O Tribunal Britânico de Apelações decidiu, na sexta-feira (17), que os médicos podem prescrever as drogas experimentais conhecidas como “bloqueadores da puberdade” para crianças que estão confusas sobre seu gênero, sem o consentimento dos pais.
A decisão revoga o posicionamento da Suprema Corte, que concluiu no ano passado, que era “altamente improvável” que uma criança de 13 anos ou menos tivesse autonomia para tomar tais drogas.
Em dezembro, a Suprema Corte disse que adolescentes menores de 16 anos, com disforia de gênero, só poderiam iniciar os tratamentos bloqueadores de hormônios caso entendessem as “consequências imediatas e de longo prazo”.
A decisão de sexta-feira, porém, disse que os médicos, e não os tribunais, decidirão se seus pacientes têm condições adequadas para fazer o tratamento, de acordo com o The Telegraph.
Sobre o apelo
O apelo foi interposto pela Tavistock Trust, a única clínica de identidade de gênero para jovens do Reino Unido. O presidente da Suprema Corte, Lord Burnett, não achou a decisão justa.
“O tribunal não estava em posição de generalizar as idades para receber o tratamento hormonal. Colocou pacientes, pais e médicos em uma posição muito difícil”, disse ele.
Por outro lado, a Liberty, que interveio no recurso, chamou-o de “um passo positivo para os direitos trans no Reino Unido e em todo o mundo”.
O caso original foi provocado, em parte, por Keira Bell, uma mulher destransicionada de 23 anos que passou por um tratamento experimental nas instalações do Trust quando era adolescente.
Bell teve seus seios amputados na época e, mais tarde, acabou se arrependendo de fazer o tratamento para a transição de gênero. Ela argumentou que era incapaz de compreender os riscos das intervenções médicas e que agora, provavelmente, não poderá ter filhos, já que as drogas ingeridas comprometeram sua fertilidade.
Keira Bell disse que vai apelar ao Supremo Tribunal Federal. (Foto: Facundo Arrizabalaga / EPA)
Caso de Keira Bell
Bell foi citada como “surpresa e decepcionada” com a decisão do Tribunal de Apelação, e disse que não se arrepende de ter entrado com o processo. “Isso iluminou os cantos escuros de um escândalo médico que está prejudicando crianças e me prejudicando”, disse ela que planeja apelar da decisão ao Supremo Tribunal Federal.
A decisão do Tribunal Superior, no ano passado, que agora foi anulada, exigia que os médicos obtivessem uma ordem de um juiz, antes que pudessem prescrever tais medicamentos para os jovens.
Estava em questão, no caso, o teste de “competência de Gillick”, que afirma que os direitos dos pais no Reino Unido, relativos ao tratamento médico, terminam quando a criança atinge compreensão e inteligência suficientes para entender o que está sendo proposto.
Kell discorda dessa autonomia sugerida e se diz muito arrependida, lamentando a decisão de ter feito a transição para “ser homem”. Ela diz que não houve investigação ou terapia suficiente antes de iniciar o tratamento.
Sobre os hormônios sintéticos
O uso de hormônios sintéticos para bloquear os processos de puberdade de crianças, com disforia de gênero, tem sido um tema muito debatido nos últimos anos.
Um estudo publicado na PLOS One, que acompanhou um grupo de jovens em tratamento, na clínica Tavistock, descobriu que o uso de bloqueadores da puberdade pode atrofiar o crescimento ósseo.
Bell acrescentou ainda, que é uma “fantasia preocupante que qualquer médico acredite numa criança de 10 anos”, disse ao se referir que a criança não tem condições de decidir e muito menos compreender as consequências que sofrerá.
“Uma criança passando por sofrimento de gênero precisa de tempo e apoio e não deve ser encaminhada para um tratamento médico da qual pode se arrepender mais tarde”, disse uma senhora que apoia Bell.
No mês de junho, a política sobre bloqueadores da puberdade foi alterada, removendo a alegação de que as drogas experimentais são “totalmente reversíveis”, pois na verdade, não se sabe quais serão os efeitos de curto e longo prazo sobre uma pessoa, tanto no aspecto físico quanto no mental.
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