Um auxiliar administrativo da Vale que sobreviveu à tragédia que já deixou 99 mortos e 250 desaparecidos reconhece que está vivo por um milagre. A sala onde trabalhava, dentro de uma guarita, foi a única instalação que ficou intacta durante o rompimento da barragem de Brumadinho (MG).
“Eu creio que tem um espiritual muito forte em cima disso tudo, uma mensagem de Deus muito forte, não só para os brasileiros, não só os sobreviventes, mas para o mundo, uma mensagem para a raça humana, de que é tempo de colocarmos nossa vida verdadeiramente diante de Deus”, disse Cláudio Pereira do Santos, 34 anos, ao G1.
Cláudio recebia as notas fiscais de todos os carregamentos que chegavam na Mina do Feijão. Ele foi para o banheiro quando ouviu um barulho que parecia de “um caminhão com o pneu estourado”. Quando abriu a porta, se deparou com a destruição.
Ele conta que a correnteza de lama já estava a cerca de 5 metros de sua sala. “Eu cheguei a ver pessoas caindo, não conheci quem, pessoas caíram, parece que machucaram a perna, e a lama pegou”, relatou.
A sala onde Cláudio trabalhava foi a única a permanecer intacta durante o rompimento da barragem. (Foto: Reprodução/G1)
Sua preocupação foi com o irmão, que ele tinha visto entrar durante a manhã na mina. Mas não havia tempo de procurá-lo. “A sensação no momento em que eu pulei a janela e comecei a correr é que a lama ia me pegar, porque eu não olhava para trás, eu só sentia ela passando a minha esquerda”.
Mesmo com o risco de morte, Cláudio sentiu uma “paz espiritual” durante a fuga. “Quando eu corria ali, eu senti uma paz espiritual muito grande, como se eu fosse morrer, mas eu estava bem com Deus. Mas, o meu psicológico teve muito medo na hora de demorar para morrer. Se eu morresse rápido, não teria problema, foi o que pensei na hora, mas eu tive medo de ficar agonizando na lama por muito tempo, esse foi meu único medo”.
Direção de Deus
Cláudio já tinha morado em um sítio na parte alta do Córrego do Feijão e sentiu uma direção de Deus para ir até lá. “Veio na minha cabeça o sítio que a gente morou: ‘Vá para essa casa’. Foi onde eu entrei na mata à direita e levei umas quatro pessoas”, contou. Chegando lá, ele ligou para o irmão e descobriu que ele tinha saído da mina 20 minutos antes do rompimento.
Ele esteve entre 100 funcionários da Vale que conseguiram escapar e foram resgatados com vida na sexta-feira (25). “Foi um verdadeiro milagre eu estar vivo, primeiramente porque minha sala ficou intacta, segundo porque eu ia almoçar 12h30 e fui 11h porque me deu uma fome muito grande”.
Desde a sexta-feira do acidente até domingo, Cláudio, que é evangélico, contou que estava tão abalado que “não tinha forças para orar”. “A minha única oração era: ‘Obrigado, Senhor, por eu ter sobrevivido’”.
No final do domingo, ele se reuniu com a família para um momento de oração. “E quando a gente fez a oração, [uma parente] cantou um louvor para mim, aquele que fala ‘mil cairão ao teu lado, dez mil à tua direita, mas tu não serás atingido porque eu sou o teu Deus’”.
“É prova para ninguém ter dúvida de que Deus fez uma grande obra e falou: ‘Você vai ficar um pouco mais na Terra, você tem uma missão ainda’”, afirmou Cláudio. “A minha missão na Terra é cuidar dos meus pais. Eles vão primeiro, depois eu vou”.
Cláudio mora com os pais, Maria José dos Santos, 69 anos, e Valdemar Pereira dos Santos, 72. Eles moram no Parque da Cachoeira, um dos bairros que teve casas destruídas pela lama. “Eu fui atingido de duas formas, né, lá no serviço e aqui no bairro”.
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