Juventude evangélica: crenças, valores, atitudes e sonhos - Parte 2

Juventude evangélica: crenças, valores, atitudes e sonhos - Parte 2

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 10:05

Sobre a igreja Dos jovens entrevistados, 60% são provenientes de igrejas tradicionais e 19% de igrejas pentecostais. Cerca de 21% são de outras linhas. Caso não fossem de igrejas pentecostais nem tradicionais, os jovens poderiam descrever como é sua igreja. É nítida a tentativa de mesclar tradicional com pentecostal e pelo menos 52 expressões usadas denotam tal esforço. Eis alguns exemplos: Tradicional com toque pentecostal /Acredita nos dons e no estudo da palavra / Busca o equilíbrio entre a tradição e o avivamento / Doutrinariamente tradicional, renovada nas práticas religiosas / Evangélica, carismática e histórica / Meio a meio / Nem apegada a tradição nem pegando fogo / Neo-ortodoxa de pentecostalismo tradicional / Calvinistas que têm vários dons do Espírito Santo / Um pouco de tudo, vive missão integral. Dois jovens desabafaram: "Essa divisão é um pouco simplista, não?" e "Não suporto essas definições, não têm sentido".

Quando perguntados se já mudaram de denominação, cerca de 64% responderam que nunca mudaram, 23% que mudaram uma vez e 4% que mudaram três vezes ou mais. É um número considerável, ainda que, entre os que já mudaram, cerca de 21% o fizeram por questões geográficas (mudança de bairro, de cidade, de país) - o que nada tem a ver com a insatisfação com a igreja. Entre os outros motivos, 21% mudaram porque a denominação não correspondia às necessidades espirituais, cerca de 20% porque discordavam das questões doutrinárias, 17% por falta de coerência entre o que a igreja/denominação pregava e as atitudes das pessoas, 16% por influência de familiares e amigos, 10% porque a denominação não correspondia às expectativas sociais, emocionais ou relacionais, 7% porque não se sentiam acolhidas, e 4% porque não concordavam com a forma dos cultos (liturgia).

A despeito disso, os jovens parecem satisfeitos com a igreja na qual congregam: 73% acham que os pastores têm uma vida coerente, 73% acham que as pregações são ricas em conteúdo bíblico, 71% acham que as pregações são cristocêntricas, 65% acham que as pregações são relevantes e pertinentes ao contexto do mundo atual e da comunidade local, 64% acham que a linguagem é acessível aos jovens, 60% acham que as pregações são voltadas às necessidades espirituais e 51% acham que os visitantes são bem recebidos.

Metade (50%) acha que a igreja se envolve com missões transculturais, 48% acham que a igreja se envolve socialmente com a comunidade em que está inserida, 47% acham que a liturgia/ordem do culto é aberta/flexível à participação de todos, 46% acham que a igreja se preocupa com a saúde emocional dos participantes, 43% acham que a igreja se envolve com ações de misericórdia e na busca por justiça e 42% acham que os membros acolhem uns aos outros. As piores avaliações estão em sua maioria relacionadas à missão da igreja com os de fora. Um dado importante!

Os jovens foram perguntados sobre suas funções na igreja. Era possível marcar mais de uma opção e constatou-se que vários exercem funções simultâneas. Dos 1960 jovens que responderam à pesquisa, 873 estão envolvidos com a área de música (louvor, coral, conjunto ou instrumentista), cerca de 611 são líderes de grupo de jovens, adolescentes ou casais e cerca de 578 são professores na escola dominical. Cerca de 233 são líderes de célula ou grupo nos lares, cerca de 159 são líderes ou membros de conselho missionário e cerca de 148 são líderes ou membros de conselho de ação social. Chama atenção o alto número de jovens líderes e formadores de opinião.

Sobre crenças Constatou-se que 97% dos jovens acreditam no Deus trino (menos de 1% não acredita ou não soube responder), 91% acreditam em Jesus 100% Deus e 100% homem (2% não acreditam e 4% não souberam responder), 95% acreditam no nascimento virginal de Jesus (1% não acredita e 1% não soube responder), 97% acreditam na atuação do Espírito Santo (menos de 1% não acredita ou não soube responder), 96% acreditam na Bíblia como regra de fé e prática (1% não acredita e 1% não soube responder), 94% acreditam na existência do Diabo e dos demônios (2% não acreditam e 1% não soube responder), 96% acreditam em curas milagrosas (3% não sabem e 2% não acreditam). Até aqui, o grau de concordância supera os 90% e o nível de descrença é menor do que 3%. Constatou-se ainda que 90% acreditam na imortalidade da alma (4% não sabem e 3% não acreditam), 84% acreditam na ressurreição do corpo (6% não acreditam e 6% não sabem responder). A soma dos dados não é desprezível e confirma a tese de N. T. Wright de que a resposta cristã clássica à questão da mortalidade e do além é mais desconhecida do que rejeitada.

Constatou-se ainda que 84% acreditam na atualidade de todos os dons do Espírito Santo (7% não sabem e 6% não acreditam). Esses resultados revelam jovens com convicções firmes e conservadoras do ponto de vista da doutrina.

E eles têm também convicções bem ortodoxas com relação ao sincretismo religioso. Ao serem perguntados sobre a influência que outras crenças têm em sua vida (energias, aura e astral, duendes e gnomos, encarnação/vidas passadas, astrologia, espiritismo, contato com os mortos, parapsicologia e ocultismo), menos de 1% dos jovens responderam que tais crenças não têm influência em sua vida. A exceção é a astrologia, que parece influenciar 3% dos jovens.

Sobre disciplinas espirituais Os jovens foram solicitados a indicar a frequência com que praticam certas disciplinas espirituais. Surpreende o fato de que o número dos que fazem suas orações a sós, ‘sempre’ e ‘quase sempre’ (62%), seja menor do que o número dos que contribuem financeiramente, ‘sempre’ e ‘quase sempre’ (69%). O nível de leitura da Bíblia (‘sempre’: 28%, ‘quase sempre’: 34%) não está satisfatório, ainda mais quando 8% responderam não lê-la ‘nunca’ ou ‘quase nunca’. Parece que, pelo menos nesse caso, o vaticínio “como nossos pais” infelizmente não se cumpre... As disciplinas mais frequentes são: orar antes das refeições (81%) e fazer orações intercessórias (76%). A frequência à escola dominical pode ser considerada alta (62%) quando se ouve que muitas igrejas têm sofrido com a pequena frequência e outras têm até extinguindo tal programação. A evangelização de parentes e amigos é a disciplina devocional colocada entre as últimas (os que a praticam ‘sempre’ e ‘quase sempre’ somam 39%).

Sobre a conduta pessoal Foi pedido que os jovens marcassem o nível de concordância com algumas afirmativas relacionadas à sexualidade e, em seguida, respondessem sobre sua conduta pessoal. Entre os que responderam, 86% concordam que a conduta cristã não apoia o sexo antes do casamento, 76% dos jovens dizem estar pessoalmente comprometidos com essa conduta e 8% não se comprometem. Quanto ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, 94% concordam que a conduta cristã não apoia tal comportamento, 90% dizem estar comprometidos com a conduta e 3% não se comprometem. Quanto à afirmação de que a conduta cristã ensina o não envolvimento com a pornografia, 94% concordam. Com relação à conduta pessoal, a porcentagem cai mais do que nas outras questões: 75% dizem estar comprometidos e 10% não se comprometem. Com relação à prostituição e ao adultério, 96% concordam que a conduta cristã reprova essas práticas, 81% dizem estar comprometidos com essa conduta e 2% não se comprometem. Com relação ao casamento entre pessoas da mesma fé, 85% concordam que a conduta cristã recomenda isso (porcentagem surpreendentemente alta, praticamente igual à afirmativa de que a conduta cristã não aprova o sexo antes do casamento) e 77% disseram estar comprometidos com esta conduta.

Esses dados mostram uma juventude conservadora, com valores muito diferentes da juventude em geral. Basta citar a recente reportagem da revista Veja (‘A geração tolerância’), segundo a qual hoje 60% dos brasileiros declaram achar a homossexualidade natural. Também apontam para uma direção diferente de algumas pesquisas feitas entre evangélicos, como a que foi feita com jovens de 22 diferentes denominações, frequentadores regulares de igreja, a maioria solteira. De acordo com ela, 52% deles já haviam feito sexo. Destes, cerca da metade mantinha uma vida sexual ativa com um ou mais parceiros. A idade média com que perderam a virgindade era de 14 anos para os rapazes e 16 para as moças.

Sobre o aborto Quando perguntados sobre os motivos que justificam um aborto, 46% disseram que nada justifica - porcentagem bem mais alta do que a média nacional (segundo pesquisa do Ibope sobre o aborto, realizada em 2003, apenas 31% da população acha que ele deveria ser proibido em qualquer caso). Cerca de 40% acham que o aborto é justificável quando a vida da mãe corre perigo, 12% acham que é justificável quando o bebê pode nascer com defeito ou doença, 2% acham que a falta de condições financeiras justifica um aborto e 1% acha que qualquer motivo justifica um aborto. Cerca de 11% não quiseram ou não souberam responder. O aborto em caso de estupro, já previsto na lei brasileira como algo legal, não estava entre as opções.

Sobre bebidas e drogas Sobre o consumo de bebidas alcoólicas entre os jovens, 32% bebem esporadicamente, 27% apenas experimentaram, 19% nunca experimentaram, 14% não bebem mais e 5% bebem nos fins de semana. Sobre o cigarro, 69% nunca fumaram, 21% apenas experimentaram, 6% não fumam mais e menos de 1% fuma todos os dias, esporadicamente ou nos fins de semana.

Quanto ao uso de remédios de tarja preta sem prescrição médica, 90% dizem nunca ter experimentado, 3% apenas experimentaram, 3% não usam mais e menos de 1% usa esporadicamente ou todos os dias. Quanto ao uso de drogas ilícitas, 88% dos jovens nunca experimentaram, 6% apenas experimentaram, 3% não usam mais e menos de 1% usa esporadicamente ou nos fins de semana.

Sobre o futuro Igrejas, ministérios, organizações e denominações têm se voltado para a juventude evangélica. A necessidade de uma linguagem específica para este público, a renovação das lideranças, o potencial conflito entre gerações, o desejo de resguardar os jovens dos apelos mundanos são alguns dos motivos para tal olhar.

Como ficou evidente nos resultados da pesquisa, os jovens vêm de fato ocupando espaços importantes como promotores do reino de Deus. Muitos se sentem chamados e desejosos de servir a Deus em ministérios específicos, em missões e em suas profissões. Outros, talvez mais convencidos do que a geração anterior sobre as consequências do mandato cultural, sentem-se vocacionados a servir a Deus na arte, política, ciências sociais, música, literatura etc. Estes precisam de oração, “envio” e acompanhamento tanto quanto aqueles.

Alguns jovens naturalmente desejam introduzir novidades na Igreja: na forma de se relacionarem, nas noções de autoridade e hierarquia, na liturgia etc. Eles precisam ser escutados e, algumas vezes, confrontados.

Os jovens que estão titubeantes na fé devem ser, primordialmente, acolhidos. Eles precisam de espaço para questionar sem ser rechaçados, buscando assim respostas em campo seguro. Os que vivenciam conflitos por causa de sua conduta moral precisam de abertura para conversas francas. Os que buscam a igreja principalmente como espaço de apoio emocional precisam ser desafiados a uma fé mais profunda.

Em todos os casos, a Igreja precisa fazer questão de estar com os jovens. E os jovens precisam fazer questão de estar com a Igreja, com toda a sua diversidade. Jesus planejou uma Igreja intergeracional, em que velhos, adultos, jovens e crianças compartilhem entre si suas experiências únicas e adorem a Deus juntos com a humanidade e a grandeza próprias de cada fase da vida.

O tempo não para; os jovens, sempre os teremos conosco. Cada geração levantará questões à geração seguinte. A respeito dos jovens e adolescentes de hoje, poderíamos perguntar:

Serão profundos conhecedores da Palavra de Deus? Serão corajosos o suficiente para assumir uma fé exclusiva, num ambiente cada vez mais plural? Deixarão que as marcas de uma sociedade que se guia pelo mercado pautem as suas prioridades e suas agendas? Conseguirão não se deixar levar pela força de um evangelho adocicado, que faz bem apenas às emoções? Anunciarão o evangelho? Serão melhores promotores da justiça do reino? Estarão dispostos a sofrer por Cristo? Serão menos sectários?

Caminharão um pouco mais na direção da unidade da igreja? Permanecerão firmes na moral cristã? Não se divorciarão - ou se divorciarão menos do que seus pais? Criarão seus filhos e suas filhas no caminho do Senhor? O que farão com a história das gerações que os precederam?

Essas perguntas podem contribuir para a pauta a ser elaborada pelas igrejas e ministérios ‘com’ e ‘para’ os jovens. Abrir-se para os jovens é abrir-se para o novo. E mesmo que o novo pareça ameaçador, ele é fonte de rejuvenescimento para a Igreja.

Nota * A pesquisa foi enviada em 22 de julho de 2010 por e-mail a assinantes de Ultimato de até 34 anos e a outros assinantes, convidando-os a encaminharem aos parentes e amigos jovens da igreja em que congregam, e a líderes de ministérios jovens. Não era preciso se identificar e nenhuma questão era obrigatória. A pesquisa foi encerrada em 29 de julho de 2010.

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