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Rusgas entre Putin e Medvedev indicam fim de lua de mel pós-eleições na Rússia

Rusgas entre Putin e Medvedev indicam fim de lua de mel pós-eleições na Rússia

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 09:44

Durante três anos, a partilha de poder entre o primeiro-ministro russo, Vladimir V. Putin, e o presidente Dmitry Medvedev funcionou tão bem quanto um carro de luxo, acalmando os céticos que diziam que qualquer divisão da autoridade executiva na Rússia levaria à instabilidade. O arranjo ambíguo parecia acalmar as tensões, permitindo que todos, de tecnocratas pró-Ocidente aos defensores de uma linha dura, acreditassem que estavam representados no topo.

Mas ultimamente a dupla começou a se desentender. É impossível dizer se a confiança entre os dois homens chegou ao fim, mas um deles vai aumentar o seu poder nas eleições presidenciais da próxima primavera. Mas inúmeros oficiais, empresários e políticos parasitas – incerto se devem mostrar lealdade para um homem, o outro ou ambos – passou todo o mês passado “à beira de um colapso nervoso", conforme escreveu o economista Vladislav L. Inozemtsev na semana passada no jornal Moskovsky Komsomolets.     Putin inventou o acordo em 2008, quando os limites de mandato o impediram de tentar a presidência novamente, e é em grande parte sua escolha se ele irá continuar. Ele tentou acabar com a especulação, mesmo enquanto trabalhava para atrasar a decisão de quem será o candidato presidencial até o outono, mas pode ser tarde demais.

Winston Churchill comparou as disputas de poder do Kremlin a lutas entre bulldogs sob um tapete: "Um estrangeiro só ouve o rosnar, e quando ele vê os ossos voarem para fora, é óbvio quem ganhou”.

Essa dinâmica voltou nas últimas semanas, conforme pequenas figuras políticas começaram a disseminar rumores ao público. Tomemos o caso de Konstantin F. Zatulin, um parlamentar do partido do governo, o Rússia Unida, que o destituiu de um posto de prestígio em uma comissão depois que ele defendeu a opinião de Putin sobre a Líbia e não a do presidente, efetivamente criando uma separação entre os dois. Ele então começou a dizer publicamente que Medvedev havia rompido o acordo com Putin, e estava tentando prejudicá-lo.

"A história mais antiga na História ocorreu aqui: tendo recebido autoridades grandiosas, um presidente jovem, e em maior medida o seu círculo íntimo e sua família," estão determinados a mantê-los, Zatulin disse em uma entrevista em seu gabinete. Ele disse que Medvedev foi apoiado por empresários poderosos, conhecidos como oligarcas, que esperavam recuperar a influência que perderam sob Putin. "Acho que eles ficam muito mais confortáveis com um presidente fraco do que com um forte, e encontraram uma pessoa que podem manipular", disse Zatulin.

Deconfiança e futuro

Ele disse que a desconfiança entre os times é tão grande que é pouco provável que a dupla continue a trabalhar lado a lado depois das eleições, e que Medvedev poderia usar a única vantagem que tem sobre seu mentor. "Não posso excluir que alguns dos conselheiros de Medvedev acreditam que para ele ganhar a eleição precisará demitir Putin do cargo de primeiro-ministro", disse Zatulin. "Eu não posso confirmar isso, mas seria estranho se não tivessem considerado essa possibilidade”.

Não muito tempo depois que as palavras de Zatulin chegaram a público, uma história estranhamente simétrica apareceu na imprensa. Desta vez, foi Gleb O. Pavlovsky, um consultor político que disse que havia sido repreendido por dizer que Putin não deve retornar à presidência. Ele afirmou que os oficiais do Kremlin haviam reclamado durante muitos meses sobre seus comentários, que violavam a ordem tácita e “não dizer nada sobre um candidato até que tudo esteja decidido”. Em meados de abril romperam um relacionamento de 15 anos. "Putin e sua equipe estão muito nervosos com esse tipo de declaração, provavelmente mais do que a equipe de Medvedev", disse Pavlovsky.

Ele disse que não houve separação pessoal entre os dois homens – "Eu posso confirmar isso", disse – mas que o acordo entre eles foi construído com cuidado para manter o equilíbrio, e que nenhuma das equipes é forte o suficiente sozinha para acabar com o impasse. Ele disse que Putin começou a considerar um retorno à presidência por causa do "medo de que alguns terríveis liberais cheguem ao poder" e enfraqueçam o Estado forte que Putin construiu. "Onde estão os liberais? Eles não existem", disse Pavlovsky. "Esse é o problema: Eu tenho ouvido sobre esses liberais há 20 anos".

Entretanto, sua principal queixa é que a paralisia durante a candidatura torna impossível o trabalho em questões importantes, como o caminho que a Rússia deve tomar depois das eleições.

"É um absurdo, os debates são necessários" sobre a plataforma do próximo presidente e sua equipe, disse Pavlovsky. "É muito difícil fazer uma equipe sem um líder. É como aprender a nadar em uma piscina seca".     Nessas entrevistas, como em toda a política russa, é difícil dizer o que é real e o que é artificial. Nem Zatulin nem Pavlovsky são membros do círculo íntimo dos líderes e seus motivos são obscuros. Zatulin perdeu um aliado poderoso em setembro, quando Yuri M. Luzhkov foi expulso de seu cargo de prefeito de Moscou, sob as ordens do presidente. Pavlovsky, entretanto, tem um currículo de 15 anos de jogo político virtuoso.

Mas está claro que a diferença pública entre Putin e Medvedev aumentou. Primeiro, eles apostaram em posições diferentes a respeito da operação da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) na Líbia, país que Putin condena apaixonadamente. Quando Medvedev disse à televisão chinesa, que o candidato a presidente seria anunciada em breve, Putin o contradisse, deixando claro que prefere esperar o máximo de tempo possível.

A história sugere que poderia ser muito tempo. Boris Yeltsin anunciou sua renúncia em 31 de dezembro de 1999, poucos dias depois das eleições parlamentares; em 2007, Putin anunciou Medvedev como seu sucessor em 10 de dezembro, poucos dias depois das eleições parlamentares. As eleições parlamentares deste ano estão agendadas para 04 de dezembro.

Enquanto isso, os círculos políticos de Moscou acompanham a briga de bulldogs debaixo do tapete.

Putin abriu uma nova rodada de especulações na sexta-feira, quando anunciou a criação de uma "frente popular", de âmbito nacional, que alguns viram como a base para uma possível candidatura presidencial. Medvedev convocou uma rara coletiva de imprensa para o dia 18 de maio, para o mesmo efeito.

A tensão prolongada pode desencader uma grande divisão no seio da elite política, disse Dmitri K. Simes, um veterano observador da Rússia que dirige o Centro para o Interesse Nacional, um think tank com sede em Washington. Ele retornou de uma viagem recente a Moscou impressionado com a mudança no ambiente político, agora repleto de desconfiança. "Nunca se esqueça do número de pessoas que estão jogando jogos duplos", disse ele. "As pessoas correm por aí dizendo uma coisa de manhã e outra coisa na parte da tarde”.        

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