Na Expoevangélica 2024, o cantor Salomão do Reggae conversou com o Guiame sobre a mudança do estilo musical gospel com a ascensão do worship nas igrejas brasileiras.
Salomão, conhecido por apresentar o Evangelho através da brasilidade em suas músicas, refletiu sobre a influência americana das traduções e versões de hinos que estão sendo adaptadas para o Brasil.
”Essa parte eu vejo com muita tristeza, com muito peso. Não que seja errado tocar isso ou trazer para a nossa congregação. Na verdade, não é um estilo ou outro que é negativo, mas a monopolização de qualquer estilo na igreja brasileira tira o Brasil da igreja, mesmo que seja um estilo brasileiro”, disse Salomão.
Para o cantor, essa “monopolização” não traduz a brasilidade, pois, segundo ele, a brasilidade e a diversidade cultural são o que fazem o brasileiro ser brasileiro.
“Conseguimos misturar os sabores, os ritmos, as cores, e isso é ser brasileiro. Quando você vai a algum lugar e vê que algo está dando certo, deveria tomar isso como exemplo. É diferente de imitar. Por exemplo, estive na Hillsong, em Londres, e ficaria muito surpreso se eles não tocassem worship e tocassem cinco músicas de Bossa Nova, entende? Seria algo forçado e ruim, porque não faz parte da cultura deles”, relatou ele.
E continuou: “Fico imaginando como eles nos veem fazendo a música deles. Não deve ser agradável, deve ser como a comida japonesa no Brasil, que já adaptamos ao nosso gosto, mas para os japoneses autênticos, não é o verdadeiro sushi. De certa forma, não percebemos que o que estamos oferecendo ao Senhor não é algo que nasce em nós, não é algo que nasce no brasileiro como essência. É diferente quando uma música ultrapassa as barreiras dos países porque o Espírito Santo quis falar algo que a Igreja Mundial precisa ouvir. Isso é diferente. Mas, por outro lado, quando tudo parece imitação, fica estranho”.
Salomão destacou que, atualmente, os jovens cristãos não conhecem outro tipo de musicalidade, e por isso, “não sabem fluir na sua brasilidade, não sabem mais ser quem ele é”.
“E o que me preocupa é que até mesmo as igrejas pentecostais, que eram minha esperança, com suas formas mais brasileiras de adoração, como o forró e outros ritmos, estão se abrindo também para esse tipo de musicalidade monopolizada. Volto a dizer, não há problema algum em adotar estilos diferentes, mas quando já se toma o outro como a única verdade, isso já é uma anomalia”, declarou ele.
”Mas o que é mais complicado é quando você vê a igreja brasileira oferecendo ao Senhor algo que não é dela. Isso eu acho muito difícil de aceitar. Tomara que voltemos à nossa essência. Eu, Salomão do Reggae, e tantos outros irmãos, estamos aqui para dizer que é possível ser quem você é e oferecer isso a Deus em adoração”, acrescentou.
Assista a entrevista no Guiame:
Fluir da adoração
Durante a conversa, Salomão também refletiu sobre a percepção das pessoas sobre o que é adoração, visto que muitos acreditam que há apenas uma única melodia que toca o coração de Deus, e não consideram outras formas de adoração.
Sobre isso, o cantor explicou: “Antigamente, tínhamos a música congregacional e já existiam algumas variações, com movimentos e situações específicas dentro do país. Talvez alguém trouxesse algo mais alternativo, e talvez eu concorde que algumas coisas não são apropriadas para o momento do culto. Mas hoje não vejo mais essa inocência nos irmãos. Antes, era uma questão de religiosidade, a música sacra tinha sua raiz e ponto final. Já era ruim por conta da religiosidade, mas agora a situação é diferente. Hoje, não é mais uma questão de inocência, mas de buscar o resultado que o americano ou o britânico alcançam. Se eles adotam uma estética específica, parece que aqui também temos que fazer igual“.
Salomão também se mostrou preocupado com a regra imposta por algumas igrejas sobre o estilo de adoração, onde o músico é obrigado a seguir um roteiro definido:
“Isso faz com que o jovem que está chegando, sem um conhecimento básico da Bíblia, já atue na música da igreja e, pela sua inocência, entenda que aquela música é a única que a igreja definiu como santa. Ele não consegue ouvir outra coisa porque se sente incomodado, como se estivesse pecando”.
“Isso não tem a ver com sacralidade ou santidade, mas sim com a busca de resultados — igrejas lotadas, bonitas, esteticamente agradáveis. Esse é o foco, e isso é muito preocupante. Alguém precisa se arrepender disso e permitir que os irmãos fluam livremente naquilo que eles são de verdade”, acrescentou.
Nova geração
Por fim, Salomão falou sobre o desafio que os líderes enfrentam para ensinar a Palavra de Deus e discipular a nova geração de cristãos:
“O desafio é serem reféns apenas da Palavra de Deus e não de resultados, não de modismos. Você pode ser contemporâneo sem ser refém da contemporaneidade. Você pode ser mais moderno, mas sem deixar de priorizar o que é bíblico. Se priorizarmos padrões estéticos, podemos estar causando um prejuízo para o Evangelho”.
Salomão explicou que a Igreja nasceu estabelecendo diálogo: “O primeiro milagre que o Senhor fez foi tocar em nossa língua para que falássemos de forma que o outro entendesse”.
“Quando venho a Fortaleza e vejo o pessoal tocando forró, sertanejo, xaxado, baião lá fora, mas na igreja só tocam músicas americanas, ainda que traduzidas, o que estamos dizendo, sem falar diretamente, é que o que eles têm de melhor, que já nasce neles, está longe de ser algo sagrado. Isso inibe as pessoas, fazendo-as pensar que a igreja é inimiga da cultura, que quer matar o que elas têm de melhor. Estamos confortáveis dentro das quatro paredes com essa musicalidade, mas não percebemos que nossa missão é comunicar o Evangelho na língua do outro”, acrescentou.
O cantor e compositor foi alcançado por Cristo aos 11 anos, desde então prega o Evangelho de forma autêntica e chama atenção por suas composições poéticas.
Hoje, Salomão faz parte do grupo cristão Trilo, que também é formado por JP e Nick. A banda aborda temas atuais, como inclusão social, preconceito, aceitação, comportamento, cidadania, entre outros assuntos, baseados na Palavra de Deus. Para eles, a harmonia dos sons e ritmos que apresentam pode ter um alcance maior de pessoas para Jesus.
“É uma musicalidade, que para a igreja hoje acaba sendo diferente. Mas é uma musicalidade brasileira. Então, não é uma banda que vem só para fazer sucesso e expandir o conteúdo, mas é uma missão que traz a possibilidade de qualquer jovem fazer música original para Cristo”, disse Salomão.
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