Como lidar com suspeitas de abuso infantil na EBD? Tia Jô orienta igrejas

Em entrevista exclusiva ao Guiame, a líder de Ministério Infantil falou sobre como a Igreja pode ajudar no combate ao abuso infantil.

Fonte: Guiame, Cássia de OliveiraAtualizado: quinta-feira, 19 de maio de 2022 às 15:22
Para Joani, a Igreja tem um papel no enfrentamento do abuso infantil. (Foto: Facebook/Assembleia de Deus de Ijuí).
Para Joani, a Igreja tem um papel no enfrentamento do abuso infantil. (Foto: Facebook/Assembleia de Deus de Ijuí).

Em um encontro infantil em um grande ginásio no Brasil, uma multidão barulhenta e animada de cinco mil crianças louva a Deus com a Tia Jô, enquanto ela manuseia uma ilustração articulada de Jesus, uma ferramenta lúdica usada para evangelizar os pequenos. 

De repente, a líder sente o calor de um abraço. É um menino carinhoso que correu ao seu encontro, encantado pela figura de Jesus. Acariciando a ilustração, ele pergunta em seu ouvido: “Tia, você me empresta o seu Jesus para dormir comigo hoje?”.

No meio do ginásio lotado, com sua experiência de mais de 30 anos no Ministério Infantil, protegendo crianças de maus tratos, aliado ao discernimento espiritual, a Tia Jô ouve um grito de socorro no sussurro do menino.

“Eu desliguei meu microfone sem fio e falei no ouvidinho dele: ‘Eu te dou o meu Jesus para dormir com você no seu quarto hoje, mas só se me contar quem é que você quer que veja Jesus com você na sua cama”.

“E Ele me disse: ‘Tia, se o meu tio ver Jesus comigo na minha cama, ele não vai me machucar, não é?”, contou a líder.

Enquanto aguardava seu próximo vôo no aeroporto rumo a uma mobilização do Maio Laranja, a líder de ministério infantil Joani Bentes, conhecida como Tia Jô, concedeu uma entrevista exclusiva ao Guiame, contando sobre a jornada de ações contra o abuso sexual infantil que seu ministério está promovendo durante os últimos dias.

A campanha, que dura todo o mês, marca o Dia Nacional De Combate Ao Abuso E Exploração Sexual Infantil (18 de maio), com o propósito de mobilizar e conscientizar sobre o grave problema que vitimiza três crianças a cada uma hora no Brasil, segundo dados do governo federal.

Em seu ministério, Joani já detectou, denunciou e tratou inúmeros casos de abusos contra crianças, como o do menino do ginásio. Ao Guiame, ela também falou sobre como a Igreja pode se engajar no Maio Laranja e ajudar a combater o abuso infantil. 

Igreja: uma rede de proteção


O Instituto Tia Jô tem realizado mobilizações de enfrentamento ao abuso infantil durante o Maio Laranja. (Foto: Instituo Tia Jô).

De acordo com dados do Disque 100, só em 2021, foram feitas 18.681 denúncias de violências sexuais contra crianças e adolescentes. Na maioria dos casos, o abusador era próximo ao menor, como padrastro, pai, mãe, tio e vizinho. Se acredita que o crime é subnotificado, fazendo com que o número real de casos seja maior.

Para a líder, a Igreja tem um papel importante no enfrentamento da violência sexual contra crianças. “A Igreja é uma agência de proteção. O papel da Igreja no combate ao abuso e maus tratos de crianças e adolescentes é criar uma rede fortalecedora dentro da própria congregação, com advogados, psicólogos, conselheiros tutelares e professores, que possam ser a voz da criança”, explicou Jô.

Foi através de uma rede de proteção, que a líder junto com a igreja local pôde socorrer o menino do encontro infantil. 

“Como você protege uma criança num show com cinco mil crianças? Eu abracei ele, sai dançando com ele no meio do palco. Eu já conhecia a igreja, é muito importante você saber em quem pode confiar. E falei no ouvido da pastora: ‘senta ele ao seu lado que o caso é sério, não podemos perdê-lo na multidão”, contou Joani.

Após o evento, a Tia Jô relatou a suspeita ao pastor da igreja, que também era advogado. Eles conseguiram localizar o endereço da casa do menino, que era de uma congregação em um bairro periférico da cidade, e denunciaram o caso às autoridades.

“Um evento que era um show se tornou um evento de proteção. O abusador foi denunciado e preso. O menino recebeu tratamento psicológico e hoje é um adolescente lindo, com suas memórias reformatadas, para a glória de Deus!”, testemunhou a líder.

Prevenção na Escola Bíblia Infantil


O Instituto Tia Jô tem realizado mobilizações de enfrentamento ao abuso infantil durante o Maio Laranja. (Foto: Instituo Tia Jô).

Joani também ressaltou o papel do professor da Escola Bíblia Infantil tanto na prevenção como no combate ao abuso infantil. “Nós não somos simplesmente contadores de histórias, mas somos líderes do ministério infantil, agentes de proteção”, afirmou ela.

Segundo a líder, através de um olhar atento é possível detectar sinais de abuso no comportamento do aluno.

“Certa vez, num desenho de uma criança, na classe Jardim de Infância na escola dominical, eu detectei que ela estava sofrendo abusos. A suspeita foi confirmada. O abusador era o próprio avô”, contou Jô.

De acordo com ela, talvez a criança não consiga se abrir sobre o abuso que sofre, mas é comum que ela manifeste indicadores. 

Os sinais que os professores da EBD e pais devem ficar alertas são: mudanças no comportamento (como fazer cocô na calça ou xixi na cama, ou ter um declínio no desempenho escolar); comportamento sexual ou conhecimento sobre sexo que está além da idade da criança; medos súbitos ou medo de estar com uma pessoa específica; mudanças inexplicáveis no estado emocional; tornar-se extraordinariamente reservada e dor na área genital ou anal.

O professor da Escola Bíblica também pode trabalhar a prevenção do abuso infantil com os alunos através de ferramentas, como o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) lúdico, ensinando sobre os seus direitos.

“Com o ECA lúdico, eu fortaleço os direitos da criança. Muitas vezes, ela não sabe que pode ser ouvida, que ela tem direitos que não podem ser violados, que se foram quebrados é crime e os violadores precisam responder pela quebra desses direitos”, explicou a Tia Jô.

A líder afirmou que a prevenção ainda pode ser feita através de histórias bíblicas, como a de Adão e Eva, onde Deus fez roupas para proteger as partes íntimas deles. “As partes íntimas das crianças não podem ser tocadas, elas têm que ser protegidas”, exemplifica Joani.

Outro recurso é se engajar na campanha do Maio Laranja, promovendo projetos especiais de proteção às crianças, conforme a líder. Ela deu o exemplo do ministério Kids da Igreja Lagoinha, que preparou um devocional infantil para todo o mês de maio, com conteúdo preventivo ao abuso sexual.

Como a Igreja deve proceder em suspeitas de abuso 

“A igreja precisa prevenir as nossas crianças, dando a ela voz, dando a ela direitos. Provérbios diz para sermos a voz daquele que não pode se defender”, lembrou Jô.

A mobilização do Maio Laranja também pode ultrapassar as fronteiras da igreja e alcançar as crianças da comunidade com trabalhos em escolas locais, segundo a líder.

“O Ministério Infantil pode fazer uma atividade lúdica na quadra de uma escola e usar as ferramentas de prevenção. Ensinar a criança que seu seu corpo é um tesourinho que precisa ser guardado, com a musicalização, e contação de história e as brincadeiras”, explicou.

Joani esclarece que em caso de suspeitas de abuso infantil, a igreja deve acionar a rede de proteção. O primeiro passo é investigar com as autoridades competentes, como advogado, conselheiro tutelar e assistente social. 

Com a confirmação da suspeita, a denúncia é feita. “Ligue o disque 100, há também a assistência pelo WhatsApp'', informou a líder.

Protegendo crianças do Brasil e do mundo


Projeto missionário do Instituto da Tia Jô com crianças no Malawi. (Foto: Instituo Tia Jô).

Durante o Maio Laranja, o Instituto Tia Jô tem realizado mobilizações de enfrentamento ao abuso infantil em diversas partes do Brasil, onde há altos índices de violência contra menores, como na Paraíba e no Acre. 

As ações de proteção da organização não acontecem apenas nos meses de maio, mas durante todo o ano. O Instituto também possui 16 projetos missionários em países como o Nepal, onde o tráfico sexual de menores é comum, e Malawi e Moçambique, onde crianças se prostituem em troca de um prato de comida.

Joani destacou que o trabalho é socioevangelístico, levando alimentação e proteção junto com as Boas Novas. “É impossível pregar o Evangelho e deixar a criança num contexto abusivo, debaixo do mesmo teto de seus abusadores”, disse. 

E concluiu com um clamor: “A criança só precisa ser ouvida. Por isso, fique atento aos sinais. Pare de culpar as atitudes agressivas de uma criança. Um menino levado pode estar gritando por socorro com uma atitude agressiva, com uma mudança de comportamento”.

“Seja agente de proteção dessa geração em perigo. Que Deus levante um exército de agentes de proteção”. 

 

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