Tong Ying-kit, de 24 anos, foi considerado culpado nesta terça-feira (27) por incitar o “separatismo” e o “terrorismo” durante protesto em 2020. Ele se tornou a primeira pessoa condenada pela lei de segurança nacional de Hong Kong, imposta por Pequim, há um ano.
O jovem foi filmado enquanto pilotava sua motocicleta que colidiu com um grupo de policiais, enquanto carregava uma bandeira com o slogan de protesto proibido “Liberte Hong Kong, a revolução de nossos tempos”.
O incidente ocorreu no dia 1º de julho do ano passado durante manifestações de rua — um dia após a lei de segurança nacional ser revelada. Na ocasião, estava sendo comemorado o aniversário da transferência de Hong Kong do domínio britânico para o governo chinês, que aconteceu em 1997.
Legislação imposta pela China
A legislação imposta pela China, que agora é base de decisão judicial, é considerada “controversa”. Mais de 100 pessoas já estão na fila e aguardam julgamento.
A decisão contra Tong está sendo observada de perto, pois muitos querem saber como a lei será aplicada. A China está cada vez mais apertando seu controle sobre a cidade que era conhecida por “suas liberdades”.
Grupos de defesa dos direitos humanos condenaram a decisão contra Tong, que trabalha num restaurante e se declarou inocente das acusações, argumentando que o próprio slogan não incita o separatismo, nem o terrorismo.
Ele agora enfrenta uma sentença máxima de prisão perpétua, mas seus advogados devem defender uma punição mais leve em sua audiência de condenação na próxima quinta-feira (29).
Sobre o julgamento
A nova legislação de segurança nacional não apenas resultou nas acusações contra Tong, mas também definiu como o julgamento seria conduzido.
O processo, que terminou em 20 de julho, foi realizado no Tribunal Superior de Hong Kong sem júri, sob regras que permitem a exceção do sistema de direito consuetudinário (habitual) de Hong Kong, se segredos de Estado precisarem ser protegidos, forças estrangeiras estiverem envolvidas ou se a segurança pessoal dos jurados precisa ser protegida.
Os julgamentos são presididos por juízes escolhidos a dedo pela líder de Hong Kong, Carrie Lam. Lendo o veredicto, a juíza Esther Toh disse que Tong “cometeu atividades terroristas que causaram ou pretendiam causar graves danos à sociedade” em busca de uma agenda política.
Segundo a juíza, seu comportamento foi um ato de violência com o objetivo de coagir os governos central e de Hong Kong e para intimidar o público, carregando uma bandeira que constituiu um ato de incitamento ao separatismo.
Tong não falou durante a leitura do veredicto. Ele acenou para seus pais e outras pessoas na galeria enquanto era escoltado para o lado de fora. O advogado de defesa de Tong disse que “é impossível provar que Tong estava incitando o separatismo apenas por ter usado o slogan”.
A defesa também disse que não há evidências de que Tong cometeu o ato deliberadamente e que ele tentou evitar colidir com os policiais. Suas ações não podem ser consideradas terrorismo, uma vez que não houve violência grave ou dano à sociedade.
“Fim da liberdade de expressão em Hong Kong”
O veredicto foi imediatamente condenado pela Anistia Internacional, que o chamou de “o início do fim para a liberdade de expressão em Hong Kong”.
“As pessoas devem ser livres para usar slogans políticos durante os protestos, e Tong não deve ser punido por exercer seu direito à liberdade de expressão", disse o diretor regional da Ásia-Pacífico, Yamini Mishra, em um comunicado por e-mail.
“É particularmente claro que ele nunca deveria ter sido acusado de um delito de 'segurança nacional' levando a uma possível sentença de prisão perpétua”, continuou.
Pequim rejeitou as críticas, dizendo que está apenas restaurando a ordem na cidade e instituindo o mesmo tipo de proteção de segurança nacional encontrada em outros países.
Jovem é detido por policiais, em Hong Kong, enquanto protestava contra a lei de segurança chinesa, maio de 2020. (Foto: Alliance/DPA/V.Yu)
Entenda sobre o conflito entre China e Hong Kong
De acordo com o diplomata Fausto Godoy “Hong Kong perdeu a batalha contra a China”. Godoy serviu em 16 países asiáticos, incluindo China e Taiwan e hoje coordena o Núcleo de Estudos e Negócios Asiáticos na ESPM.
Ele explica que a nova lei de segurança nacional é ao mesmo tempo “para o Ocidente um ataque à autonomia de Hong Kong, ex-colônia britânica e, para a China, é a apropriação de um território que já foi seu e deveria voltar a ser”.
Qual o futuro de Hong Kong diante dos avanços da China? “O que é Hong Kong? É uma China com verniz ocidental. Se tirarmos a parte mais impressionante, é uma cidade chinesa que, durante algum tempo, de 1842 a 1997, foi inglesa”, o diplomata respondeu.
“Com a chegada do comunismo em Pequim, em 1949, muitos chineses do sul que tinham algum dinheiro partiram para Hong Kong. Como era da Inglaterra — e portanto outro país — se estabeleceram ali e tentaram preservar esse sistema”, explicou.
Hong Kong consolidou-se como um dos principais centros comerciais e de turismo de negócios da Ásia. A cidade é hoje um importante centro global de tecnologia, apelidada de “Vale do Silício da China”. Criou-se, desde então, essa antipatia de Hong Kong com relação ao continente asiático.
“A China não se vê apenas como um país, mas como uma civilização que engloba Taiwan e Hong Kong. A China vê Hong Kong como parte dela, mas eles acham que não são parte da China”, disse o especialista.
“A ideia de um país e dois sistemas, elaborada na lei básica de Hong Kong, em 1997, tem validade até 2047. É aí que se inserem os protestos da população e a reação obstinada de Pequim. A verdade é que Hong Kong perdeu a batalha contra a China. São 7,5 milhões de habitantes diante de 1,3 bilhão de chineses”, destacou.
Para Godoy, o Ocidente não sabe lidar com o poder da China. “A China é a grande potência geoeconômica do século 21. O país foi aos poucos sofisticando mais sua economia, investe em tecnologias de ponta, robótica, tecnologia 5G, e quer ter a grande hegemonia mundial até o fim deste século”, concluiu.
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