A BBC conversou com sobreviventes e testemunhas do massacre na aldeia de Taldou, em Houla, na Síria, no qual pelo menos 108 pessoas foram mortas. Algumas testemunhas quiseram permanecer anônimas, e seus depoimentos, obtidos por telefone, não podem ser verificados de forma independente.
Testemunhas dizem que o ataque foi perpetrado pelo Exército sírio e pela "Shabiha", uma milícia civil sectária que apóia o regime do presidente Bashar al-Assad.
O governo nega as acusações diz que os ataques foram obra de "terroristas armados". Veja abaixo os depoimentos:
"Os membros da milícia \'Shabiha\' atacou as casas. Eles não tiveram compaixão. Nós fotografamos crianças com menos de 10 anos de idade, com suas mãos amarradas e mortas com tiros à queima-roupa, a 10cm de distância, apenas 10 cm. Eles cortaram seus pescoços com facas, não todo o pescoço, mas eles fizeram um buraco no pescoço, um buraco nos olhos." Hamza Omar, ativista de oposição em Houla
"Nós estávamos em casa, eles entraram, a \'Shabiha\' e as forças de segurança, eles entraram com fuzis Kalashnikov e rifles automáticos.
Nós perguntamos a eles o que estava acontecendo, e eles nos disseram para entrar. Nós dissemos: \'O que foi? O que vocês querem?\'. Eles disseram: \'Mostrem tudo, o que vocês estão escondendo\'. E nós dissemos: \'Nós não estamos escondendo nada\'.
Eles nos levaram para um quarto e atingiram meu pai na cabeça com uma coronhada e atiraram nele, direto no queixo.
Eles nos levaram para dentro e nos disseram para ficarmos todos juntos, em um canto. Um homem começou a atirar para o alto, então nós todos nos escondemos atrás da minha mãe. Nós éramos cerca de 15 pessoas.
Então eles abriram fogo. Depois que eles atiraram contra nós, eles começaram a pisar em nós, e um dos homens pediu aos outros para checar se nós estávamos todos mortos. Então eles saíram e começaram a atirar para o alto.
Nós éramos oito irmãos, incluindo eu, e minha cunhada e seu filho. Ela estava grávida de seis meses. Também estavam conosco meu pai, a mulher do meu tio e sua filha, nossa vizinha e seus três filhos, minha tia e suas duas filhas. Uma delas ficou apenas ferida, e está aqui comigo agora, ela tem um mês de idade. A outra morreu. Todos nós estávamos na casa.
Eu sobrevivi com minha mãe, a menina de um mês de idade e minha irmã. Eles atiraram contra nós, mas nós sobrevivemos.
O que vai acontecer conosco? Quando ficamos sabendo que o Exército e as forças de segurança estão vindo, nós corremos para as ruas, nós estamos com medo de que eles repitam o que fizeram conosco no outro dia.
Havia cem casas na vizinhança, eles mataram todos os que estavam dentro. Eles entraram nas casas das pessoas e abriram fogo, e mataram todos."
Rasha Abdul Razaq, sobrevivente
"Ele (um dos atacantes) disse: \'Nós somos das montanhas, de Fulla\'. Então eu disse: \'Somos vizinhos então. Nós não temos terroristas aqui\'. E ele disse: \'Vocês são os terroristas\'.
Eles acharam que eu estava morta. Foi graças a Deus que eu sobrevivi. Ele estava atirando contra meus filhos e gritando. Por favor, consiga alguma proteção para mim e para minha filha. Nós estamos agora ficando nas casas de diferentes pessoas. Nós temos medo que eles acabem conosco."
Mãe de Rasha Abdul Razaq, sobrevivente
"Nós estavamos abrindo nossas casas para eles, nós achavamos que eles eram do Exército e que estavam fazendo inspeções.
Um deles me disse: \'Volte para dentro, você é a próxima\'. Eu estava com meu marido e meus filhos. Então peguei o comprovante de serviço militar de meu marido, achei que talvez assim eles talvez não nos incomodassem. Mas eu só sobrevivi porque um deles atirou contra o outro, por engano, e gritou: \'Preciso de ajuda, o pai foi ferido\'. Isso os deixou ocupados, enquanto nós fugimos, em meio ao tiroteio, do Exército e da \'Shabiha\'."
Anônima, sobrevivente
"Quando eles abriram a porta, eu ainda estava com eles na sala. Eu estava em pé, atrás da porta da sala de estar. Eles levaram meu irmão para fora. Eu me escondi no sótão. Tudo o que ouvi foram tiros, parecia que a casa inteira estava balançando.
Eu abri a porta e vi os corpos. Eu não conseguia reconhecer meus filhos e meus irmãos. Foi indescritível. Eu tenho três filhos, eu perdi três filhos. Eu estou tremendo, enquanto falo com você."
Anônima, sobrevivente
"Nós fugimos na noite de sexta-feira… Eles estão nos atacando e matando pessoas… Nós fugimos pelas plantações, bombardeados aqui e ali. Não sei como conseguimos. Enquanto caminhavamos, atiradores miravam contra nós, nós nos escondemos nas plantações."
Um Mohammed, sobrevivente
"Bombardeios por todos os lados… Eu não tenho notícias da minha família. Por que vocês não estão intervindo? Os cadáveres estão se amontoando."
Um Abdullah, sobrevivente
"Houve dois massacres. O primeiro aconteceu na estrada de Sadd e começou por volta das 14h30 de sexta-feira.
O segundo massacre aconteceu por volta das 23h, na estrada na entrada principal de Taldou, em frente ao posto de segurança militar.
Uma van, duas picapes e um grupo de motocicletas vieram da aldeia de Fulla – que apóia o regime –, na estrada entre Fulla e Taldou, a 500 ou 700 metros de Fulla.
Eles encontraram um pastor na entrada. Seu nome é Mahmoud al-Kurdi, e ele estava com sua nora e seus quatro netos. Eles atiraram contra eles, mataram todos, menos a nora. Ela foi ferida na coxa e na barriga, mas ainda está viva.
Então eles entraram na casa de Samir Abdul Razaq. Ele foi morto com seus filhos – Sawsan, Houda, Jouzila e Nada –, com sua nora, Halloum El Khlaf, grávida de seis meses, e o filho dela, Ala’a Abdul Razaq, a cunhada de Samir, Khaloud El Khalaf, e sua filha, Rahaf Al Hussein. Sua outra filha, Zahra Al Hussein, levou dois tiros, mas sobreviveu.
A mulher de Samir foi atingida a coronhadas e desmaiou, mas ainda está viva. Entre as vítimas nesta casa também estavam quatro crianças, filhas de Fadi al-Kurdi.
A próxima casa foi a de Qutayba Abdul Razaq. Ele sobreviveu, e sua filha de um ano de idade foi ferida. Ele perdeu a mulher e cinco filhos.
Todos esses de quem estou falando morreram a tiros. Eles foram reunidos em uma sala e mortos a tiros. Houve uma criança que teve a cabeça esfolada com uma faca. A faca foi encontrada entre os corpos, e nós temos fotos.
A terceira casa pertence a Nidal Abdul Razaq. Sua mulher e quatro de seus filhos foram mortos. Ele e um dos filhos sobreviveram.
Há várias outras vítimas. Adel Abdul Razaq, sua família inteira, mulher e seis filhos. Mustava Abdul Razaq, sua mulher, suas quatro filhas e sua nora. Ayman Abdul Razaq, todos os seus seis filhos e sua mulher foram mortos. Yaacoub Hussein Abdul Razaq, Mohammad Shafiq Abdul Razaq, Mohammad Abbara e sua filha Amina e a família dela, de sete pessoas.
Abdul Khalek Abdul Razaq, sua mulher e sua filha sobreviveram. Mas ele perdeu outros seis filhos, sua nora e os três filhos dela.
Abdul Rahman Abdul Razaq perdeu a mulher, cinco filhas e 11 netos, além das seis noras e quatro dos filhos delas. Na casa dele, 27 pessoas foram massacradas na mesma sala."
Akrama Bakour, do Exército Sírio Livre, em Houla
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