Os líderes mundiais estão correndo para evacuar seus cidadãos do Afeganistão após a rápida tomada do governo afegão pelo Talibã, no dia 15 de agosto. O impacto do controle dos militantes islâmicos terá implicações além de suas fronteiras, alertam analistas.
A capital, Cabul, caiu nas mãos dos ultraconservadores islâmicos e marcou o colapso do governo civil quando os EUA retiraram sua presença militar antes do prazo final de 31 de agosto.
A comunidade internacional, provavelmente, terá que enfrentar algumas “questões importantes” à medida que a aquisição do Talibã repercute em todo o mundo, disseram especialistas à CNBC.
Entre as questões, estão a perseguição violenta à Igreja, o aumento do terrorismo, a piora na crise de refugiados e a instabilidade regional por conta das tensões entre a Índia e seus vizinhos, Paquistão e China.
Cerca de 72 mil crianças estão fugindo para a capital Cabul, no Afeganistão, nos últimos dias, segundo a ONG Save the Children. (Foto: EPA)
A perseguição aos cristãos vai aumentar
Já existe uma grande preocupação com a Igreja no Afeganistão, país que ocupa o segundo lugar na Lista Mundial da Perseguição 2021, conforme a Portas Abertas. E a tendência agora é piorar.
Já é ilegal que as pessoas se convertam do islamismo ao cristianismo em terra afegã. Apesar disso, estima-se que pode haver até 7 mil cristãos no país. A maioria dos pastores já era ameaçada pelo governo afegão, agora com o controle da nação nas mãos do Talibã, é provável que haja muitos ataques contra os líderes religiosos.
De acordo com um relatório da organização cristã missionária, Frontier Alliance International (FAI), divulgado no dia 17 de agosto, o Talibã tem uma lista com os nomes dos cristãos que eles pretendem perseguir e matar.
“As pessoas estão fugindo para as montanhas em busca de asilo. Elas dependem totalmente de Deus, que é o único que pode e irá protegê-las”, diz o relatório.
Um dos parceiros da FAI, a Global Catalytic Ministries (GCM), observou que, embora muitos estejam se refugiando nas colinas, há cristãos que decidiram ficar e continuar pregando o Evangelho, apesar dos perigos.
Depois da retomada do poder no Afeganistão, o Talibã passou a perseguir e executar aqueles que são considerados “traidores” do sistema islâmico terrorista, entre eles, cristãos e jornalistas.
Conforme a rede de TV cristã SAT-7, os militantes estão parando transportes públicos para investigar os celulares dos passageiros. Se eles encontrarem aplicativos de Bíblias, as pessoas serão executadas no local.
Talibã caça “inimigos” de porta em porta, no Afeganistão. (Foto: Aref Karimi/AFP)
Aumento do terrorismo no mundo
O Afeganistão pode, mais uma vez, se tornar um “viveiro” para o terrorismo, oferecendo refúgio para extremistas, alertaram os especialistas.
O Talibã “nunca rompeu” sua aliança com a Al-Qaeda nas últimas duas décadas, apesar da pressão militar e de dois anos de negociações no Qatar, de acordo com Richard Fontaine, CEO do Centro da Nova Segurança Americana.
Um relatório das Nações Unidas, deste ano, chegou a uma conclusão semelhante, dizendo que “o Talibã e a al-Qaeda permanecem estreitamente alinhados e não mostram nenhuma indicação de rompimento de laços”. Embora, o Talibã refute essas afirmações, conforme o CNBC.
O grupo militante disse que não permitiria que outras organizações terroristas usassem o Afeganistão como base para lançar ataques, mas alguns analistas expressaram dúvidas sobre sua promessa.
“O Talibã realmente não segue esses ideais. Teremos que esperar para ver”, disse Amir Handjani, pesquisador do Instituto Quincy. “Enquanto o Talibã varria o Afeganistão, ele teria libertado cerca de 5 a 7 mil prisioneiros da prisão de Parwan, alguns dos quais são terroristas do Talibã e do Al-Qaeda”, observou.
Ele ainda lembrou que o Afeganistão era “um paraíso para grupos terroristas quando o Talibã estava no poder no final dos anos 1990”.
O ex-assessor de segurança nacional dos EUA, John Bolton, disse à CNBC na semana passada, que a permanência dos EUA tinha como objetivo derrubar o Talibã e o “santuário que eles forneceram à Al-Qaeda”. Mas isso deixou de ser uma realidade no dia 15 de agosto.
Líderes do Talibã. (Foto: AFP)
Piora na crise dos refugiados
Há temores crescentes de uma crise iminente de refugiados — muito parecida com a de 2015 — quando mais de um milhão de refugiados fugiram da guerra na Síria para buscar refúgio na Europa.
“É provável que haja um influxo de refugiados em praticamente qualquer lugar que os afegãos possam ir”, disse Shamaila Khan, diretora de dívida de mercados emergentes da AllianceBernstein.
“Podemos ver pelas fotos do aeroporto de Cabul que eles estão desesperados para sair, então se puderem encontrar uma rota para qualquer país, eles irão”, disse Shamaila.
Cenas de milhares de afegãos no Aeroporto Internacional Hamid Karzai, desesperados para escapar do país, inundaram as redes sociais e ganharam as manchetes da mídia na semana passada.
Um vídeo mostrou uma aeronave militar dos EUA tentando decolar enquanto os afegãos corriam ao lado e, um deles se agarrou ao exterior do avião enquanto ele decolava. O fluxo de refugiados após o colapso do Afeganistão “pode rivalizar com o da Síria em volume”, disse Fontaine, do CNAS.
De acordo com o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, mais de 6,6 milhões de sírios fugiram de seu país desde 2011. A agência estima que pelo menos 550 mil afegãos foram deslocados internamente como resultado do conflito e da insegurança neste ano.
Embora os civis até agora tenham fugido apenas esporadicamente em menor número para os países vizinhos, o ACNUR apontou que essa tendência provavelmente mudará com a evolução da situação no Afeganistão.
Centenas de afegãos conseguiram embarcar em um avião militar dos EUA, de Cabul para o Catar. (Foto: Reuters)
Instabilidade regional
O caos político no Afeganistão pode se espalhar para os países vizinhos e potencialmente exacerbar as tensões entre a Índia e seus vizinhos, Paquistão e China.
Analistas indianos estão preocupados que o retorno do Talibã possa criar espaço para grupos terroristas como o Lashkar-e-Taiba e Jaish-e-Mohammed para lançar ataques contra alvos indianos, de acordo com Elizabeth Threlkeld, pesquisadora sênior e vice-diretora do Programa do Sul da Ásia em Stimson Center.
“Eles também reconhecem que um governo do Talibã daria ao Paquistão uma influência significativa em Cabul em detrimento da Índia”, disse ela.
A Índia parece ter adotado uma abordagem de “esperar para ver” por enquanto. Se um ataque contra alvos indianos tivesse origem no Afeganistão, Nova Delhi quase “certamente apontaria o dedo da culpa para Islamabad”, explicou Elizabeth, que foi oficial de serviço estrangeiro do Departamento de Estado dos EUA, no Paquistão.
“O resultado será uma crise Índia-Paquistão com potencial de escalada perigosa”, disse ela, acrescentando que provavelmente será mais fácil para o Paquistão e a China buscarem acordos com o Talibã para garantir sua segurança.
Elizabeth também destacou que, embora os países vizinhos devam se preocupar, ainda é “muito cedo para dizer o quão significativa será a ameaça terrorista de um Afeganistão controlado pelo Talibã.
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