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Localizador de crianças por GPS made in Portugal preocupa peritos

Localizador de crianças por GPS made in Portugal preocupa peritos

Fonte: Atualizado: sábado, 29 de março de 2014 às 3:30

Ainda não é um campeão de vendas, mas está a suscitar a curiosidade de muitos pais: o ''Child Locator'' é o primeiro dispositivo de localização de crianças 100%  feito com tecnologia portuguesa. Está no mercado desde novembro e, até agora, vendeu perto de 300 unidades.

Em Portugal, a discussão sobre os efeitos deste controle parental ''full time'' junto dos mais novos está ainda a começar. Porém, Alexandra Simões, da Linha SOS Criança Desaparecida, avisa desde já que as vantagens oferecidas por estes ''gadgets'' eletrônicos não podem levar os pais a se descuidarem da vigilância sobre os menores. Outro dos problemas, apontado por Antonio Osório, do Instituto de Estudos da Criança, ''é o sentimento de culpa que estas tecnologias podem criar nos pais''.

Antonio Baptista, de 33 anos e pai de uma criança de sete, garante que quando comprou o dispositivo não foi para casa pensando que iria proteger a filha de todos os perigos do mundo. “O que aconteceu foi que eu e a minha mulher passamos a andar com mais paz de espírito”, desdramatizou.

Este economista diz-se consciente de que a filha não vai aceitar andar com o Child Locator quando chegar à adolescência. Mas, por enquanto, ''até acha graça àquilo''. E os pais aproveitam para relaxar. ''Recebemos SMS no celular confirmando o percurso normal da nossa filha, desde a escola até casa dos avós. Portanto, usamos isto numa ótica informativa que também serve, por exemplo, para saber, quando é a empregada a levá-la à escola, se estão a sair de casa a horas. Não penso que a autonomia dela esteja a ser posta em causa”.

Paz de espírito ou falsa sensação de segurança?

David Pinheiro, gestor deste produto da Inosat, explica que o dispositivo de localização GPS tem um localizador muito semelhante ao da Via Verde. Este deve ser colocado na mochila ou num bolso da criança, permitindo aos pais saber, a qualquer momento (e a partir de um celular, PDA ou computador), onde se encontram os filhos, ''sem terem que estar a telefonar-lhes a todo o momento''. ''O objetivo é mesmo proporcionar paz de espírito aos pais'', sublinha, ressalvando que ''a Inosat nunca 'vendeu' a ideia de que o Child Locator é capaz de ajudar a prevenir um rapto''. Apesar disso, reconhece que ''há pais que o compram com esse intuito''. 

Em países como Inglaterra as preocupações relativamente à segurança dos menores seguem muito mais avançadas. Em outubro de 2007, o jornal The Guardian destacava a invenção do primeiro casaco para crianças com tecnologia GPS. A fabricante, uma empresa especializada na fabricação de vestuário para forças policiais, tinha acabado de descobrir no receio dos pais relativamente à segurança dos filhos um nicho de mercado a explorar. O casaco (preto, de corte moderno e com um bolso para o iPod) custava 250 libras, mais 10 libras de mensalidade pelo uso da tecnologia GPS.

Ainda na Inglaterra, o professor Kevin Warwick, da Reading University, levou mais longe a discussão ao criar um ''microchip'' suscetível de ser implantado no corpo de uma criança ou adolescente. E não faltaram pais interessados naquela resposta ''hi-tech'' aos seus piores medos mas, segundo a BBC, o investigador foi travado pelos protestos de várias associações protetoras das crianças. ''Um chip destes não ia salvar vidas ou afastar os perigos. Pelo contrário, ia dar uma falsa sensação de segurança. A única vantagem é que a polícia poderia ser capaz de descobrir o corpo mais depressa'', reagiu Michele Elliott, responsável pela Kidscape.

Há outros problemas que surgem à boleia destas tecnologias. ''Como é que, perante um problema que surja, um pai lida com a culpa de saber que ignorou a tecnologia que tinha à sua disposição para evitar esse mesmo problema?'', questiona Antonio Osório, professor auxiliar no Instituto de Estudos da Criança.

A coordenadora da Linha SOS Criança Desaparecida, Alexandra Simões, concorda que dispositivos como o Child Locator ''podem dar uma falsa sensação de segurança aos pais e prejudicar o processo de transição dos menores à idade adulta''. Sem diabolizar esta tecnologia, Simões diz que tem que haver um compromisso entre “a proteção das crianças e o respeito pelos seus direitos e liberdade”. Dito de outro modo, “não é controlando todos os passos de uma criança que os pais a ensinam a ser autônoma e responsável”, sendo que, tratando-se de um adolescente em idade de testar os limites, “é muito natural que o dispositivo seja largado na gaveta da escola para enganar os pais”. Por outro lado, “alguém que tenha um filho doente, ou diabético ou hemofílico, pode encontrar algum conforto no fato de o poder localizar a qualquer momento”, reconhece esta responsável.

Mais de 70 desaparecimentos em 2008

A Inosat também pensa assim, segundo David Pinheiro. Por isso, a empresa já fechou uma parceria com a Associação Portuguesa de Familiares e Amigos de Doentes de Alzheimer que proporciona aos associados dez por cento de desconto na compra do aparelho. O preço ronda os 360 euros e, porque o dispositivo permite a definição de zonas de segurança e o estabelecimento de alertas automáticos quando o portador do dispositivo entra ou sai de locais específicos, a associação reconhece os seus benefícios, não tendo deixado, porém, de alertar no seu site para a necessidade de respeitar ''a liberdade de movimentos das pessoas com demência''.

Dentro de pouco tempo, a empresa, que também fabrica e comercializa o Car Locator, deverá lançar o My Locator, um dispositivo semelhante ao Child Locator ''mas com um ‘branding’ diferente, para deixar claro que também pode ser usado para localizar malas de viagem ou estojos com instrumentos musicais''.

Em 2008 foram comunicados 76 desaparecimentos de crianças e adolescentes, segundo a Linha SOS Criança Desaparecida. Na maior parte dos casos (34), os desaparecidos tinham entre 11 e 15 anos, seguindo-se o grupo etário dos 16 aos 21 anos. Quanto aos motivos do desaparecimento, a fuga de casa aparece à frente (46 casos), seguindo-se a fuga de instituições (16) e o rapto parental (12 casos). Daquele universo, 59 menores apareceram entretanto, sendo que 15 continuam desaparecidos, ainda segundo a SOS Criança Desaparecida que registrou um alarme falso e um menor falecido.

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