Marcos Almeida fala sobre o 'Eu Sarau': "Estou me expondo neste processo de reinvenção"

O cantor e compositor que tem influenciado uma geração de jovens pensadores e músicos cristãos falou com exclusividade ao Guiame, comentando suas novas descobertas desde sua saída do Palavrantiga, a proposta do 'Eu Sarau' e a boa (e totalmente possível) relação entre cristianismo e cultura.

Fonte: Guiame, João NetoAtualizado: sexta-feira, 3 de julho de 2015 às 12:22
Marcos Almeida é cantor, compositor, instrumentista e tem sido grande influência para uma nova geração de músicos cristãos, que investem em canções que usam a riqueza da poesia para sobre o evangelho, salvação e relacionamento com Deus.
Marcos Almeida é cantor, compositor, instrumentista e tem sido grande influência para uma nova geração de músicos cristãos, que investem em canções que usam a riqueza da poesia para sobre o evangelho, salvação e relacionamento com Deus.

Ele está assumindo a própria voz e reencontrando sua originalidade. Desta forma Marcos Almeida tem definido a nova fase de sua carreira solo, na qual traz uma proposta de show simples e espontânea, com bastante música, poesia e interatividade com o público.

Durante uma de suas emocionantes e inspiradoras apresentações (em Fortaleza - CE), o cantor e compositor que tem influenciado uma geração de jovens pensadores e músicos cristãos falou com exclusividade ao Guiame, comentando suas novas descobertas desde sua saída do Palavrantiga, a proposta do 'Eu Sarau' e a boa (e totalmente possível) relação entre cristianismo e cultura.

Confira abaixo a entrevista na íntegra:

Portal Guiame: Nas fotos suas sobre esse novo projeto que podemos ver nas mídias sociais, você está rodeado de diversos instrumentos e 'sozinho' no palco. A proposta é de fato que você seja um 'homem-banda' ou este conceito ainda está em construção?

Marcos Almeida: Primeiro eu quero agradecer pela gentileza de eu poder compartilhar esse trabalho. O 'Eu Sarau' é este experimento. Eu estou me expondo publicamente neste processo de reinvenção. Vendo a trajetória de que eu sempre estive envolvido com o trabalho coletivo, dando a minha contribuição, como compositor, intérprete, pianista, guitarrista, agora eu trago isto para o palco dentro de um processo de releitura dessas mesmas canções que a turma já conhece e na tentativa de inventar uma estética nova, um caminho novo.

O show é muito experimental, ele acontece a cada dia de uma forma muito diferente, porque este é o 'risco' de tocar sozinho. Na verdade, você vai sentindo a plateia, a atmosfera do lugar e vai dando as intenções para cada canção. Então nunca se faz igual. Mesmo que seja uma repertório parecido, vai muito da relação com o público. A liberdade que eu tenho de fazer isto no palco é total. Eu posso terminar uma música antes ou começar de um outro lugar... eu não preciso olhar para ninguém e dizer: 'agora vamos mudar de música'. É um show muito espontâneo.

Por exemplo, o bumbo - que normalmente os bateristas tocam com o pé direito - eu consegui inverter... No show eu toco com o pé esquerdo, porque ficou mais fácil para eu executar o violão, apertar os pedais da guitarra e cantar. É uma 'dança' (risos)... a gente acaba mexendo com todos os instrumentos ali.

Guiame: Você falou sobre releituras de composições suas já conhecidas. Mas haveria também músicas novas para este repertório?

Marcos Almeida: No show de hoje, por exemplo, eu trago três inéditas, que nunca foram gravadas. Mas é até engraçado falar que são inéditas, porque se eu as toquei dois dias atrás em Manaus, já deve estar aí no Youtube. Quando eu digo que são inéditas, é porque não foram gravadas oficialmente. Tem uma que é muito recente e que se chama "Paisagem Sonora". Nela eu uso algumas camadas de loop e faço isso tudo ao vivo, na hora. Eu tento trazer estas novidades, não só na hora de rever o repertório, mas também trazendo canções novas.

Guiame: Quando você pensou nesta nova fase de sua carreira solo, como se deu a formação deste perfil / formato de apresentação?

Marcos Almeida: Este período sabático me ajudou muito a repensar. Ontem eu estive em Belém e revi alguns amigos que tinham me levado para lá pela primeira vez - isto há seis, sete anos - e eu perguntei para eles depois do show: 'Cara, fala a verdade... vocês são amigos e não precisam me enganar. O que vocês acharam do show?'. E eles me responderam assim: 'Velho, esse é show que a gente sempre quis assistir. Finalmente você conseguiu chegar. Está mais autêntico, mais dentro daquilo que você escreve no blog sobre esta terceira via. É um repertório espiritual demais para uma música secular e secular demais para uma música religiosa. Tem um viés poético ali que faz a amarração'. Eles ficaram muito felizes e eu me senti realizado em ver que deu certo.

Eu acho que esse tempo sabático serviu para isso... para eu me desfazer de alguns elementos que eu trazia para o palco e que eram acessórios pesados e não tinham muito a ver comigo. Eu falo até da questão da escolha de algumas músicas, também. Esse show agora é quase que 100% autoral. Nas únicas canções que não são 100% minhas, eu tenho participação nelas, que são as que eu fiz com a Lorena [Chaves]: "Cartão Postal" e "Dança". Eu creio que seja um repertório muito 'visceral' e talvez, por isso mesmo esteja dando certo.

Guiame: Tempos atrás, você afirmou em entrevista conosco, quando te questionamos sobre o ato de 'se libertar de rótulos' (quanto ao estilo, música gospel, secular), que isto não bastava ser apenas uma desconstrução, mas tinha que apontar também para uma 'reconstrução'. Que 'reconstruções' conceituais você tem encontrado nesta nova fase tua?

Marcos Almeida: Eu creio que o fato de você poder assumir a sua voz, de assumir - no meu caso - a vocação autoral como compositor foi o grande achado, porque às vezes você tenta se utilizar de um repertório de outra pessoa e, mesmo que você ache bonito, aquilo soa estranho para você, como compositor. O melhor jeito de você falar sobre um tema é você mesmo escrever sobre aquilo. E eu descobri isso sobre a turma que me acompanha: eles estão mais interessados em saber sobre este viés da minha voz a respeito de um tema do que só como um intérprete de uma outra canção. Então eu acho que este é o primeiro ponto: trazer para o palco esta versatilidade autoral. Isto é uma coisa interessante.

Este ano sabático é um ano em que você reflete sobre o que já fez, celebra as coisas que deram certo e busca, acima de tudo a sua originalidade. É um tipo de 'fechado para balanço'. Lógico que você continua trabalhando. Eu fiquei super envolvido na minha igreja local, continuei fazendo outros trabalhos - inclusive o 'Nossa Brasilidade' e etc. - mas é um momento para você fazer uma reflexão sobre o que é seu, de fato, qual é a sua voz, qual é a sua contribuição, quem é você nesse 'balaio de gato'.

A primeira escolha que eu fiz depois de todas estas reflexões foi investir em um repertório autoral e trazer o público para um relacionamento comigo em um ambiente mais adequado para isso, que para mim é o teatro. Desde a pré-estreia no Rio de Janeiro, passando agora por Manaus e Belém, eu vi que esta foi uma escolha acertada. O teatro é um local construído pela nossa cultura para ser esse espaço artístico. Então o artista pode ter sua plenitude ali, pode se expressar livremente e eu acho que este é um outro segredo. A gente está em um ambiente legal. Não adianta você só trazer a música e não criar este contexto. Acho que o contexto do teatro tem contribuído muito para isso.

Guiame: Então a escolha do Centro Cultural Dragão do Mar em Fortaleza, por exemplo não foi ocasional, aleatória para a realização do 'Eu Sarau'?

Marcos Almeida: Isso! Você já vem estimulado. Você passa por um mural, vê esta arquitetura, as pinturas isto tudo vai te abrindo a sensibilidade. Quando você chega para ouvir o artista, já está preparado, respirando cultura e aquilo faz a síntese, altos significados... é a viagem do teatro.

O interessante é que boa parte do meu público vem da Igreja e eu sempre faço esta pergunta na hora do bate-papo - que é um dos momentos do show: 'Quem aqui está vindo pela primeira vez ao teatro?'. Cara, muita gente levanta a mão. Muitos nunca tinham pisado em um teatro. Então eu me sinto realizado por isso também, de possibilitar este encontro, mostrar que isso aqui [teatro] não morde, que é um lugar para a gente ocupar, testemunhar da beleza, daquilo que a gente pensa, sobre o que é a cultura brasileira para a gente.

Eu creio que depois deste tempo sabático as coisas estão mais simples. O fato de eu estar sozinho palco simboliza muito isso: a simplicidade.

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