Juventude evangélica: crenças, valores, atitudes e sonhos - Parte 1

Juventude evangélica: crenças, valores, atitudes e sonhos - Parte 1

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 10:06

Em 1968, o então jornal Ultimato, noticiando o aniversário de 17 anos da Mocidade Para Cristo, divulgou alguns dados da entrevista feita pela revista Manchete com estudantes universitários para reforçar "o já conhecido declínio da religião entre os jovens: três em cinco universitários reconhecem que são menos religiosos que seus pais, 40% declaram pertencer à religião apenas por tradição e 69% deles julgam que a humanidade se afasta cada vez mais das ideias de Cristo".

Uma recente reportagem da revista Época ("Jovens redescobrem a fé") cita dados da Fundação Getúlio Vargas para mostrar o atual fervor religioso dos jovens. Mais de 90% dos jovens brasileiros entre 20 e 24 anos declaram ter alguma crença. Em comparação com as outras faixas etárias pesquisadas, o número é o mais alto de todos. Dos jovens entre 20 e 24 anos, 14,16% se declararam evangélicos, 73,5% afirmaram que são católicos, 2,96% creem em outras religiões e 9,38% se definem como sem-religião.

Os dados obtidos pelo Instituto alemão Berelsmann Stifung, a partir de pesquisa feita em 21 países, coloca o jovem brasileiro como o terceiro mais religioso do mundo, perdendo para os nigerianos e guatemaltecos. Entre os jovens brasileiros, 95% se dizem religiosos e 65% afirmam que são profundamente religiosos.

Mas quem são, o que pensam e o que fazem esses jovens religiosos? E os jovens evangélicos? A pesquisa "Juventude Evangélica: crenças, valores, atitudes e sonhos",* feita pela Editora Ultimato em julho de 2010, responde parcialmente a essas perguntas. Os resultados não podem ser generalizados. O que se tem é o retrato parcial de uma das juventudes evangélicas: jovens direta ou indiretamente ligados à editora. A esse viés se juntam a metodologia usada para a pesquisa (internet) e - derivado de sua ligação com Ultimato - o fato de se concentrarem nas igrejas históricas (apenas 19% são de igrejas pentecostais). Para exemplificar os contrastes entre essa amostra e a juventude em geral: entre os que responderam a pesquisa, a quantidade de jovens que estão cursando ou que já concluíram algum curso superior é de mais de 80% - uma taxa inversa a da população brasileira total. (veja Passando a perna nas estatísticas ).

Com isso em mente, é possível obter muitas informações e conclusões interessantes e surpreendentes!

A pesquisa

O questionário foi preenchido por 1960 jovens entre 13 e 34 anos. Todos os estados foram representados, sendo que os de maior representatividade foram São Paulo (20%), Rio de Janeiro (19%) e Minas Gerais (13%).

Ao todo, 61% deles moram com os pais - quase a mesma porcentagem de jovens solteiros (68%). Dos motivos para a permanência na casa dos pais, 22% alegam não ter dinheiro para se sustentar sozinhos e 17% alegam ter um bom relacionamento com os pais e gostar da companhia deles. Entre os outros motivos alegados, alguns disseram não sair de casa porque ainda não casaram e alguns disseram que não podem sair porque apoiam a família financeira ou emocionalmente. Parece que eles estão cumprindo à risca a ordem: Deixará o homem a sua família...

Sobre ser jovem

As respostas às perguntas sobre a melhor e a pior coisa em ser jovem têm forte ênfase no futuro, como era de se esperar. A maioria respondeu que a melhor coisa em ser jovem é ter um futuro cheio de diversas possibilidades (65%). Quanto à pior coisa, 35% concordam que é a preocupação com o futuro e 32% acham que é a insegurança ou medo de tomar decisões. Apenas 2% acham que é não ter emprego e 3% que é o controle dos pais.

Entre as três atividades que mais ocupam os jovens nos fins de semana estão: ir à igreja (85%), navegar na internet (48%) e sair com os amigos (47%). As três atividades de um fim de semana ideal são: ir à igreja (91%), sair com os amigos (63%) e sair com o namorado (44%). As atividades de lazer estão mais restritas à televisão e à internet. A comparação entre o que é considerado ideal e o que eles de fato fizeram no último fim de semana revela um pouco de suas ambiguidades. Nem todas as atividades consideradas ideais estão entre as atividades realizadas. As maiores discrepâncias são: apenas 9% acham que navegar na internet é uma atividade ideal, mas quase 40% fizeram isso no fim de semana; apenas 4% acham que assistir televisão é uma atividade ideal, mas 28% disseram ter feito isso no fim semana; e 44% disseram que sair com o/a namorado/a é uma atividade ideal, mas apenas 19% disseram ter feito isso no fim de semana.

Sobre militâncias

A maior participação se dá em grupos e movimentos jovens vinculados a igrejas: cerca de 79% dos jovens participam, 14% não participam, mas gostariam de participar, e apenas 4% não gostariam de participar. A maior rejeição se dá com relação à participação em partidos políticos: 72% dos jovens não participam e não gostariam de participar. Os dados sobre a participação em movimentos ambientalistas, voluntários em ONGs e em trabalhos comunitários colocam em evidência o potencial mobilizador das organizações sociais para tantos jovens com predisposição de serem voluntários. Estranha-se a porcentagem de 29% para os que não participam e não desejam participar de movimentos ambientalistas, já que esta é uma opção tão em voga atualmente. A participação (32%) somada à predisposição para participar em movimentos estudantis (28%) é um dado surpreendentemente alto.

Segundo os jovens, os três principais problemas do Brasil são a distância de Deus (44%), a desigualdade social (13%) e a má administração pública (12%). Houve grande concentração em uma resposta religiosa, enquanto problemas mais estruturantes tiveram um índice relativamente baixo.

Sobre personalidades

Os entrevistados foram solicitados a citar o nome de uma pessoa, conhecida do público geral, brasileira ou não, que eles admirassem. As respostas citam principalmente personalidades ligadas à política, esporte, artes e literatura. Apenas quatro pessoas foram lembradas por mais de oitenta jovens (equivalente a 5% dos entrevistados), o que mostra grande diversidade de opiniões. O nome mais citado foi o de Marina Silva, admirada por 140 pessoas. Kaká foi citado por 119, Lula por 114 e Nelson Mandela por 81 pessoas. Jesus foi lembrado por 58 e Bono Vox por 45. Martin Luther King Jr. foi citado por quarenta e Angelina Jolie, por 22. Foram lembrados também os nomes de Cristovam Buarque (19), José Alencar (18), Silvio Santos (17), C. S. Lewis (17), Obama (17), Luciano Huck (13), Steve Jobs, Madre Tereza e Ayrton Senna (12), Bernardinho (11) e Lutero (10). Dez pessoas disseram admirar o próprio pai. Ao todo foram citados 240 nomes.

Entre as pessoas mais admiradas, conhecidas no meio evangélico, foram citados 340 nomes, e a dispersão de votos foi ainda maior, o que demonstra mais uma vez a falta de unanimidade. O mais citado é Silas Malafaia (105), seguido por Ana Paula Valadão (75), Kaká (56), Ariovaldo Ramos (53), Jesus (45), Ed René Kivitz (45) e Caio Fábio (43). Algumas pessoas dizem admirar Ricardo Gondim (38), C. S. Lewis (29), Ronaldo Lidório (27), Fernanda Brum (27), Russel Shedd (25), Marina Silva (25), Billy Graham (24) e John Piper (23). Dez pessoas disseram admirar o próprio pastor.

Sobre a vida

Entre os fatores considerados importantes para se melhorar de vida, os mais votados foram: ter a benção de Deus (96%), ter estudo (96%), trabalhar duro e ser dedicado (91%), falar bem (86%) e ter metas específicas (81%). Muitos concordam que é ser inteligente e talentoso (75%) e ter experiência (70%). Os resultados para as opções ter boa aparência (43%), ter amigos e parentes influentes (30%) ou sorte (17%) para melhorar de vida chamam atenção. Ainda que não sejam a maioria, esses dados apontam respostas pouco vinculadas à ética protestante. Seria uma influência do senso comum brasileiro?

Em relação às coisas importantes para a vida pessoal, ter fé (94%), ser honesto (89%), ser amigo e leal (87%) e ter uma boa relação familiar (86%) foram as mais votadas. Ser trabalhador e responsável (77%), viver numa sociedade mais justa (59%), ter um trabalho que traga realização (58%) e ser estudioso (58%) também são coisas importantes. Alguns concordam que é sentir-se útil para a sociedade (49%), aproveitar a vida (39%) e ter um diploma (32%). Poucos acham que é muito importante ter uma ideologia (18%), ter um corpo bonito e saudável (9%) e ter muito dinheiro (4%). Menos de 1% dos jovens acha que ser uma pessoa famosa é algo importante. Porém, para a resposta “ter um corpo bonito e saudável”, quando se soma o que é considerado ‘muito importante’ ao que é considerado ‘importante’, a análise é outra: a concordância sobe para 63%. Tal porcentagem confirma a exigência dos processos seletivos atuais e mostra que a aparência física tem sido considerada pelos jovens como um critério levado em conta nos processos de recrutamento de pessoal. A revista Superinteressante (janeiro de 2010) traz na reportagem “A arte de se vender” um desastroso conselho: “Largue os livros e vá agora mesmo para a academia de ginástica: pode ser bom para a sua carreira”. Para endossar, cita dados de pesquisas: cada ano de estudo aumenta em 15% o salário de um profissional, mas pessoas consideradas bonitas ganham, em média, 18% a mais do que as feias. E ainda: segundo um estudo da Universidade de Flórida, cada centímetro a mais de altura rende 600 reais de salário adicional por ano.

Sobre os medos

A maioria dos jovens (83%) diz se sentir feliz a maior parte do tempo. Cerca de 44% sofrem continuamente com a ansiedade, 22% sofrem continuamente com a instabilidade emocional, 5% sofrem com depressão e 5% com alguma fobia.

Apenas 27% dos jovens dizem não ter medo de nada. Entre os 69% que assumem ter medo de algo, o medo de fracassar, de não conseguir alcançar as metas estabelecidas, de decepcionar as pessoas, de não ser bem-sucedido, de fazer escolhas erradas e falhar na vida é percebido em cerca de 270 respostas. Medos relacionados com não ouvir a voz de Deus, não obedecer, sair dos caminhos de Deus, decepcionar Deus, aparecem em cerca de 180 respostas. Cerca de 115 pessoas mencionam o medo de perder alguém querido, cerca de 109 pessoas têm medo de ficar sozinhas, cerca de 92 pessoas têm medo da violência (incluindo estupro, assalto e sequestro) e cerca de 84 pessoas têm medos relacionados ao futuro. Cerca de 76 pessoas citam o medo de ficar velho, doente, pobre, inválido ou desempregado. O medo da morte aparece em cerca de 39 respostas. Medos relacionados com a família (não casar, ter um mau casamento, se divorciar, criar filhos etc.) aparecem em 32 respostas. Algumas pessoas citaram medos físicos: trinta pessoas dizem ter medo de insetos e 26 dizem ter medo de altura e lugares fechados. A pesquisa incluiu também uma pergunta sobre sonhos. (Veja Altos papos)

Sobre a conversão

Quanto ao perfil religioso dos pais, 61% dos jovens têm pai evangélico e 81% têm mãe evangélica. 19% têm pai católico e 11% têm mãe católica. Menos de 2% têm pais espíritas ou de religiões afrobrasileiras.

Sobre os fatores que ‘influenciaram muito’ a conversão dos jovens, os mais citados são uma formação familiar cristã (48%), a leitura da Bíblia (47%), conversas e convívio com amigos, conhecidos ou familiares (42%), nascer num lar evangélico (41%) e a pregação (40%). Alguns citam acampamentos (37%), ministérios voltados para a juventude (34%) e alguma expressão artística (25%). Poucos consideram como fator de influência para a sua conversão o contato com pessoa até então desconhecida (12%) e algum material evangelístico impresso ou programas de televisão ou rádio (9%).

Quando a estes são adicionados os percentuais dos jovens que responderam sobre os fatores que ‘influenciaram’ a sua conversão, a leitura da Bíblia sobe para 81%, a pregação para 71% e a conversa com amigos e familiares para 70%. Ministérios voltados para juventude, opção que estava em 7º lugar (com 34%), sobe para 4º lugar (com 60%).

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