Em teu louvor

Tu és o transpirar do meu espírito, a adrenalina que retesa os músculos da minha alma, o rastilho que explode o meu ser. – Tu és o meu Deus.

 

Tu és o labirinto que me angustia, o horizonte sempre um pouco adiante de mim, as redondezas de minhas aldeias imaginárias, a catedral dos meus êxtases espirituais.– Tu és o meu Deus.

 

Tu és o meu amigo discreto, o destinatário de minha correspondência, o meu silencioso resgatador, o emissário do anjo que me guarda, o velado conselheiro que me ouve, ouve, ouve… – Tu és o meu Deus.

 

Tu és o sangue que acaba de ser doado, a ponta da saia que a menina segura, a trava da porta na casa do ancião, o fiel da balança do juiz, o parapeito no abismo do amante. – Tu és o meu Deus.

 

Tu és um mapa para náufragos, um astrolábio para navegantes, uma roldana a suspender âncoras, uma quilha a rasgar borrascas, uma bruma a alentar solitários. – Tu és o meu Deus.

 

Tu és o meu poema decassílabo, a minha rima impecável, a minha assonância ritmica, a minha viola repentista, o meu jazz improvisado, a minha sinfonia exata. – Tu és o meu Deus.

 

Tu és, em meu romance banal, um narrador onipotente, eternamente enredado pela personagem que carrega o meu nome. – Tu és o meu Deus.

 

Tu és meu espelho esfumaçado, dorso que entrevejo na escarpa da rocha, minha nostalgia suprema, meu intricado enigma, meu paradoxo enervante. – Tu és o meu Deus.

 

Tu és o equinócio que prolonga o meu dia, a luz boreal que colore o meu céu glacial, o juazeiro verde que destoa a minha caatinga, o lodo que agasalha as pedras do meu caminho, o ruço que enaltece os meus fins de tarde. – Tu és o meu Deus.

 

Tu és o nada que plenifica o meu viver, o vazio que fecunda o meu universo, o etéreo que se fez carne, o divino que escolheu morar em corações imperfeitos como o meu. – Tu és o meu Deus.

 

Soli Deo Gloria

 

 

- Ricardo Gondim