Construindo o espírito de Natal

Construindo o espírito de Natal

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 10:04

Oito anos atrás, Ali Elhaij, 35, nascido no Líbano, converteu-se ao Cristianismo enquanto vivia nos Estados Unidos. Quando ele conheceu a cultura evangélica, ficou incomodado pelo profundo mal-entendido dos cristãos americanos acerca do Islamismo, bem como de impressão semelhante em relação à fé cristã no Oriente Médio. Tal sentimento lhe ocorreu 2006, quando aconteceu a guerra entre o Hezbollah e Israel, diante da enxurrada de notícias , tanto na mídia quanto nas igrejas, acerca do conflito. “Senti que precisava fazer algo. Precisava ser a cola entre o Ocidente e o Oriente”, diz. Após a guerra, Elhaij, que tem ascendência islâmica, visitou Israel e o West Bank. Ele se encontrou com os cristãos palestinos Salim Munayer, reitor acadêmico e graduado no seminário da Faculdade Bíblica de Belém (BBC, na sigla em inglês), e Bishara Awad, presidente da instituição.

Munayer e Awad são parte de um influente núcleo de evangélicos palestinos que está comprometido com a expansão e a reconciliação cristã através das incontáveis fronteiras políticas e religiosas na região. A iniciativa, intitulada Musalaha (palavra árabe para “reconciliação”), surgiu em 1990, a fim de criar um novo contexto para a interação entre os dois grupos, tão divididos por hostilidades que remontam aos tempos bíblicos. A idéia pode parecer romântica demais, mas tem dado certo – são promovidos encontros isolados, em que israelenses e palestinos passam uma semana ou mais viajando juntos por regiões desoladas. No início, o clima é de desconfiança mútua; mas dessas jornadas emergem relacionamentos novos e mais saudáveis. Nos últimos 20 anos, como o contínuo conflito tem restringido as já limitadas interações entre os dois povos, a Musalaha é uma maneira de fazer integrantes dos dois povos cruzarem fronteiras territoriais, ideológicas e religiosas.

A Musalaha recebe aclamação mundial por seus esforços. Depois de conversar com Munayer, Awad e outros líderes do ministério, Ali Elhaij sonhou em encontrar um modo de firmar uma parceria com eles. Um dia, ele perguntou à sua mulher, Jennifer, o que achava de incluir americanos nesse projeto. Depois de muita discussão, em 2007 o casal lançou o Projeto Natal em Belém, em sua mesa da sala de jantar em Weston, Flórida (EUA). A idéia era convidar americanos para viajar a Belém no começo de dezembro, a fim de ajudar os crentes locais a distribuir presentes de Natal a famílias carentes, independentemente de sua religião. O casal estabeleceu uma instituição sem fins lucrativos, começaram a estabelecer contatos pela internet com líderes interessados e a procurar colaboradores. Um dos que se apresentaram de imediato foi o executivo Chuck Wenger, da Igreja Prairie Ridge, em Ankeny, Iowa. Wenger freqüentemente visita Israel e agora serve à equipe de Elhaij. “Muitos judeus e muçulmanos acreditam em um princípio de vingança e a praticam”, diz o executivo. “Mas a Igreja pode lhes trazer uma estratégia de paz, amor e reconciliação”.

”Anjo”

Durante o Natal de 2007, uma pequena equipe de cristãos palestinos, israelenses e americanos entregou presentes para 200 crianças em Belém. Como era de se esperar, os mais necessitados estavam num orfanato e em escolas para portadores de necessidades especiais. A dura realidade vivida por essas crianças faz com que os presentes escolhidos passem longe da idéia de supérfluo – nada de jogos eletrônicos, mas sim roupas, brinquedos educativos e itens básicos para usar na escola e em casa. O voluntário israelense Alex Voitenko, que participou da distribuição de presentes ano passado, teve primeiramente de superar as suspeitas em relação a Elhaij por ele ser árabe. Mas, agora, Voitenko o descreve simplesmente como “um anjo”. “Esta guerra já acontece por muito tempo, e eu não vejo nenhuma solução sem Cristo”, pondera.

Elhaij garante que tem lutado para que esse tipo de desconfiança caia por terra. “Temos um corpo em Cristo que não é hostil para com o próximo, que não está preocupado com quem ganha o quê com relação a terra e recursos. Estamos todos trabalhando pela paz”, resume

Tal ponto de vista é bem diferente do que Elhaij tinha quando criança. Ele cresceu na zona oeste de Beirute, a capital libanesa, durante a década de 1980 – ou seja, no olho do furacão da sangrenta guerra civil que arruinou a outrora próspera nação do Oriente Médio. Elhaij se lembra de seus familiares e amigos que diziam: “Israel não é seu amigo – não diga a palavra ‘Israel’. Diga ‘Palestina’. Não tenha amizade com os israelenses”. A doutrinação levou anos, mas Elhaij agora acredita que o melhor meio de se lidar com os israelenses não é com pedras, mas numa mesa de café em Belém. “Quando vim pra Cristo, tive de entender que ele morreu por mim, para me reconciliar com Deus”, comenta. “Então, eu, como cristão e cidadão do seu Reino devo agir como pacificador.”

Awad, exatamente como Elhaij, experimentou uma profunda mudança em seu coração. O presidente da BBC era criança durante a Guerra de Independência de Israel, em 1948, quando os judeus enfrentaram e venceram uma liga formada por Líbano, Egito, Jordânia e Síria. Por anos, ele considerou os israelenses responsáveis pela morte de seu pai, grego-ortodoxo. Vítima de um atirador, ele morreu na frente de sua casa, em Jerusalém, à vista de Awad, à época com nove anos. Ele nunca se esqueceria do episódio.

Anos mais tarde, Awad sentia-se frustrado porque era incapaz de despertar a fé em seus estudantes que se denominavam cristãos. “Ninguém estava se convertendo ao Senhor. Então, uma noite, orei a Jesus, perguntando-lhe o que acontecia”, lembra. “Logo Deus mostrou-me o rancor e meu coração.” O educador então percebeu que aqueles jovens tinham o mesmo ódio que ele sentia, já que, de uma forma ou de outra, todos haviam sofrido com a guerra. “Orei ao Senhor pedindo que me perdoasse, e ele mudou completamente minha vida”, lembra. “No dia seguinte, fui à capela, como nos demais dias, mas havia algo diferente. Os alunos estavam se convertendo ao Senhor e pedindo um lugar para estudar teologia.”. O BBC surgiu justamente paras atender a necessidade.

Legitimidade

Elhaij, Awad e Munayer não encobrem injustiças passadas, mas suas experiências pessoais de reconciliação lhes dão uma visão do Reino de Deus que transcende velhas barreiras. Awad disse à Chstianity Today: “Jesus Cristo não morreu apenas pelos cristãos, mas por toda a humanidade, e isso inclui os muçulmanos”, destaca Awad. A cada ano, o Projeto Natal em Belém ganha legitimidade por seu modelo de ministério de reconciliação. Elhaij e sua equipe de ministério já embarcaram em direção ao Oriente Médio para mais uma campanha. O grupo, representando 13 igrejas da Flórida, Carolina do Sul e Iowa, juntamente com cristãos de Israel e Palestina, vão visitar a cidade onde Jesus nasceu para distribuir presentes para 500 crianças.

Abdulluah Awwad, diretor do Centro Albasma para Crianças com Necessidades Especiais, lembra a reação dos pequenos durante a visita do ano passado. “Eles não querem saber que deu os presentes. Simplesmente, ficam felizes. Essas crianças possuem os sentidos mais simples da vida”. Essa atitude junta todos os pedaços da visão original de Elhaij: crentes israelenses, palestinos e americanos, todos trabalhando para atender necessidades jamais supridas no Oriente Médio. Para ele, a percepção estereotipada a respeito do evangélico como um obtuso é tão infundada quanto alguns dos estereótipos dos cristãos acerca dos islâmicos. “Se você simplesmente atrair as pessoas, encontrará uma ampla opção de crenças e motivações. Tentamos encontrar pessoas que sejam abertas, prontas a aprender e queiram fazer a vontade de Deus”. Talvez seja precisamente esta a melhor definição para o tal espírito de Natal.

Por Jonathan Miles

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