Tribunal português declara lei da eutanásia inconstitucional

Lei será devolvida ao Parlamento, que poderá reformular o conteúdo julgado inconstitucional ou confirmá-lo por maioria de dois terços.

Fonte: Guiame, com informações do Sic NoticiasAtualizado: terça-feira, 16 de março de 2021 às 12:30
Tribunal Constitucional (TC) paralisa legislação favorável à morte medicamente assistida em Portugal. (Foto: Reprodução / Expresso)
Tribunal Constitucional (TC) paralisa legislação favorável à morte medicamente assistida em Portugal. (Foto: Reprodução / Expresso)

Os juízes do Tribunal Constitucional (TC) paralisaram o “diploma da morte medicamente assistida” nesta segunda-feira (15). O anúncio foi feito em sessão na sede do TC, em Lisboa, pelo juiz relator, Pedro Machete, e depois foi explicado, em comunicado lido pelo presidente, João Caupers.

A eutanásia havia sido aprovada em 29 de janeiro passado, com 136 votos a favor e quatro abstenções.

Agora, uma decisão contrária à eutanásia foi tomada por maioria, de sete juízes contra cinco.

Os juízes deram razão às dúvidas levantadas pelo presidente quanto aos "conceitos excessivamente indeterminados, na definição dos requisitos de permissão da despenalização da morte medicamente assistida, e consagra a delegação, pela Assembleia da República, de matéria que lhe competia densificar".

A paralisação não fecha, contudo, a porta a uma nova lei da eutanásia.

"O tribunal apreciou, tendo concluído pela negativa, a questão de saber se a inviolabilidade da vida humana consagrada no artigo 24º, nº 1, da Constituição constitui um obstáculo inultrapassável a uma norma como a do artigo 2º, nº 1, aqui em causa que admite a antecipação da morte medicamente assistida em determinadas condições", declarou o presidente do Tribunal Constitucional.

“Vida inviolável”

O artigo 24º, nº 1, da Constituição determina que "a vida humana é inviolável".

De acordo com João Caupers, "a este respeito considerou o tribunal que o direito a viver não pode transfigurar-se num dever de viver em quaisquer circunstâncias".

"Na verdade, a conceção de pessoa própria de uma sociedade democrática, laica e plural, dos pontos de vista ético, moral e filosófico - que é aquela que a Constituição da República Portuguesa acolhe - legitima que a tensão entre o dever de proteção da vida e o respeito da autonomia pessoal em situações limite de sofrimento possa ser resolvida por via de opções político-legislativas feitas pelos representantes do povo democraticamente eleitos, como a da antecipação da morte medicamente assistida a pedido da própria pessoa", argumentou.

João Caupers acrescentou que "tal solução impõe a instituição de um sistema legal de proteção que salvaguarde em termos materiais e procedimentais os direitos fundamentais em causa, nomeadamente o direito à vida e à autonomia pessoal de quem pede a antecipação da sua morte e de quem nela colabora" e que, "por isso mesmo, as condições em que, no quadro desse sistema, a antecipação da morte medicamente assistida é admissível têm de ser claras, precisas, antecipáveis e controláveis".

Face à declaração de inconstitucionalidade, o diploma foi, entretanto, vetado pelo Presidente da República e devolvido, neste caso, ao Parlamento, que poderá reformulá-lo expurgando o conteúdo julgado inconstitucional ou confirmá-lo por maioria de dois terços.

“Na sequência do Acórdão do Tribunal Constitucional de hoje, que considerou inconstitucionais normas do diploma submetido a fiscalização preventiva da constitucionalidade, o Presidente da República devolveu à Assembleia da República, sem promulgação, nos termos do n.º 1 do artigo 279.º da Constituição, o Decreto da Assembleia da República que regula as condições especiais em que a antecipação da morte medicamente assistida não é punível e altera o Código Penal", lê-se numa nota publicada no site da Presidência.

Em 18 de fevereiro, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, tinha enviado para o Tribunal Constitucional o diploma do Parlamento que despenaliza a morte medicamente assistida, para fiscalização preventiva da constitucionalidade.

No dia 29 de janeiro, a Assembleia da República aprovou um diploma segundo o qual deixa de ser punida a "antecipação da morte medicamente assistida" verificadas as seguintes condições:

"Por decisão da própria pessoa, maior, cuja vontade seja atual e reiterada, séria, livre e esclarecida, em situação de sofrimento intolerável, com lesão definitiva de gravidade extrema de acordo com o consenso científico ou doença incurável e fatal, quando praticada ou ajudada por profissionais de saúde".

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