‘Alá é o maior’) e “cristãos, seu fim chegou hoje”.

“Quando vi aquela turba invadindo a vila, pensei: ‘Estou entre a vida e a morte’.  Orei por coragem e estratégia e pedi que Deus desse uma solução: sair da casa e enfrentar o grupo lá fora ou esperar que minha casa fosse invadida ou até atingida por lança-foguetes”, disse Ibrahim em entrevista exclusiva ao Guiame

“Então ouvi uma voz que dizia: ‘Você não vai morrer hoje. Nada vai te acontecer. Estou com você’”, acrescentou o nigeriano.

Ibrahim sabia que sua casa seria invadida a qualquer momento, então decidiu fugir mesmo com os disparos. “Correndo, me dirigi a Deus entregando a ele a minha vida. Deus tem um plano para mim, pois as balas passavam por mim e tudo o que eu podia ouvir eram sons de tiros em minha direção”, conta. “Não sei quando parei de correr, mas Deus me livrou das balas e de ser capturado pelo grupo”.

Assim como seus vizinhos, Ibrahim perdeu sua casa e todos os seus bens — mas não perdeu a fé. “Em nenhum momento me senti abandonado por Deus ou desamparado por Ele. Ele sempre esteve comigo e me fazia sentir Sua presença e Seu amor”, destaca.

O extremismo islâmico deixou marcas profundas na Nigéria: de 4.305 cristãos mortos no mundo em 2018, 3.731 foram no país africano. A violência religiosa colocou a Nigéria no 12º lugar na Lista Mundial da Perseguição da Portas Abertas, que classifica os 50 países que mais perseguem cristãos no mundo.

Ibrahim esteve no Brasil entre os dias 27 de setembro e 13 de outubro para compartilhar seu testemunhos nas igrejas. Em entrevista ao Guiame, ele falou como o Boko Haram tem assolado os cristãos nigerianos. Confira abaixo na íntegra:

Guiame: Como aconteceu sua conversão ao cristianismo? 

Ibrahim: Minha família é cristã há gerações, então eu nasci num lar cristão, aceitei a Jesus ainda muito pequeno, ouvindo meus pais falando do amor de Deus. 

Tive uma infância e adolescência muito tranquila em família. Já existia a perseguição, desde sempre. Os cristãos não eram aceitos em todas as escolas, muitas vezes ficávamos meses sem conseguir matrícula. Diziam que era por falta de vagas, mas nossos vizinhos muçulmanos não enfrentavam os mesmos problemas e tinham suas vagas em escolas garantidas de um ano para o outro. 

Os homens de famílias cristãs também não conseguiam trabalho com a mesma facilidade que os muçulmanos e comercializar também sempre foi muito mais difícil para o cristão, que muitas vezes tinham suas lojas ou produtos boicotados. Isso me fazia querer mais e mais seguir a Jesus e nunca me desviar de seus caminhos. Nunca passamos necessidade, pois sempre confiamos que a solução viria de Deus. 


Ibrahim sobreviveu a um ataque do grupo terrorista Boko Haram na Nigéria em 2014. (Foto: Portas Abertas)

Guiame: Como é a realidade dos cristãos na região onde você mora?

Ibrahim: É muito difícil ser cristão na minha região. Principalmente após os ataques entre 2014 e 2016, ficamos marcados por sermos cristãos. Depois que voltamos dos campos de refugiados, víamos nossos pertences com outros vizinhos, muçulmanos, que tinham sido privilegiados pelo Boko Haram. 

Da mesma forma, ainda hoje, nossos produtos e lojas são boicotados por nossa comunidade, nossas crianças ainda têm dificuldade em se matricular em escolas e sempre estamos com medo de que o Boko Haram, ou os fulanis (grupo extremista composto por pastores de cabra e agricultores), nos ataquem novamente, uma vez que eles foram expulsos da região, mas não exterminados e continuam rondando e agindo no Nordeste da Nigéria

Guiame: Qual foi a experiência mais marcante que você já teve em relação à perseguição?

Ibrahim: Em 2014, o Boko Haram atacou violentamente a vila em que eu vivia. Era uma manhã, muito cedo, por volta das 4h30 e eu tinha acabado de fazer meu devocional diário. Estava pronto a começar a trabalhar (ele é pequeno agricultor e cria pequenos animais, como galinhas, para vender e para sua subsistência, também). Então ouvi um grande barulho, gritos, tiros. 

Fui para o fundo da minha casa, no quintal, e subi na árvore mais alta para ver o que estava acontecendo. Vi que eram membros do Boko Haram, que vinham com suas bandeiras, carros e tanques e fortemente armados. Eles cantavam: “Cristãos, seu fim chegou hoje”. Naquele momento, eu percebi que estava em grande perigo. 

Eles eram muitos, se moviam rapidamente e estavam fortemente armados. Quando vi aquela turba invadindo a vila, pensei: “Estou entre a vida e a morte”.  Orei por coragem e estratégia e pedi que Deus desse uma solução: sair da casa e enfrentar o grupo lá fora ou esperar que minha casa fosse invadida ou até atingida por lança-foguetes. Então ouvi uma voz que dizia: “Você não vai morrer hoje. Nada vai te acontecer. Estou com você”. 

Ainda em cima da árvore, via as balas passando de raspão por todos os ângulos e não a atingindo. Dali de cima, comecei a ver as casas dos meus vizinhos incendiadas, assim como órgãos do governo e igrejas cristãs. Todas destruídas. Em poucos minutos, as casas, lojas, a vila toda estava destruída. E pensei: ‘Não estou seguro aqui, pois eles estão procurando casas cristãs’. 

Desci da árvore, ganhei impulso e corri o quanto pude, apenas ouvindo o Boko Haram espalhado pela vila, cantando e disparando suas armas aleatória e esporadicamente. Correndo, me dirigi a Deus entregando a ele a minha vida. Deus tem um plano para mim, pois as balas passavam por mim e tudo o que eu podia ouvir eram sons de tiros em minha direção.  

Não sei quando parei de correr, mas Deus me livrou das balas e de ser capturado pelo grupo. Minha casa foi destruída, assim como minhas aves no quintal, minha pequena biblioteca, minha loja de comida, ovos e aves. Tudo desapareceu em um segundo. 

Guiame: Como ficou a situação após o ataque?

Ibrahim: Eles não saíram da cidade e os que sobreviveram não puderam voltar. Ficamos por dois anos em campos de refugiados, vivendo de doações e de orações de cristãos em todo o mundo. O que vi e vivi em campo de refugiados ainda ressoa em minha mente. Fome, dor, medo, morte, doenças. Mas em nenhum momento me senti abandonado por Deus ou desamparado por Ele. Ele sempre esteve comigo e me fazia sentir sua presença e seu amor. 


O extremismo islâmico deixou marcas profundas na Nigéria. (Foto: Portas Abertas)

Em 2016, o exército da Nigéria retomou a minha vila das mãos do Boko Haram e eu pude voltar à minha casa. Ou ao que sobrou dela. Havia marca de tiros e furos em todos os cômodos. Minhas roupas estavam todas amontoadas em um canto. Parte dos meus móveis havia desaparecido. Havia uma TV que não era minha, e eu não tinha mais geladeira. Minha criação e plantação já não existia mais. 

Com o tempo, fomos reerguendo a casa e restituindo minhas coisas, minha plantação e criação. Hoje, vivo como antes, com a diferença de que nunca me esquecerei dos horrores do ataque e do campo de refugiados. Mas também, jamais me esquecerei do amor de Deus, que nunca me desamparou e sempre esteve comigo.  

Guiame: De que forma a perseguição está mudando na Nigéria? Qual é a nova estratégia para restringir a liberdade dos cristãos?

Ibrahim: A liberdade dos cristãos sempre foi restrita na Nigéria. Mas ela tem, realmente, se transformado. Do ataque físico e do uso de armas para matar e destruir, agora ela tem ido além da privação econômica, dominação política e discriminação e dominação étnica. 

Com toda essa pressão e violência enfrentadas todos os dias, é natural que qualquer homem viva com medo, desista facilmente, mas, desde que eu creia totalmente em Deus, Ele é capaz de manter e proteger sob sua segurança divina, até mesmo durante o ataque do Boko Haram, como aconteceu em 2014. 

Guiame: Como a igreja costuma instruir os fiéis em relação à perseguição?

Ibrahim: A perseguição acontece e está intrínseca à vida do cristão nigeriano. Lemos muito sobre os cristãos perseguidos na Bíblia, nos primeiros anos da igreja. Vemos seus exemplos e o que aconteceu com eles, que ficaram firmes até o fim. Nós falamos sobre as promessas de Deus àqueles que permanecem firmes e amam a Deus, e não negam a Jesus. 

Também contamos com o apoio da Portas Abertas que nos dá treinamento de como responder à perseguição e como permanecermos firmes, mesmo atravessando momentos de pressão e perseguição.  

Guiame: O que te motiva a permanecer em Cristo, mesmo diante dos riscos?

Ibrahim: A nossa vida continua, independente da perseguição. Saber que Deus é bom e que está comigo. Eu vou precisar viver, independente da minha escolha. Posso viver uma vida como o mundo vive, mas eu escolho viver com Deus. 

O que me encoraja é saber que minha vida é eterna em Deus e que que eu tenho uma vida na eternidade. A vida futura é maior e melhor que a presente. Eu vivo esta vida, trabalhando minha salvação, para que eu alcance a outra.

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