Brasil domina mercado, mas vê jogadores virarem coadjuvantes no futebol europeu

Brasil domina mercado, mas vê jogadores virarem coadjuvantes no futebol europeu

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 9:10

Francisco De Laurentiis

Craques do passado apontam zagueiro Thiago Silva como grande destaque, mas dizem que jovens como Lucas e Oscar ainda vão demorar para se adaptar ao futebol estrangeiro

"Jogadores úteis, mas que não fazem a diferença\". Esse é o perfil traçado pela imprensa europeia para os brasileiros atualmente em atividade no futebol do Velho Continente. Muito diferente do que se viu até 2007, quando o meia Kaká arrebentou com o Milan e foi eleito o melhor jogador do mundo pela Fifa - o último brasileiro a conseguir o feito. Desde então, a magia verde-e-amarela, que conquistou a Europa durante décadas, foi aos poucos sumindo, com meias e atacantes decisivos e protagonistas dando lugar a laterais e volantes que são \"coadjuvantes úteis, mas que não fazem a diferença\". Prova disso é a ausência de brasileiros nas equipes que foram campeãs dos principais torneios nacionais na última temporada, como Manchester City, Borussia Dortmund e Juventus.

A análise contrasta com o que foi visto na última janela de transferências, quando quatro jogadores do Brasil estiveram entre as 10 negociações mais caras do futebol europeu: Hulk, Thiago Silva, Lucas e Oscar. Deles, porém, apenas o atacante é apontado pela mídia internacional como principal atleta de sua equipe, já que o zagueiro foi eclipsado pelo sueco Ibrahimovic, enquanto o ex-meia do Internacional no momento é reserva do Chelsea - Lucas só deixará o São Paulo no fim do ano. Tudo isso após movimentar o mercado com 169,8 milhões de euros (R$ 433,8 milhões). Confira:

1- Hulk (do Porto-POR para o Zenit-RUS) - 55 milhões de euros / R$ 140,8 milhões

 2- Thiago Silva (do Milan-ITA para o PSG-FRA) - 42 milhões de euros / R$ 107,5 milhões

 3- Hazard (do Lille-FRA para o Chelsea-ING) - 40 milhões de euros / R$ 102,4 milhões

4- Lucas (do São Paulo para o PSG-FRA) - 40 milhões de euros / R$ 102,4 milhões
5- Javi Martínez (do Athletic-ESP para o Bayern-ALE) - 40 milhões de euros / 102,4 milhões
6- Witsel (do Benfica-POR para o Zenit-RUS) - 40 milhões de euros / R$ 102,4 milhões
7- Oscar (do Internacional para o Chelsea-ING) - 32 milhões de euros / R$ 81,9 milhões
8- Van Persie (do Arsenal-ING para o Man. United-ING) - 31 milhões de euros / R$ 79,4 milhões
9- Modric (do Tottenham-ING para o Real Madrid-ESP) - 30 milhões de euros / R$ 76,8 milhões
10- Lavezzi (do Napoli-ITA para o PSG-FRA) - 26 milhões de euros / R$ 66,5 milhões

A falta de protagonismo brasileiro também é vista nas 32 equipes que vão disputar a Liga dos Campeões 2012/13. De todas, apenas três têm atletas verde-e-amarelos apontados como principal jogador: o Zenit, da Rússia, com Hulk, o Braga, de Portugal, com Márcio Mossoró, e o Shakhtar, da Ucrânia, com Willian. Enquanto isso, jogadores de seleção brasileira, como os laterais Marcelo (Real Madrid) e Daniel Alves (Barcelona) e os volantes Ramires (Chelsea) e Luiz Gustavo (Bayern de Munique), suam a camisa para que astros europeus, como Cristiano Ronaldo, Messi e Robben, possam brilhar. Robinho e Alexandre Pato, outrora apontados como craques do Milan, vivem entre departamento médico e banco de reservas, enquanto atacantes de qualidade bastante questionável, como Pazzini, fazem a festa como titulares.

Para dois brasileiros que brilharam no futebol europeu, os \"brazucas\" passam por momento de transição no Velho Continente, e ainda devem demorar um pouco para voltar ao protagonismo por lá. \"É apenas uma fase. Os brasileiros ainda são fortes, assim como os argentinos. É dificil chegar e de cara se adaptar ao futebol europeu, às vezes alguns jogadores demoram mais\", opina o ex-atacante Careca, ídolo de Guarani, São Paulo e também do Napoli, da Itália, clube pelo qual cansou de fazer gols e decidir títulos (entre os quais uma Copa da Uefa e um Campeonato Italiano) no final dos anos 80 e começo dos anos 90, quando tinha como parceiro o argentino Maradona.

Opinião parecida tem o também ex-atacante Élber, artilheiro e campeão alemão, europeu e mundial pelo Bayern de Munique nos anos 90. Para o matador, os atletas brasileiros estão perdendo seu \"diferencial\" por estarem indo muito novos para o estrangeiro: \"Eles estão saindo muito jovens. Com isso, estão sendo forçados a se adaptar rapidamente ao estilo europeu e perdendo a magia do jogo sul-americano, que sempre foi nosso diferencial\", aponta o ex-jogador, que também aposta em uma volta gradual dos brasileiros ao protagonismo. \"Estamos em época de transição, é só ver pela seleção brasileira. Logo mais vão começar a aparecer novos destaques individuais, isso é certeza. Mas é certo também que já há um tempo não temos um jogador que faça frente a Messi e Cristiano Ronaldo\", admite.

O segredo do sucesso
Para Careca, seu sucesso e protagonistmo na Itália muito se deveu ao fato de ter saído do Brasil já com muita \"bagagem\": dois títulos paulistas, três brasileiros (dois da Série A e um da Série B) e uma artilharia do Paulistão (1985) e outra do Brasileirão (1986), além de duas Bolas de Prata e uma Bola de Ouro da revista \"Placar\" e convocações para a seleção brasileira. Segundo o craque, os times europeus tinham que escolher muito bem seus reforços estrangeiros, já que poderiam ter apenas três atletas de fora na equipe (ainda não existia a regra para jogadores da União Europeia não contarem como estrangeiros).

"Os jogadores contratados naquele tempo tinham que ter muita personalidade e caráter, serem realmente diferenciados. Hoje, os caras vão muito jovens. A gente tinha mais experiências, mais passagens importantes pela seleção. É só ver como a minha geração, com caras como Müller, Júnior, Silas, Casagrande, Branco, Falcão, Cerezo e Taffarel, passou com sucesso pelo futebol italiano, que era muito mais duro do que é hoje\", afirma o ex-atleta e agora dirigente - ele é fundador do Campinas Futebol Clube, que disputa a Série A3 do Paulistão.

Já Élber viveu situação bastante diferente da de Careca. Após impressionar dirigentes do Milan em sua passagem pela seleção brasileira sub 20, foi contratado pelo time italiano com apenas 19 anos. Sem jogar na Itália, foi emprestado ao Grasshopper, da Suíça, onde rapidamente começou a mostrar seu faro de gol. Depois disso, passou com muito sucesso por Stuttgart e Bayern de Munique na Alemanha, além de Lyon, da França. Segundo o matador, sua lição mais importante para brilhar no futebol europeu foi aprendida ainda na seleção de base.

"Eu rodei por Suíça, Alemanha e França e sempre me sobressaí pela capacidade indivudal que eu tinha. Procurei nunca me esquecer das coisas que o Ernesto Paulo, meu treinador na seleção brasileira de juniores, dizia: \'Você não pode perder nunca a criatividade que você tem, porque senão vai virar só mais um na Europa\'\", diz Élber, que atualmente mora em Londrina, sua cidade natal, e trabalha com nutrição animal e produção de carne, além de comentar jogos da Liga dos Campeões para a televisão da Alemanha. No Brasil, ele atuou apenas pelo Londrina, equipe que o revelou, e Cruzeiro, time pelo qual conquistou o Mineiro de 2006.

Thiago Silva: o protagonista
Atacantes de renome, Careca e Élber enfrentaram muitos grandes zagueiros no futebol europeu. Com conhecimento de causa, ambos apontam o defensor Thiago Silva, contratado por R$ 107,5 milhões pelo PSG do Milan, como o brasileiro que pode ter maior destaque na atual temporada do futebol europeu. Segundo Careca, inclusive, o atleta da seleção brasileira é até melhor do que um lendário zagueiro que ele enfrentou várias vezes no Campeonato Italiano.

"O Thiago Silva já era um jogador de referência no Milan, e continuará sendo no Paris Saint-Germain. No tempo em que passou pela Itália, não fez os torcedores esquecerem nomes como (Franco) Baresi, até porque trata-se de uma lenda, mas, na minha opinião, o Thiago é até superior. Agora, ele foi jogar num futebol até mais tranquilo, e vai continuar fazendo a diferença\", comenta Careca, ressaltando que o brasileiro seria até melhor do que o famoso líbero que atuou 20 anos pelo Milan.

Élber também aposta em temporada de sucesso para o zagueiro de 27 anos, revelado pelo pequeno RS Futebol (atual Pedrabranca) e que fez fama atuando pelo Fluminense entre 2006 e 2008: \"Acho que, nesta temporada, o Thiago Silva é o brasileiro que mais pode se sobressair entre todos os que atuam na Europa. É um jogador que estava muito bem na Itália, tanto que o PSG pagou esse valor absurdo por ele, e, pra mim, acertou em cheio em pagar e contratar. Se o time (PSG) chegar atá as fases finais da Liga dos Campeões, com certeza o Thiago é um dos jogador que vai estar nas cabeças para concorrer a prêmios por desempenho individual\", opina.

Vida difícil para Lucas e Oscar
Se Thiago Silva vai \"sobrar\" nesta temporada, os habilidosos Oscar e Lucas terão trabalho para se firmar no futebol europeu. Tanto Careca quando Oscar concordam que os jovens ainda levarão tempo para se adaptarem e se tornarem protagonistas de seus times, o Chelsea, da Inglaterra, e o Paris Saint-Germain, da França. Enquanto o meia-atacante do São Paulo só irá para a Europa no fim do ano, porém, o ex-atleta do Internacional já vem fazendo suas primeiras participações na Premier League. Seu corpo franzino, no entanto, ainda é fraco para aguentar os trancos dos defensores na Terra da Rainha.

"O futebol inglês é muito complicado para o estilo de jogo do Oscar, que é mais cadenciado. Ele vai sofrer bastante neste início, principalmente porque deve ficar mais no banco. Mas ele é um guerreiro, e, se tiver foco e paciência, vai se firmar por lá\", pondera Careca. \"O Oscar é muito novo e tem um potencial enorme, mas está agora num campeonato totalmente novo pra ele, de muita pegada e correira. Acho que ele pode ter até mais destaque atuando pela Champions do que no Campeonato Inglês. Tem que se comportar bem, entrar no padrão do time e aos poucos ir fazendo a diferença individual\", completa Élber.

Quanto a Lucas, Careca vê enorme talento no jogador, mas dá conselhos para que seu estilo de jogo não seja mal visto nos gramados da Europa: \"O Lucas é um jogador de muita explosão, corre um absurdo, e isso é muito bom. Mas ele ainda precisa corrigir o velho problema de às vezes abaixar a cabeça e querer driblar todo mundo para fazer um golaço. Em muitas ocasiões ele só precisa dar um tapa na bola para o companheiro. Agora, na França, ele terá muitos jogadores de qualidade no time, que com certeza vão ajudá-lo a crescer\", diz.

Já Élber afirma que o jovem atleta terá problemas extras por ficar no São Paulo até o fim de 2012 e só se apresentar ao Paris Saint-Germain após o fim do Campeonato Brasileiro: \"O Lucas só vai para a França em dezembro. Na minha visão, ele sai perdendo, porque vai chegar no inverno europeu, com o time já montado e ele tendo que disputar posição com caras que estarão numa condição física bem melhor que a dele. Se ele já tivesse ido pro PSG, ia ter feito pré-temporada e ganhado mais tempo para adaptar. Agora, ele vai chegar jogando a parte final dos campeonatos, então ser titular vai ser bem difícil nesse começo. Pode ser que o técnico se impressione e o escale de cara, mas acho que será bem difícil\", comenta.

Neymar: o \"salvador\" deixará a pátria?
Quando perguntados sobre quem pode devolver o protagonismo aos brasileiros no futebol europeu, Careca e Élber não tem dúvidas: Neymar. O jovem atacante tem contrato com o Santos até 2014, e, apesar do assédio constante das mais diversas potências do Velho Continente, nunca demonstrou vontade de deixar a Vila Belmiro. Para o ex-centroavante do Napoli, Neymar aprenderia muito jogando na Europa, mas deveria evitar transferência para Inglaterra ou Itália.

"Ninguém sabe se o Neymar vai para a Europa um dia, mas, se for, acho legal ele ir para o futebol espanhol. Futebol inglês é muito complicado para o estilo de jogo dele, assim como o italiano. Mas no futebol europeu ele terá contato com escolas importantes para crescer na sua profissão. Claro que é legal essa história dele ter ficado no Brasil, é algo meio inédito, mas penso que seria ótimo para ele sair. Poderia aprender e evoluir muito jogando na Europa\", opina Careca.

Élber também aposta suas fichas no jovem santista. Segundo o ex-atacante do Bayern de Munique, Neymar é um jogador raro, que aparece \"a cada 20 anos\". Ainda concordando com Careca, Élber vê futuro brilhante para o camisa 11 caso ele opte em atuar ao lado de Cristiano Ronaldo e Messi no Campeonato Espanhol no futuro. No entanto, o matador diz que, pelo lado financeiro, o astro do Santos não tem motivo para deixar o Brasil.

"Na situação financeira em que ele está, poderia ficar no Brasil para sempre, sem problema nenhum. Está sendo muito bem pago, não porque as meninas acham bonito, mas pelo que ele faz dentro de campo. Na América do Sul, ele deita e rola. Mas, para competir com Messi, Cristiano Ronaldo e os outros grandes jogadores europeus, tem que estar lá. Ser destaque do Brasileirão, Libertadores e Copa América não tem o mesmo peso que disputar as competições de lá. Mas tem que ir para o Campeonato Espanho, que é o que \'encaixa\' perfeito pra ele. Mas com a qualidade que ele tem, pode jogar até no Russo que vai arrebentar\", afirma Élber, que assegura que Neymar não iria repetir o fracasso de Robinho no futebol do Velho Continente.

"Para crescer no jogo, o Neymar tem que ir pra lá e procurar aprender. E tenho certeza que com ele não será igual foi com o Robinho, que, quando saiu, era o grande destaque da América do Sul, mas acabou nunca se firmando, mesmo tendo melhorado um pouco agora no Milan. O Neymar já tem certa bagagem, é o principal jogador da seleção, então imagino que não vai acontecer isso (fracassar) com ele. Se ele fizer 60% do que ele faz na América do Sul, vai ser uma das grandes figuras do futebol europeu\", afirma Élber, apostando no santista para tornar o Brasil novamente protagonista na Europa.

"Do tipo do Neymar, só nasce um a cada 20 nos. Ele é com certeza um cara que pode voltar a fazer os brasileiros serem protagonistas na Europa. Pode ver como a mídia internacional já fala dele. E olha que é um jogador que ainda nem atingiu seu ápice físico e técnico\", encerra. 

Veja a lista dos brasileiros que estarão na Liga dos Campeões da Europa 2012/13:

GRUPO A

Porto (Portugal)
Hélton (G), Fabiano (G), Danilo (LD), A. Sandro (LE), Maicon (Z), Fernando (V), Kelvin (M) e Kléber (A)

Dínamo de Kiev (Ucrânia)
Leandro Almeida (Z), Betão (Z), Danilo Silva (Z), Dudu (M) e Raffael (M)

Paris Saint-Germain (França)
Thiago Silva (Z), Alex (Z), Maxwell (LE) e Nenê (M)

Dínamo Zagreb (Croácia)
Sammir (M)

GRUPO B

Arsenal (Inglaterra)
André Santos (LE)

Olympiacos (Grécia)
Diogo (A)

Montpellier (França)
Hilton (Z)

GRUPO C

Milan (Itália)
Gabriel (G), Alexandre Pato (A) e Robinho (A)

Zenit (Rússia)
Hulk (A)

Anderlecht (Bélgica)
Reynaldo (M) e Kanu (A)

Málaga (Espanha)
Weligton (Z) e Júlio Baptista (M)

GRUPO D

Real Madrid (Espanha)
Kaká (M), Pepe (Z), Marcelo (LE)

Manchester City (Inglaterra)
Maicon (LD)

Borussia Dortmund (Alemanha)
Felipe Santana (Z), Leonardo Bittencourt (M)

GRUPO E

Chelsea (Inglaterra)
David Luiz (Z), Ramires (M), Oscar (M) e Lucas Piazon (A)

Shakthar Donetsk (Ucrânia)
Willian (M), Douglas Costa (M), Alan Patrick (M), Ilsinho (M), Fernandinho (M), Alex Teixeira (M), Dentinho (A) e Luiz Adriano (A)

Juventus (Itália)
Lúcio (Z)

GRUPO F

Bayern de Munique (Alemanha)
Dante (Z), Rafinha (LE), Luiz Gustavo (V)

Valencia (Espanha)
Diego Alves (G), Jonas (A)

Lille (França)
Túlio de Mello (A)

BATE Borisov (Belarus)
Renan Bressan (M)

GRUPO G

Barcelona (Espanha)
Daniel Alves (LD), Adriano (LE)

Benfica (Portugal)
Artur (G), Luisão (Z), Lima (A), Jardel (Z), Bruno César (M)

Spartak Moscou (Rússia)
Rafael Carioca (V), Rômulo (V), Ari (A), Welliton (A)

GRUPO H

Manchester United (Inglaterra)
Rafael (LD) e Anderson (M)

Braga (Portugal)
Douglão (Z), Samuel (Z), Paulo Vinicius (Z), Baiano (LD), Ismaily (LE), Márcio Mossoró (M), Leandro Salino (M), Carlão (A), Manoel (A), Paulo César (A) e Michel (A)

Galatasaray (Turquia)
Cris (Z) e Felipe Melo (V)

Cluj (Romênia)
Rafael Bastos (M), Luis Alberto (M) e Ronny (A)

*colaborou Mário André Monteiro, iG São Paulo

 

 

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