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'Valéria e Janete' driblam o humor politicamente correto

'Valéria e Janete' driblam o humor politicamente correto

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 09:29

Personagens: Valéria, transexual decadente, Janete, uma garota suburbana bem feia, e um delegado bolinador.

- Valéria, Valéria, tem um homem aqui me bolinando.

- Aproveita, que você não tá podendo escolher, Janete.

- Pelo que eu tô sentindo, ele é policial investigativo. Ele tá examinando meu corpo de delícia.

(Homem para Janete) - Estou aqui investigando a morte do 'seu Peru'.

- O senhor me respeite, que eu sou uma moça de família, diz Janete.

(Homem para Valéria) - Quando foi a última vez que a senhora viu o 'seu Peru'?

- Na cirurgia. Deixei na bandeja pra darem pros cachorros.

É com um humor que passa longe de qualquer grau de refinamento que a dupla de humoristas Rodrigo Santana e Thalita Carauta vem contribuindo para detonar o padrão politicamente correto que tenta se instalar na comédia nos últimos tempos. Eles interpretam Valéria e Janete, em um quadro do Zorra Total, da TV Globo.

Janete e Valéria trouxeram um frescor momentâneo ao marasmo instalado nos programas humorísticos que não seguiram a tendência do stand up (humor de cara limpa). "Se você me pergunta como aconteceu este sucesso, não sei explicar. Fazemos estes tipos há anos e só agora descobriram nossas piadas", conta Thalita.

A incorreção das piadas, no entanto, trouxe esperadas críticas. Seja na ala feminista (por fazerem piada com o abuso sexual em vagões lotados), seja de políticos - a Secretaria de Mulheres do PSTU divulgou uma nota classificando o quadro como "incentivo à violência contra mulheres e ao estupro" - e até dos transexuais (pelo estilo "maléfico" do personagem do Rodrigo).

Antes da entrevista, eles dão um selinho. E pedem para que o fotógrafo faça uma foto. Mas logo mudam de ideia, assombrados pelos possíveis patrulhamentos. "Beijando não! Ih, esquece. Vão falar que estamos contribuindo para o lesbianismo, que estamos influenciando as crianças a virarem lésbicas", exagera Rodrigo.

Caracterizados,  Rodrigo e Thalita conversam com o iG no intervalo das gravações do quadro do Zorra Total. Os dois humoristas sabem onde se meteram. Ao parodiarem o estilo de vida suburbano, só estão reproduzindo suas próprias origens, oriundas do subúrbio carioca. A vida em trens lotados é passado. Agora só andam de carro. E moram bem. Ela em Santa Teresa, ele em Laranjeiras, zona sul do Rio. "Ah, melhorou um pouquinho.... Ai, moço do iG, Deus deu tanta coisa para gente. Coloca isso que é bonito", debocha Rodrigo.

Como surgiu a ideia do quadro?

THALITA CARAUTA: Veio do espetáculo "Os Suburbanos", peça com a qual estamos há cinco anos. Só adaptamos a peruca para a TV, de resto é tudo igual.

RODRIGO SANTANA: Desde que fomos para o Zorra, o povo nas ruas não para mais de comentar que tem gente bolinando!

Dá para explicar o sucesso do quadro?

THALITA: É algo complicado de entender. Não sei... A gente vem de um quadro anterior que não tinha esta aceitação toda. Não imaginávamos que teria este ‘boom’. Janete e Valéria parecem dois "clowns", são palhacinhos. É uma relação de implicância, o que os aproxima do universo infantil.

E sua opinião, Rodrigo?

RODRIGO: Concordo com ela... Sabe Cosme e Damião? É a gente! Até nas respostas (risos).

Em quem vocês se inspiraram para fazer Janete e Valéria?

RODRIGO: A gente pega alguma coisa de um, outra de outra pessoa...

THALITA: Não tem uma figura específica. O que me conduz é a inocência da personagem. Dentro disso, incluo o que é coerente com ela, como o corpinho meio fechado, a roupa... O universo da dupla é o universo suburbano.

Vocês vieram do subúrbio?

THALITA: Que nada. Vim de Ipanema. Sou da turma que conviveu com Cazuza. Tomava café com ele no Arpoador. Não, brincadeira. Vim de Água Santa, subúrbio mesmo. Depois Méier e Cachambi... ai! (risos) Rodrigo, você veio da onde, hein?

RODRIGO: Ih, garota, responde a tua vida, eu hein. Se mete com a minha não!

THALITA: Eu queria te poupar de se expor a este nível de absurdo na frente do repórter (risos).

RODRIGO: Não quero falar que vim do Morro dos Macacos, não aguento mais! Sim, iG, sou favelado. Do Morro dos Macacos para Quintino.

Vocês se consideram representantes do humor "politicamente incorreto"?

RODRIGO: O politicamente correto, ou não, esbarra no ponto de vista individual de quem vê aquilo acontecer.

THALITA: Tem que ter respeito, apesar de tudo. Dentro de uma empresa como a Globo, o que eles decidirem o que é possível, eu acato. Já no teatro, eu é que decido o que devo fazer. Mas sempre de forma respeitosa. Tendo isso bem claro, o problema não chega.

A Secretaria de Mulheres do PSTU divulgou uma nota classificando o quadro como "incentivo à violência contra mulheres e ao estupro". Como lidam com este tipo de crítica?

THALITA: Estas coisas não me atravessam, não me preocupam. O público que é a favor é muito maior. Somos dois personagens que estão na mídia, então qualquer coisa que falem, é para vender revistas. Querem causar polêmica de alguma forma. Daqui para frente, vão falar ainda mais. A gente é a bola da vez.

RODRIGO: O humor é reflexo da sociedade. O que vale é o bom senso, para que não se extrapole e se faça uma piada de mau gosto. É um cuidado que temos que ter sempre, para não perder a mão. O humor é uma versão debochada da vida, e só acontece por ser assim. Tem pessoas sendo processadas porque chamou um de negro ou outro de gay durante uma piada!

Em algum momento vocês pensaram que poderiam ofender alguém com as piadas?

RODRIGO: Não, porque, se for parar para pensar, quem bolinaria aquela figura? Não tem motivo (risos). Mas tem pessoas que resolvem enxergar as coisas sob um prisma de ofensa para as mulheres. Cabe a você escolher que ponto de vista quer dar. Fico imaginando a dimensão surreal que as brincadeiras vão tomando. Está na cara, no cabelo, na vestimenta da gente que isso é tudo humor.

Quando foi a última vez que pegaram metrô?

RODRIGO: Gravei há uma semana um quadro para o Fantástico, vale (risos)?

THALITA: Minha última vez foi há três meses, antes do quadro acontecer. Depois disso só ando com meu carrinho. Agora nem sei mais como seria se eu entrasse em um vagão.

Já foram bolinados no metrô?

THALITA: Em ônibus sim. É uma coisa que acontece, vira piada... Dá um passa-fora e segue a vida.

RODRIGO: Ela aproveita, ué! Não está podendo escolher (risos). Agora, se eu já fui? Sim, já! Não, mentira. Pelo amor de Deus, estou brincando. Título da matéria: "atriz foi bolinada".

São a favor da lei municipal carioca que destina um vagão exclusivo para mulheres na hora do rush?

THALITA: Eu sou. É desconfortável você saber que, em um vagão lotado, tem homens que podem se aproveitar para dar uma investida.

RODRIGO: Ah, sei lá... Não penso bem assim...

THALITA: Que é isso! Pensa na sua mãe, garoto. Sua mãe pega metrô.

RODRIGO: (risos) Ih, ela está tanto tempo sem fazer nada, até que podia passear em um.

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