Ao participar de uma mesa redonda sobre juventude e participação política, fizeram-me a seguinte pergunta: a juventude atual é alienada, descomprometida ou mal informada?
Responder de maneira simplista ou automática pode nos levar a um reducionismo. Precisamos ter em mente aquilo que é emblemático, de acordo com a orientação do antropólogo Gilberto Velho, pois o que caracteriza um grupo, aquilo que é seu emblema, nem sempre é compartilhado pelo conjunto. Velho argumenta que talvez nem 10% dos jovens dos anos 60 tenham participado do movimento estudantil, assim como nem todo adolescente urbano de hoje frequenta raves ou consome ecstasy. A socióloga Maria Isabel Mendes de Almeida, que publicou um estudo em que compara a época da contracultura dos anos 60 e a de hoje, diz que o roteiro do jovem de agora está bem distante de questionamentos políticos ou culturais. Não quer a ruptura, o pai dele já fez isso; quer a continuidade.
O jornalista e escritor Zuenir Ventura afirma que aquela geração, marcada pelo ano de 1968, queria tudo a que não tinha direito; a atual tem tudo que precisa, e por isso se apresenta cheia de ambiguidades e paradoxos. [...] Desapegada ideologicamente, essa turma bem de vida e de poder aquisitivo não se interessa pela política, não tem preocupações sociais e não protesta nem contesta, pelo menos não da forma como faziam os seus antepassados quarentões ou sessentões, anárquicos ou rebeldes.1 Em 2007, no jornal O Globo, em caderno especial (e esclarecedor) sobre os jovens nascidos a partir de 1983, a editora Nívia Carvalho explicou que essa é uma turma que vive conectada e gosta de dar publicidade aos seus atos em redes sociais, fotologs e álbuns na web. São jovens que elegem o bem-estar como valor maior e buscam dinheiro e fama.
Até que ponto a juventude cristã está sendo influenciada e conformada por essa mesma cosmovisão? Nossas igrejas e movimentos de juventude têm oferecido um modelo opcional ao que é emblemático nessa geração?
Ao tomar como marco para os próximos 10 anos da ABUB a tríade Uma só vida, uma só verdade, um só Senhor, queremos propor uma agenda de intenções; algo que queremos primeiramente viver, para depois compartilhar com nossa geração.
Temos a responsabilidade (e o privilégio!) de expressar, com nossas palavras e nossa vida, uma nova realidade que já se faz presente entre nós, por meio da vida e da obra de Jesus Cristo, o Filho de Deus encarnado. Conscientes de que nosso comprometimento com a singularidade, a supremacia e a suficiência de um sujeito mortalmente pregado à cruz e inteiramente despregado das prioridades usuais deste mundo é para o observador isento escândalo, insensatez e vergonha.2
Insensatez, para uma geração ávida pela prosperidade material, porque esse Jesus sustenta que a vida é sólida e a ganância é rala, e logo não faz sentido adquirirmos o mundo inteiro e ver a vida escorrer, sem consistência, na peneira final. Uma só vida tem algo a ensinar a esta geração?
Escândalo, para uma geração ávida pelo êxito e dependente da competição, porque esse Jesus, por meio da sua doutrina e da sua vida (e morte!), ensina que o sucesso se obtém no mais inequívoco fracasso e a grandeza na mais abjeta humilhação. Uma só verdade tem algo a apresentar a esta geração?
Vergonha, para uma geração ávida pela satisfação pessoal e pela permissividade, porque Jesus exige humilde submissão, e para participar desta nova realidade a pessoa tem de pagar o mico de reconhecer-se não melhor que ninguém. Um só Senhor tem algo a esperar desta geração?
Reinaldo Percinoto Jr., casado com Maria e pai de João Marcos e Daniel, é secretário-geral da ABUB.
Notas
1. Zuenir Ventura. 1968: o que fizemos de nós. São Paulo: Planeta do Brasil, 2008.
2. Paulo Brabo. A bacia das almas: confissões de um ex-dependente de igreja. São Paulo: Mundo Cristão, 2009.
Sua avaliação é importante para entregarmos a melhor notícia
O Guiame utiliza cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência acordo com a nossa Politica de privacidade e, ao continuar navegando você concorda com essas condições