A longa estrada de terra, repleta de buracos e gado solto na pista é o caminho para chegar ao Colégio estadual Waldemiro Pita, que conquistou o primeiro lugar no estado do Rio de Janeiro e o segundo no Brasil, no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Longe dos smartphones e alheios aos encantos da tecnologia e das redes sociais, os alunos da escola localizada em Monte Verde, distrito da zona rural de Cambuci, no Noroeste Fluminense, desbancaram as mais tradicionais instituições de ensino público do estado, como os colégios Militar, Pedro II e o Cap-UFRJ.
A diretora Neliany Marinho, que atua há 28 anos na escola, explica que a nota 7,8 obtida na avaliação é consequência da interação entre professores e pais de estudantes. O terceiro lugar nacional no Ideb também foi de Cambuci, do Colégio estadual Oscar Batista, no distrito rural de São João do Paraíso.
“Eu falo para os alunos que a escola é a extensão da casa. Aqui todos têm que andar limpos, organizar o ambiente, respeitar os professores assim como os pais. O ambiente tem que ser tão agradável como o lar que eles vivem. Só assim o aluno se sente atraído pela escola e pelo estudo”, conta a diretora, que promove apresentações teatrais, excursões, exibições de filmes e rodas de leituras, para suprir a falta de cinema, teatro e centros culturais na cidade.
Único lugar com internet
O colégio também atrai os jovens por ser o único lugar do distrito onde há uma quadra poliesportiva e conexão de internet. Em Monte Verde, não há sinal de celular de nenhuma operadora. Para fazer uma ligação, é preciso se locomover até o distrito vizinho de Cruzeiro.
“Eu tenho celular para ouvir música e tirar foto, não trago para a escola porque sei que ele não vai pegar mesmo. É difícil conhecer alguém aqui que tenha computador em casa. Tenho Facebook, mas não costumo usar com frequência”, explica Bruno Bertolino Soriano, de 15 anos.
Banco, farmácia, hospital, correios e supermercado também não estão nas calçadas de Monte Verde, que só tem asfalto até a escola. Assim que termina o colégio, acaba também o paralelepípedo. Para ter acesso a pouco mais de infraestrutura, é preciso encarar 18 km de estrada íngreme de barro. No entanto, quando chove, mesmo fraco, o acesso é fechado por ser muito perigoso.
Dessa forma, o jeito para se chegar ao Centro de Cambuci, é enfrentando uma rota de 65 km, sendo a metade em chão de terra, passando pelos municípios de Itaocara e Aperibé. Quando oG1 esteve na cidade, na tarde de terça-feira (14), foi preciso pegar carona no carro da Defesa Civil - um dos poucos da cidade com tração nas quatro rodas - para chegar à escola.
Poucos alunos na faculdade
Apesar do alto rendimento e do interesse no estudo, poucos alunos do colégio Waldemiro Pita conseguem chegar ao ensino superior. Em Cambuci, não há faculdades, cursos de idiomas, aulas de informática, muito menos indústrias e empresas de grande porte. A atividade agrícola é o que move a economia da região.
A diretora da escola estima que cerca de 20% dos alunos sentam nas cadeiras das universidades. Os que chegam lá fazem questão de enviar as fotos da formatura à Neliany. Na parede da sala dela, há dezenas de postais de ex-alunos vestindo becas de professores, médicos, advogados e farmacêuticos.
“As opções mais próximas de faculdades ficam em Itaperuna e Campos dos Goytacazes, distantes mais de 50 km daqui. Fica complicado pagar o curso, transporte, moradia e alimentação. Infelizmente, já tiveram casos de alunos meus aprovados para instituições públicas que não puderam cursar por falta de dinheiro para pagar esses gastos”, conta a diretora.
Poupança para estudo dos filhos
Para que o filho tivesse um caminho diferente, a professora Carminda Camposo e o comerciante Nilson Pereira juntaram, por mais de 20 anos, entre 50% e 70% de seus salários para gastar na educação de seus herdeiros. O filho mais velho, Lucas, de 25 anos, fez faculdade de química, trabalhou numa empresa multinacional no setor de petróleo, e no próximo dia 19 embarca para um intercâmbio de oito meses na Irlanda, onde vai estudar inglês.
“Só para o meu filho morar no exterior, juntamos mais de R$ 40 mil. Meu marido estudou apenas até a 4ª série primária, ele sempre sonhou com os meninos cursando uma faculdade, falando inglês e trabalhando numa grande empresa. Estou orgulhosa por saber que nosso planejamento deu certo”, se emociona Carminda.
“Eu já tinha acabado a escola e estava trabalhando com os meus pais na lavoura de tomate, mas quando soube do curso de formação de professores, voltei a estudar porque vou conseguir mudar de vida. Já estou focada em concursos públicos para a área e recebo muito apoio dos meus pais, que infelizmente não tiveram muitas chances de estudo”, comenta a jovem.
A diretora ressalta que a boa colocação do colégio no exame do Ideb e o aumento de ex-alunos ingressando no ensino superior estimularam os pais a voltar aos bancos escolares. “Tenho alunos de 70 anos que voltaram a estudar. São muitos os casos de pais de estudantes, que também são alunos do curso de supletivo. Aqui em Monte Verde, a escola é o principal ponto de encontro, união e troca de informações”, explica Neliany.
Rio tem 5a pior escola do país
De acordo com a pesquisa do Ideb, a 5ª pior colocação no ranking nacional também é ocupada por uma escola do Rio. De 30.842 escolas de ensino fundamental do país, o Colégio estadual Lauro Sodré ficou com a posição 30.838.
Para o diretor da Região Metropolitana 3, que compreende a escola que ficou em último lugar no ranking estadual, a pouca atenção que a rede pública recebeu ao longo dos últimos anos justifica o resultado. Segundo ele, há pouco mais de um ano que começaram a ser adotadas intervenções sérias, visando a melhoria do desempenho das unidades escolares.
“Começamos a fazer alguma coisa de janeiro de 2011 para cá. A despolitização da educação foi primeira coisa. Atualmente, o diretor que não cumpre com o que lhe é solicitado é desligado. Agora existe processo seletivo para diretor adjunto e diretor geral”, afirmou Alan Marques, o diretor da Região Metropolitana 3.
Ele disse ainda que convocará a diretora do Colégio Lauro Sodré para fazer uma profunda análise dos dados e identificar em quais aspectos a escola precisa de investimentos. “Preciso saber quais problemas ela enfrenta lá. Teremos que analisar a escola por dentro. Ela e outras escolas em situação similar receberão atenção especial para mudar esse cenário”, garante Marques.
Desde 2005, a Lauro Sodré recebe notas cada vez mais baixas. Há sete anos, a unidade teve média 2,1. Em 2007, obteve 1,4 ponto. Dois anos seguintes, em 2009, teve média 1,0 e apenas 0,8 em 2011. De acordo com dados da regional, que compreende 60 bairros da Região Metropolitana do Rio - entre eles Ilha Governador, Maré, Alemão, Madureira Rocha Miranda e Higienópolis - o compartilhamento das escolas existe em aproximadamente 70% das 112 unidades da região, mas a meta do governo é mudar o panorama nos próximos anos.
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