STF: Julgamento sobre a descriminalização da maconha é interrompido sem decisão final

A interrupção do julgamento partiu do ministro Dias Toffoli, após abrir divergência dos outros votos já proferidos.

Fonte: Guiame, com informações da BBC e Jovem PanAtualizado: sexta-feira, 21 de junho de 2024 às 12:26
Ministro Luís Roberto Barroso preside Sessão Plenária realizada em 20 de junho de 2024. (Foto: Andressa Anholete/STF)
Ministro Luís Roberto Barroso preside Sessão Plenária realizada em 20 de junho de 2024. (Foto: Andressa Anholete/STF)

O Supremo Tribunal Federal (STF) ainda não chegou a uma decisão sobre a descriminalização do porte de drogas para uso pessoal, cujo julgamento foi retomado nesta quinta-feira (20).

Iniciado em 2015, o julgamento, que foi interrompido várias vezes por pedidos de vista, não abrange a legalidade da venda de drogas, que continuará proibida independentemente do resultado.

Desta vez, a interrupção partiu do voto do ministro Dias Toffoli, que apresentou uma opinião diferente da dos outros ministros durante a sessão de ontem. Devido a essa divergência, o julgamento ainda não chegou a uma conclusão definitiva.

Até agora, foram registrados cinco votos favoráveis à descriminalização apenas no caso da maconha.

Os ministros favoráveis são: Gilmar Mendes (relator), Luís Roberto Barroso (presidente do STF), Rosa Weber (que votou antes de se aposentar), Edson Fachin e Alexandre de Moraes.

Esses ministros consideraram que o trecho da atual Lei de Drogas que trata o porte de maconha como crime é inconstitucional.

Lei das Drogas

A ação examinada pelo STF questiona o artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), que aborda o transporte e o armazenamento de drogas para uso pessoal.

As penas previstas são leves: advertência sobre os efeitos, serviços comunitários e medida educativa de participação em programa ou curso sobre uso de drogas.

Criminalização constitucional

Outros quatro ministros votaram pela constitucionalidade desse trecho, embora com argumentos diferentes. Três deles — Cristiano Zanin, André Mendonça e Kassio Nunes Marques — consideraram que a criminalização é constitucional.

Dias Toffoli, que votou nesta quinta-feira (20), afirmou que a lei atual já não considera o porte para consumo como uma infração penal, pois as punições previstas têm caráter administrativo.

O crime de porte para consumo não é punido com pena de prisão no país desde 2006, quando foi sancionada a atual Lei de Drogas. Caso a descriminalização seja aprovada pelo STF, a pessoa que portar entorpecentes para consumo próprio não estará mais sujeita a outras punições atualmente em vigor, como prestação de serviços à comunidade ou participação em programas ou cursos educativos, nem terá um registro na sua ficha criminal.

Usuários ou traficantes

Além de decidir sobre a descriminalização do porte para consumo, o STF também está analisando a definição de critérios para diferenciar usuário de traficante.

Ainda não há consenso nesse ponto. Até o momento, há quatro votos — Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso e Rosa Weber — a favor de estabelecer o limite de 60 gramas ou seis plantas fêmeas para o porte para consumo. Quantidades acima desse limite seriam classificadas como tráfico de drogas.

Cristiano Zanin e Kassio Nunes Marques propuseram um limite menor, de 25 gramas, enquanto André Mendonça sugeriu um limite de 10 gramas.

Edson Fachin, por sua vez, considerou que cabe ao Congresso Nacional definir esse limite, enquanto Dias Toffoli sugeriu que ele poderia ser estabelecido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

O objetivo de estabelecer parâmetros é evitar que pessoas com a mesma quantidade de maconha sejam tratadas de maneira diferente pela polícia ou pela Justiça, argumentaram os ministros favoráveis à medida.

"Na falta de critério, a mesma quantidade de drogas nos bairros mais elegantes das cidades brasileiras é tratada como consumo e, na periferia, é tratada como tráfico. O que nos queremos é acabar com essa discriminação entre ricos e pobres, basicamente entre brancos e negros", disse Barroso.

Kassio Nunes Marques, por sua vez, minimizou a importância de estabelecer parâmetros que diferenciem traficantes de usuários e criticou a possibilidade de descriminalização pelo STF.

"A grande preocupação da maioria das famílias brasileiras não é se o filho vai preso ou não, a preocupação é que a droga não entre na sua residência. E, para isso, ela [a criminalização] tem hoje o fator inibitório", argumentou Nunes Marques.

"[A criminalização do porte] traz um instrumento de defesa da família pobre brasileira, onde ela diz: 'meu filho, não faça isso porque é crime'", continuou.

O tema em análise pelo STF divide a sociedade. Defensores da liberação do porte de pequenas quantidades para uso pessoal argumentam que a criminalização fere princípios constitucionais, como o direito à privacidade de cada indivíduo.

Decisão do STF ou legislação

Há também questionamentos sobre se o STF deveria decidir sobre a questão ou se apenas o Congresso Nacional teria a competência para liberar o porte para consumo, aprovando uma mudança na lei atual.

"Nós estamos passando por cima do legislador caso a votação prevaleça com essa votação que está estabelecida. O legislador definiu que portar drogas é crime. Transformar isso em ilícito administrativo é ultrapassar a vontade do legislador", criticou André Mendonça.

Durante a sessão, houve um embate entre Luís Roberto Barroso e o ministro André Mendonça.

Mendonça argumentou que a decisão do STF poderia mudar o entendimento do legislador e permitir o porte de maconha, o que, na prática, estaria liberando o uso. Ele destacou que transformar o porte de drogas em uma infração administrativa ultrapassa a vontade do legislador.

“A grande verdade é que nós estamos passando por cima do legislador. O legislador definiu que portar drogas é crime. Decidir que é ato administrativo é passar por cima do legislador. Nenhum país do mundo fez isso por decisão judicial. E a grande pergunta que fica sobre o ato administrativo é: quem vai processar? Quem vai condenar?”, questionou Mendonça, concordando com o bispo da CNBB.

Em tom mais alto, Barroso rebateu: “Vossa Excelência acabou de dizer o que eu disse, mas em tom mais panfletário. Minha explicação foi absolutamente corretíssima sobre o que está sendo decidido aqui.”

Brasileiro é contra

Segundo uma pesquisa do Datafolha, realizada em setembro do ano passado, 72% dos brasileiros são contra a legalização da maconha.

O estudo mostrou um aumento na rejeição da descriminalização da droga no Brasil. Em 2018, 66% eram contra a legalização, hoje, 72% da população é contra o consumo recreativo de maconha.

A pesquisa do Datafolha ouviu 2.016 pessoas maiores de 16 anos, em 139 municípios.

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