Pastor abrigou 63 venezuelanos durante protestos em Roraima: “A compaixão venceu”

O pastor Gedeão Vasconcelos acolheu 47 adultos e 16 crianças venezuelanas em sua casa durante as manifestações.

Fonte: Guiame, com informações do G1Atualizado: segunda-feira, 27 de agosto de 2018 às 13:37
Gedeão (no centro) ao lado da esposa, Sandra, e parte dos refugiados que acolheram. (Foto: Emily Costa/G1 RR)
Gedeão (no centro) ao lado da esposa, Sandra, e parte dos refugiados que acolheram. (Foto: Emily Costa/G1 RR)

A crise dos refugiados da Venezuela teve seu ápice em 18 de agosto, quando mais de 1,2 mil de migrantes foram expulsos durante um violento protesto de moradores de Pacaraima, no Norte de Roraima. O que poucos sabem é que, naquele mesmo dia, a atitude de cristãos brasileiros mudou a vida de 63 refugiados venezuelanos: 47 adultos e 16 crianças.

Naquela manhã de sábado, o pastor Gedeão Vasconcelos e sua mulher, Sandra Vasconcelos, notaram a agitação da cidade e souberam que os moradores estavam expulsando os refugiados que estavam abrigados no palco do Micaraima — na fronteira entre os dois países — revoltados com o assalto a um comerciante brasileiro, que foi supostamente cometido por venezuelanos.

“Me disseram que a manifestação não estava mais pacífica, que estavam expulsando venezuelanos, colocando gasolina, queimando tudo”, disse Gedeão, que lidera uma Igreja Batista, em entrevista ao G1. “Me preocupei, porque lá tinham crianças, famílias, que nós ajudávamos, evangelizávamos e dávamos comida”.

O palco, antes usado para shows e eventos, foi destruído por um trator e os pertences dos refugiados foram banhados em gasolina e queimados. Antes disso, o pastor conversou com o comandante da Força Nacional e pediu permissão para pegar as crianças que estavam embaixo do palco.

“Ele disse ‘pastor, você pode pegar, sim, e rápido que a gente não sabe até quando a gente pode segurar esse povo’. Aí eu peguei, comecei a colocá-las no meu carro e na sequência eu liguei para a irmã, falei que estava tudo muito violento, e pedi ajuda”, lembra Gedeão.

O resgate foi feito em partes. Primeiro os cristãos resgataram as crianças, depois os adultos. “Ao longo do dia a gente foi escondido, entrando por trás, por dentro da Venezuela e resgatando crianças e adultos também. Foi uma correria”, relembra o pastor que também teve medo de ser alvo dos manifestantes.


Os venezuelanos Steven Ortiz e Rosana Luzes foram abrigados com os filhos. (Foto: Alan Chaves/G1 RR)

“Foram 63 pessoas que acolhemos ao todo. A compaixão venceu o medo”, Gedeão celebra. “Teve uma hora em que não aguentei. Todos choravam. As crianças, a missionária que me ajudava e eu. Tive que ter forças, pedir a Deus. Tem horas em que a gente não aguenta, é ser humano”.

Abrigo na igreja

Em pouco tempo, a casa em que Gedeão e a esposa moram há três meses se encheu. Outros venezuelanos que souberam do refúgio bateram à porta e também foram acolhidos. Missionários ligados à igreja também abriram suas casas para abrigá-los e reuniram doações de roupas e alimentos.

Hoje cerca de 30 ainda vivem nas dependências da igreja, enquanto outros refugiados seguiram viagem.

“Tudo começou numa manifestação pacífica, boa, que tinha que acontecer, mas que acabou sendo muito violenta. Lá havia pessoas que tinham sido vítimas de venezuelanos. Assim como há brasileiros ruins, bandidos, também têm venezuelanos maus, bandidos, que fizeram coisas más em Pacaraima, mas não se pode generalizar”, conta Gedeão, que já teve um tanquinho e uma panela da igreja furtados por venezuelanos.

Natália Cardoso, uma das missionárias que ajudou no acolhimento dos venezuelanos, viajou de Boa Vista a Pacaraima levando doações para os refugiados. “Foi muito impactante chegar na igreja e encontrar as crianças e os familiares. Eles ainda estavam um pouco abalados, assustados, mas a gente pode ver que eles sentiam que já estavam em segurança. Encontrei amor e acolhimento lá”, disse.

Antes dos protestos, a igreja costumava evangelizar e distribuir alimentos para cerca de 79 venezuelanos que viviam acampados debaixo do palco Micaraima. “Viviam ali como bichos, andavam abaixados porque o 'teto' era baixo. Comiam coisas do lixo, e passavam fome”, relatam Gedeão e Sandra.

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