“Jesus desceu ao inferno depois de morrer na cruz? Essa pergunta há muito intriga os teólogos e os crentes”, diz o pesquisador cristão N.T. Wright, um dos principais estudiosos do Novo Testamento do mundo.
Segundo ele, os primeiros pais da Igreja discutiram uma descida ao Seol ou Hades, o reino dos mortos. “Algumas traduções do Credo Apostólico interpretam isso como uma descida ao inferno, provocando debate entre várias tradições cristãs”.
Wright diz que esta ideia decorre principalmente de 1 Pedro, o que sugere o que poderia ter ocorrido durante o período entre a morte e ressurreição de Cristo.
Ele explica que 1 Pedro 3:19 fala de Jesus pregando “aos espíritos aprisionados – para aqueles que foram desobedientes há muito tempo quando Deus esperou pacientemente nos dias de Noé”.
'Declaração de triunfo'
O pesquisador diz que isso sugere que, após sua crucificação, Jesus foi proclamar sua vitória a esses seres particularmente perversos em Gênesis 6.
“Isso não é pregação no sentido de oferecer a salvação, mas sim uma declaração de seu triunfo sobre o pecado e a morte”, diz.
E continua: “Da mesma forma, 1 Pedro 4:6 afirma: ‘Pois é por isso que o evangelho foi pregado até mesmo aos que agora estão mortos, para que possam ser julgados de acordo com os padrões humanos em relação ao corpo, mas viver de acordo com Deus em relação ao espírito’. A primeira vista, esta passagem pode parecer estranha, mas afirma uma proclamação mais ampla aos mortos, embora não seja claro se isso se refere ao inferno.”
Wright diz que além disso, Lucas 23:43 registra Jesus prometendo o ladrão arrependido: “Hoje estarás comigo no paraíso”, o que parece contradizer a noção de uma descida ao inferno.
“Isso destaca a complexidade de traduzir conceitos antigos como o Sheol ou o Hades para a linguagem contemporânea, onde as distinções entre ‘o lugar dos mortos’ e ‘inferno’ nem sempre são claras”.
Implicações teológicas
Segundo Wright, as implicações teológicas dessa descida foram extensivamente estudadas, com algumas interpretações vendo-a como a “angustiação do inferno”, onde Jesus liberta as almas dos justos.
“Isso é vividamente retratado em ícones ortodoxos gregos, onde Jesus é mostrado levando Adão e Eva para fora do submundo, simbolizando sua vitória sobre a morte. No entanto, essa visão não é universalmente aceita, e eu mesmo não estou convencido de que isso é o que o Novo Testamento está dizendo”.
Ele relata que muitos estudiosos continuaram a explorar o significado do Sábado Santo – o dia entre a Sexta-Feira Santa e a Páscoa. Este período, e a questão do que deve ser dito sobre a atividade ou experiência de Jesus através deste tempo, representa um profundo mistério. Mas oferece, no entanto, uma oportunidade para contemplar a solidariedade de Jesus com o mais profundo sofrimento e alienação humana.
“Em última análise, enquanto as Escrituras e a tradição fornecem várias perspectivas, a natureza precisa da descida de Cristo continua sendo um tópico de exploração teológica. Mas a imagem de Jesus trazendo a presença divina para as profundezas da angústia humana oferece uma reflexão poderosa sobre a extensão de seu amor sacrificial”, finaliza Wright.
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